EUA: Powell sinaliza possível corte de juros em setembro diante de riscos no mercado de trabalho
Presidente do Fed afirma que tarifas de Donald Trump podem pressionar inflação, mas admite fragilidade na geração de empregos
247 - O presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, abriu caminho para uma possível redução da taxa básica de juros em setembro, destacando sinais de enfraquecimento no mercado de trabalho dos Estados Unidos. As declarações foram feitas nesta sexta-feira (22), durante o tradicional simpósio de política monetária em Jackson Hole, Wyoming, e repercutidas pela Bloomberg.
Powell afirmou que a taxa de desemprego estável e outros indicadores do mercado de trabalho permitem que a instituição avance com cautela em sua política monetária. “A estabilidade da taxa de desemprego e de outras medidas do mercado de trabalho nos permite proceder com cuidado à medida que consideramos mudanças em nossa política”, declarou. Ele destacou ainda que, diante da postura restritiva atual, “a perspectiva básica e o balanço de riscos em mudança podem justificar um ajuste na política”.
Mercado reage e aposta em corte de 0,25 ponto
Após o discurso, investidores reforçaram as apostas de que o Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês) promoverá um corte de 25 pontos-base na reunião marcada para 16 e 17 de setembro. “Ele usou o discurso para consolidar as expectativas de 25 pontos em setembro”, disse James Bullard, ex-presidente do Fed de St. Louis, em entrevista à Bloomberg Television. “Ele se apoiou no relatório mais recente sobre o mercado de trabalho, que foi muito fraco. Acho que isso já está decidido".
Apesar disso, a posição de Powell ocorre em meio a divergências internas no Fed. Enquanto alguns dirigentes defendem cautela por conta da inflação ainda resistente, outros alertam para sinais crescentes de fragilidade no emprego.
Fragilidade do mercado de trabalho e efeito das tarifas
Powell descreveu a situação como um “curioso tipo de equilíbrio”, marcado por desaceleração tanto na oferta quanto na demanda por trabalhadores. Ele lembrou que os dados de julho mostraram crescimento de vagas bem mais fraco do que o estimado anteriormente. “Essa situação incomum sugere que os riscos negativos para o emprego estão aumentando. Se esses riscos se materializarem, podem se manifestar rapidamente, na forma de demissões em massa e aumento do desemprego”, afirmou.
Ao mesmo tempo, Powell ressaltou que o Fed deve considerar os impactos inflacionários das tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. “Os efeitos das tarifas nos preços ao consumidor estão agora claramente visíveis, mas é razoável esperar que sejam relativamente curtos”, disse. No entanto, ele ponderou: “É possível que a pressão ascendente sobre os preços decorrente das tarifas estimule uma dinâmica inflacionária mais duradoura, e esse é um risco que precisa ser avaliado e administrado”.
Reação política e pressão sobre o Fed
O discurso ocorreu em meio a uma escalada de pressões políticas. Trump e seus aliados têm insistido em cortes mais agressivos nos juros, o que reacende o debate sobre a independência do banco central. Durante o evento, o presidente anunciou que pretende demitir a diretora do Fed, Lisa Cook, caso ela não renuncie. Ele a acusa de ter fornecido informações falsas ao solicitar dois financiamentos imobiliários. Cook, presente no simpósio, já havia dito que não pretende deixar o cargo.
Powell, por sua vez, evitou abordar o caso e não respondeu a perguntas do público.
Mudanças no arcabouço de política monetária
O dirigente também apresentou alterações no framework de política monetária do Fed. Entre os ajustes, destacou-se a retirada de um trecho que dizia que as decisões seriam informadas por “desvios do emprego em relação ao seu nível máximo”. Agora, a redação reconhece que o emprego pode, em determinados períodos, superar a avaliação em tempo real de seu nível máximo sem necessariamente gerar riscos à estabilidade de preços.
Segundo Diane Swonk, economista-chefe da KPMG, a mudança dá “mais flexibilidade ao Fed para lidar com a economia pós-pandemia, que se mostra mais volátil e menos previsível do que a anterior”.
Além disso, a instituição reafirmou a meta de inflação de 2%, mas abandonou a estratégia anunciada em 2020 de tolerar inflação acima da meta para compensar períodos de baixa.
Debate segue dividido dentro do Fed
As falas de Powell contrastam com a postura de outros dirigentes. A presidente do Fed de Cleveland, Beth Hammack, afirmou que não apoiaria um corte imediato devido aos dados recentes de inflação. Já Raphael Bostic, de Atlanta, acredita que apenas um corte seria suficiente em 2025.
O banco central cortou juros três vezes no fim de 2024, mas manteve a taxa estável neste ano, aguardando mais clareza sobre os impactos das tarifas. Com os dados de julho mostrando alta nos preços no atacado no ritmo mais acelerado em três anos e mercado de trabalho enfraquecido, o dilema do Fed continua aberto — e setembro pode ser o ponto de inflexão.