Celso Amorim aposta em acordo com União Europeia para conter impacto do tarifaço de Trump
Assessor de Lula vê interesse estratégico da Europa em ampliar comércio com o Brasil e alerta para efeitos sociais da militarização europeia
247 – O assessor especial da Presidência da República e ex-chanceler Celso Amorim avalia que a intensificação da guerra comercial imposta pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, poderá abrir novas janelas de oportunidade para o Brasil no mercado europeu. A análise foi publicada nesta segunda-feira (21) em reportagem do Valor Econômico, na qual Amorim aposta no interesse pragmático da União Europeia em acelerar a entrada em vigor do acordo com o Mercosul, assinado em dezembro do ano passado, mas ainda pendente de ratificação pelos parlamentos europeus.
Segundo o diplomata, embora a União Europeia não esteja interessada em ajudar o Brasil por mera solidariedade, o bloco poderá enxergar no atual cenário de tensão comercial uma oportunidade de estreitar laços com países sul-americanos. “A Europa vai agir em interesse próprio, até porque não tem sido bem tratada pelos EUA”, afirmou Amorim. Para ele, a postura de submissão de figuras como Mark Rutte, secretário-geral da Otan — que chegou a chamar Trump de “papai” —, não reflete a totalidade dos interesses europeus, sobretudo em países como a França.
Impactos sociais e resistência europeia ao alinhamento automático com os EUA
Amorim também alertou para o risco de tensão social no bloco europeu, caso avance a proposta de elevar gastos militares para 5% do PIB em cada país, em linha com a agenda belicista impulsionada por Trump e pela Otan. “Por muito menos os coletes amarelos paralisaram a França”, disse, em referência aos protestos contra a política econômica do governo francês nos últimos anos.
O assessor do presidente Lula sustenta que, diante do tarifário agressivo imposto pelos Estados Unidos, a tendência é que o Brasil busque reforçar acordos comerciais com outros parceiros internacionais, sobretudo europeus. Ele ressaltou, no entanto, que há obstáculos: “O acordo com o Mercosul só entrará em vigor após aprovação dos parlamentos europeus, e a pressão política é forte em alguns países”, observou.
Tarifas americanas e limites da pressão diplomática
Sobre a estratégia do governo Lula diante do tarifaço de 50% anunciado por Trump contra produtos brasileiros, Amorim se mostrou realista: “Não é uma guerra comercial como as outras”, avaliou. O ex-chanceler destacou que, em outras ocasiões, como durante o governo de George W. Bush, a diplomacia brasileira conseguiu amenizar tensões comerciais via interlocução com setores empresariais e parlamentares americanos. Porém, agora a situação é distinta.
“Não há paralelo para uma ofensiva comercial guiada pelo ataque ao funcionamento das instituições brasileiras”, afirmou, em referência à aproximação política entre Trump e o ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo Amorim, mesmo que haja pressões pontuais nos Estados Unidos contra as tarifas, a ofensiva faz parte de uma estratégia mais ampla, conectada à política doméstica norte-americana.
Expansão de mercados e papel estratégico do Brics
Diante da conjuntura adversa, Amorim defendeu a ampliação da presença brasileira em mercados do Sul Global, especialmente entre os parceiros do Brics. O Brasil, segundo ele, precisa de equilíbrio comercial para amortecer os efeitos das tarifas americanas. “Para nós, o ideal é que haja equilíbrio nesse rearranjo”, afirmou.
Ele lembrou que o Brasil ocupa apenas a sexta posição entre os exportadores do Brics, sendo a China o principal comprador — responsável por 83% das exportações brasileiras ao bloco. Na sequência aparecem Índia, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Indonésia, Egito, Irã, Rússia e África do Sul, todos com participações muito inferiores.
Amorim reconheceu que a dependência do mercado chinês é um desafio e defendeu a diversificação dos parceiros comerciais, em especial neste momento em que os Estados Unidos buscam impor restrições ao comércio exterior brasileiro.
Ofensiva democrática liderada por Lula
A entrevista também abordou a agenda internacional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Amorim destacou que Lula já iniciou articulações para formar uma frente internacional em defesa da democracia e contra o extremismo político.
O presidente brasileiro viajou neste domingo para Santiago, onde participará da primeira reunião do bloco “Em defesa da democracia: lutando contra o extremismo”, iniciativa conjunta com o presidente da Espanha, Pedro Sánchez, lançada à margem da Assembleia Geral da ONU em setembro do ano passado. O encontro reúne, além de Lula e Sánchez, o anfitrião Gabriel Boric, do Chile, Gustavo Petro, da Colômbia, e Yamandú Orsi, do Uruguai.
Preocupação com interferência eleitoral dos Estados Unidos
A reportagem do Valor Econômico aponta que o Palácio do Planalto monitora com preocupação a possibilidade de interferência dos Estados Unidos nas eleições presidenciais brasileiras de 2026. Apesar de colegas de governo acreditarem que o principal objetivo de Trump seja enfraquecer Lula no pleito, Amorim avalia que há espaço para redirecionamento da postura americana, como já ocorreu em momentos anteriores da relação bilateral entre Washington e Moscou.
Mesmo assim, Amorim não tem ilusões sobre o momento atual. “É um momento sem precedentes, no qual um aliado da extrema direita norte-americana tenta influenciar diretamente o cenário político e econômico brasileiro, usando o comércio exterior como instrumento de pressão”, concluiu.
A avaliação do diplomata reforça a percepção de que a política externa brasileira precisará intensificar a busca por alternativas comerciais e alianças políticas em defesa da soberania nacional e da democracia.
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