Interferência de Trump no Fed gera turbulência no dólar e pressiona juros de longo prazo
Mercados reagem à tentativa inédita de demissão de diretora do banco central americano e incerteza cresce sobre independência da instituição
247 - A tentativa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de afastar a diretora Lisa Cook do Federal Reserve (Fed) elevou a tensão entre investidores e trouxe novos sinais de instabilidade econômica, informa o Valor Econômico.
Trump acusou Cook de envolvimento em fraude hipotecária e declarou que já teria nomes em mente para substituí-la, movimento que, se concretizado, garantiria ao republicano maioria no comitê de política monetária. O gesto, considerado inédito na história da autoridade monetária americana, acendeu alertas sobre a independência institucional do Fed.
Efeitos imediatos no mercado
O episódio refletiu-se rapidamente nos ativos financeiros. O índice DXY, que mede a força do dólar frente a outras seis moedas, recuou 0,22%, fechando a 98,21 pontos. Já os rendimentos dos Treasuries de 30 anos subiram de 4,890% para 4,924%, enquanto os papéis de vencimentos curtos e médios apresentaram queda.
Essa diferença crescente nas taxas sinaliza que investidores ainda apostam em cortes de juros no curto prazo, mas precificam um prêmio de risco mais alto no longo prazo diante da ameaça de interferência política no banco central. As projeções do CME Group apontam para 87,3% de chance de um corte de 0,25 ponto percentual na próxima reunião do Fed.
Reação de Lisa Cook e batalha judicial
A economista Lisa Cook rejeitou a possibilidade de renunciar. “O presidente Trump alegou me demitir por justa causa, quando nenhuma causa existe, segundo a lei. E ele não tem autoridade para fazer isso”, declarou. Seu advogado, Abbe David Lowell, reforçou que as acusações carecem de fundamento legal: “Tomaremos todas as medidas necessárias para impedir sua tentativa de ação ilegal”.
Diante da resistência, especialistas avaliam que a disputa inevitavelmente seguirá para os tribunais. O próprio Trump afirmou estar disposto a enfrentar uma batalha judicial: “Estamos preparados para uma batalha legal”, disse à imprensa.
Nomes cotados e resposta do Fed
De acordo com o The Wall Street Journal, o presidente já avalia nomes para o cargo, entre eles o ex-presidente do Banco Mundial David Malpass, crítico da condução atual do Fed, e Stephen Miran, indicado anteriormente para uma vaga temporária.
Em comunicado, o Federal Reserve informou que Cook continua legalmente em seu posto e só deixaria de participar das reuniões caso haja uma decisão judicial até setembro. “Do nosso ponto de vista, o status da diretora não mudou”, ressaltou a instituição.
Avaliações econômicas e impacto institucional
A interferência sem precedentes chamou atenção de economistas e instituições financeiras. Michael Feroli, do J.P. Morgan, alertou que, se Trump obtiver êxito, o efeito poderá ser marcante. Para ele, uma vitória presidencial poderia abrir caminho para a remodelação completa do Fed e gerar riscos inflacionários.
O Nobel de Economia Paul Krugman foi ainda mais contundente ao analisar a situação. “Se Cook for demitida, as implicações serão profundas e desastrosas”, afirmou. Segundo ele, a medida representaria “a destruição do profissionalismo e do pensamento independente em todo o governo federal”.
Krugman destacou que a recusa de Cook em renunciar é legítima e que a questão central não são as acusações apresentadas, mas a resistência dela em se submeter à vontade política da Casa Branca. “No fim das contas, não se trata de política monetária. Trata-se de saber se ainda somos uma nação de leis”, concluiu o economista.