"Quando Maria Corina vence o Nobel da Paz, a palavra paz perdeu completamente o sentido"
Em artigo publicado no site CodePink, Michelle Ellner a aponta como símbolo de violência, sanções e submissão da Venezuela a interesses estrangeiros
247 – A escritora e analista Michelle Ellner, em artigo publicado no site CodePink, criticou duramente a concessão do Prêmio Nobel da Paz de 2025 à opositora venezuelana María Corina Machado, afirmando que a escolha representa “a perda total do significado da palavra ‘paz’”.
Segundo Ellner, premiar uma figura que “defende intervenções estrangeiras, sanções econômicas e políticas de exclusão social” é não apenas um contrassenso, mas também “um insulto aos povos que sofrem as consequências dessas decisões travestidas de diplomacia”.
“Nada há de pacífico em suas ideias ou ações”
Logo no início do texto, Michelle Ellner expressa sua indignação:
“Quando vi a manchete ‘María Corina Machado vence o Prêmio Nobel da Paz’, quase ri da absurdidade. Mas não ri, porque não há nada de engraçado em recompensar alguém cujas políticas trouxeram tanto sofrimento. Qualquer pessoa que conheça o que ela defende sabe que não há nada remotamente pacífico em sua política.”
A autora, que se identifica como venezuelano-americana, afirma que Machado é o rosto sorridente da máquina de mudança de regime de Washington, uma política imperialista travestida de promoção da democracia. “Ela é a porta-voz polida das sanções, da privatização e da intervenção estrangeira, todas apresentadas sob o falso manto da liberdade”, escreveu Ellner.
O papel de Machado nos ataques à soberania da Venezuela
Para Ellner, a trajetória política de María Corina Machado está marcada por ações que enfraqueceram a soberania e o tecido social da Venezuela.
A escritora recorda que Machado foi uma das líderes do golpe de Estado de 2002, que depôs temporariamente o presidente Hugo Chávez, e assinou o Decreto de Carmona, documento que dissolveu todas as instituições democráticas do país e suspendeu a Constituição.
“Ela ajudou a apagar a Constituição venezuelana da noite para o dia e trabalhou lado a lado com Washington para justificar a mudança de regime”, denuncia Ellner. “Machado sempre usou sua plataforma para exigir intervenção militar estrangeira e ‘libertar’ a Venezuela à força.”
Segundo o artigo, Machado chegou a apelar diretamente ao primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, “o arquiteto da aniquilação de Gaza”, pedindo apoio para uma “libertação” armada de seu país. Essa postura, afirma Ellner, contradiz frontalmente os valores do Prêmio Nobel da Paz.
As sanções como “arma silenciosa de guerra”
Um dos eixos mais contundentes da crítica de Michelle Ellner é a defesa que Machado fez das sanções impostas pelos Estados Unidos à Venezuela.
A autora as define como uma forma de guerra econômica que destrói silenciosamente a vida cotidiana de milhões de pessoas.
“As sanções, esse tipo silencioso de guerra, matam mais pessoas do que um conflito armado”, escreveu. “Estudos publicados em revistas como The Lancet demonstram que elas privam populações inteiras de medicamentos, alimentos e energia.”
Ellner acusa Machado de ter apoiado e até celebrado essas medidas coercitivas, sabendo que os mais pobres seriam os que pagariam o preço. “Ela sabia exatamente quem sofreria: os trabalhadores, os doentes e as crianças”, destaca.
Alinhamento com Trump e apoio à militarização
Michelle Ellner dedica parte substancial de seu texto a denunciar a aliança política e ideológica de Machado com o governo de Donald Trump, o atual presidente dos Estados Unidos.
Durante o governo Trump, recorda a autora, Washington ameaçou invadir a Venezuela sob o pretexto de “combater o narcotráfico”, enviando navios de guerra ao Caribe e congelando ativos venezuelanos no exterior.
“Enquanto Trump enviava navios de guerra e confiscava os bens do país, Machado estava pronta para servir como sua procuradora local, prometendo entregar a soberania venezuelana em uma bandeja de prata”, escreveu Ellner.
“Ela aplaudiu as ameaças de invasão e elogiou a ‘ação decisiva’ de Trump contra o que chamava de ‘empresa criminosa’.”
A autora também lembra que Machado participou ativamente na criação do “governo interino” apoiado por Washington, uma estrutura paralela que, segundo Ellner, “funcionou como um teatro de marionetes administrado por um autoproclamado presidente enquanto o povo passava fome”.
A cumplicidade com Israel e a retórica da “libertação”
Outro ponto de destaque na crítica é o alinhamento explícito de Machado com o governo israelense. Ellner observa que a opositora prometeu reabrir a embaixada venezuelana em Jerusalém, gesto simbólico de total adesão à política de Israel, país acusado de crimes de guerra em Gaza.
“Ela se alia ao mesmo Estado de apartheid que bombardeia hospitais e chama isso de autodefesa”, denuncia a autora.
Para Ellner, esse posicionamento revela a incoerência de uma figura “que fala de liberdade enquanto apoia a destruição de povos inteiros”.
Violência nas ruas: as guarimbas e o caos planejado
O artigo dedica também um longo trecho à análise do papel de Machado nas guarimbas, as ondas de protestos violentos promovidas por setores da oposição venezuelana em 2014 e 2017.
Ellner desmonta a narrativa de que esses atos seriam “protestos pacíficos” e os descreve como uma estratégia deliberada de desestabilização.
“As ruas foram bloqueadas com lixo em chamas e arame farpado. Ônibus que levavam trabalhadores foram incendiados. Pessoas suspeitas de serem chavistas foram espancadas ou mortas. Até ambulâncias e médicos foram atacados”, escreveu.
“Brigadas médicas cubanas quase foram queimadas vivas, enquanto Machado, à distância, chamava isso de ‘resistência’.”
Entre as vítimas, Ellner cita Orlando Figuera, jovem assassinado brutalmente durante os protestos de 2017, que simboliza a escalada de ódio promovida pela extrema direita venezuelana.
A “aliança entre fascismo, sionismo e neoliberalismo”
Em uma passagem central do artigo, Michelle Ellner define María Corina Machado como parte de um eixo global entre fascismo, sionismo e neoliberalismo, que usa a linguagem da democracia para justificar a dominação e a violência.
“Na Venezuela, essa aliança se manifesta em golpes, sanções e privatizações; em Gaza, ela se traduz em genocídio e no apagamento de um povo inteiro”, argumenta.
A autora ironiza que, se figuras como Henry Kissinger já foram laureadas com o Nobel da Paz, não é surpreendente que o prêmio tenha perdido todo o sentido.
“Talvez no próximo ano concedam o prêmio à Fundação Humanitária de Gaza por ‘compaixão sob ocupação’”, escreve, em tom mordaz.
O verdadeiro significado da paz
Na parte final do texto, Ellner contrapõe a falsa paz das elites à paz construída pelos povos que resistem.
“A verdadeira paz não é negociada em salas de reunião nem celebrada em palcos”, escreve. “Ela é construída por mulheres que organizam redes de alimentos durante bloqueios, por comunidades indígenas que defendem seus rios, por trabalhadores que se recusam a ser famintos até a obediência e por mães que lutam para reencontrar filhos desaparecidos pelas políticas migratórias dos Estados Unidos.”
Ellner conclui afirmando que o Prêmio Nobel da Paz deveria pertencer aos jornalistas palestinos, aos médicos que resgatam corpos sob escombros e aos ativistas que arriscam a vida para levar ajuda humanitária a Gaza, e não a quem colabora com a opressão.
“Dêem o Prêmio Nobel da Paz aos jornalistas de Gaza, não a María Corina Machado”, finaliza. “A paz que o mundo precisa é a dos povos que resistem, não a dos que governam com bombas, bloqueios e mentiras.”




