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Barroso admite possibilidade de deixar o Supremo Tribunal Federal

Presidente do STF encerra mandato na presidência com balanço sobre Lava Jato, Lula, Bolsonaro e sua possível saída da Corte

Luís Roberto Barroso (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

247 – O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu entrevista à coluna de Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, na qual fez um amplo balanço de sua trajetória no tribunal e revelou reflexões pessoais sobre o futuro. Na conversa, Barroso destacou que a saída do STF é uma possibilidade, mas não uma decisão tomada, e avaliou temas que marcaram sua gestão e sua carreira na Corte.

Lava Jato, Lula e o passado

Um dos pontos mais delicados da entrevista foi a lembrança do voto que, em 2018, ajudou a levar o presidente Lula à prisão. Barroso afirmou:

 "Eu deveria mudar a jurisprudência por querer bem ao réu? Eu apliquei ao presidente Lula, com dor no coração, a jurisprudência que eu tinha ajudado a criar."

O ministro admitiu que, à época, acreditava que a Lava Jato representava um enfrentamento legítimo contra a corrupção, mas reconheceu que a operação “se perdeu nos excessos e terminou se politizando”. Apesar disso, afirmou nunca ter se arrependido de seu voto.

Ele também revelou que nunca conversou com Lula sobre esse episódio, mas avalia que o presidente entende o papel de um juiz que cumpre seu dever. Sobre o reencontro entre ambos, relatou que ocorreu em São Paulo, na casa de Cristiano Zanin, atual ministro do STF, e descreveu o diálogo como “uma conversa ótima, sem nenhum passivo emocional”.

Relação com Lula e com Donald Trump

Barroso descreveu Lula como uma figura carismática, com grande capacidade de conquistar pessoas. Ele lembrou um episódio em que o presidente visitou sua casa e rapidamente conquistou a simpatia de sua sogra:

 "Minha sogra, que é holandesa, não tinha muita simpatia por ele. Mas, em dez minutos, Lula arrumou uma fã apaixonada."

Ao comentar a recente declaração do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre a “química excelente” que teria sentido ao se encontrar com Lula, Barroso ressaltou o carisma do brasileiro e disse ter admiração pessoal pelo mandatário, ainda que haja divergências políticas e econômicas.

Relação com Jair Bolsonaro

Sobre sua relação com o ex-presidente Jair Bolsonaro, Barroso afirmou que os encontros foram cordiais no início, mas relatou momentos de tensão. Ele lembrou que chegou a sugerir nomes para o Ministério da Educação, mas que Bolsonaro optou por ignorar sua recomendação.

 "O presidente [Bolsonaro], no trato pessoal, é uma pessoa muito simpática. Mas a conversa não fluía em temas relevantes."

Barroso destacou ainda que o enfrentamento mais duro veio durante a pandemia, quando o STF tomou decisões para garantir medidas de isolamento social e vacinação, o que gerou atritos diretos com o então presidente.

Saída do Supremo e vida pessoal

Questionado sobre a possibilidade de deixar o STF, Barroso afirmou que ainda não há definição:

 "Sair do Supremo é uma possibilidade, mas não é uma certeza. Eu verdadeiramente ainda não tomei essa decisão."

O ministro explicou que, quando sua esposa Tereza ainda era viva, havia um compromisso de se aposentar após deixar a presidência do tribunal, mas que, após a morte dela em 2023, essa motivação mudou. Agora, a decisão envolve reflexões sobre exposição pública, família e propósito de vida.

Lei Magnitsky e pressões externas

Barroso disse não temer a possibilidade de ser sancionado pela chamada Lei Magnitsky, que já foi aplicada contra o ministro Alexandre de Moraes e prevê sanções financeiras e restrições internacionais. Embora tenha reconhecido preocupação com o tema, minimizou os impactos sobre sua permanência na Corte:

 "Não tenho muitos medos nessa vida, nem aflições excessivas. Se vier algo negativo dos EUA, vou lidar com a maturidade espiritual de quem faz a coisa certa e entrega para o universo."

Anistia e redução de penas

O ministro também se posicionou contra a discussão de uma eventual anistia a Jair Bolsonaro antes ou logo após seu julgamento:

 "É inaceitável cogitar uma anistia antes, durante ou imediatamente após o julgamento."

No entanto, mostrou-se favorável a uma redução de penas que beneficie condenados de menor relevância nos atos de 8 de janeiro de 2023. Para Barroso, essa medida seria diferente de uma anistia e poderia corrigir excessos punitivos contra pessoas sem papel de liderança nos crimes.

Um balanço de legado

Na despedida da presidência do STF, Barroso fez questão de ressaltar que o tribunal teve papel fundamental na defesa da democracia, especialmente durante a pandemia e no julgamento do golpe de Estado de 8 de janeiro. Reconheceu que o Supremo vive sob constante crítica e julgamento público, mas defendeu que esse é o próprio funcionamento da democracia.

"O sistema democrático brasileiro expõe o Supremo a permanente julgamento público e crítico. Portanto, a gente se equilibra recebendo pedrada. E, na vida, é preciso prestar atenção de onde estão vindo as pedras."

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