Data centers de IA no Brasil podem consumir energia de até 16 milhões de casas

247 - Os primeiros complexos de data centers dedicados à inteligência artificial no Brasil têm potencial para atingir um consumo energético equivalente ao de 16,4 milhões de residências brasileiras. A estimativa foi calculada com base na potência máxima divulgada pelas empresas responsáveis pelos empreendimentos, informa o g1.

As unidades estão previstas para serem instaladas nas cidades do Rio de Janeiro (RJ), Eldorado do Sul (RS), Maringá (PR) e Uberlândia (MG). Um quinto projeto, previsto para Caucaia (CE), poderá ser operado pela ByteDance, dona do TikTok, segundo informou a agência Reuters. No entanto, como não há confirmação oficial de que esse centro será voltado à IA, ele ficou fora da estimativa total de consumo energético.

Crescimento acelerado impulsionado por modelos como o ChatGPT - O avanço no uso de tecnologias como o ChatGPT tem exigido estruturas cada vez mais potentes para treinamento de modelos de linguagem. Isso fez com que os data centers de IA se tornassem essenciais para abrigar supercomputadores com grande capacidade de processamento, exigindo altíssimo fornecimento de energia e sistemas eficientes de refrigeração.

De acordo com o site Data Center Map, o Brasil já conta com 188 data centers, todos voltados à operação de serviços em nuvem. Já os centros de IA, que têm como foco o treinamento de modelos complexos, podem atingir níveis de consumo muito superiores aos centros convencionais. Enquanto um data center tradicional de 20 megawatts pode consumir o equivalente a 80 mil residências por dia, os de IA podem multiplicar esse número em dezenas de vezes.

Onde estão os projetos e qual o impacto previsto:

Rio de Janeiro (RJ) – No bairro de Jacarepaguá, a Elea Data Centers planeja instalar quatro centros voltados à inteligência artificial no complexo Rio AI City. Um já está em operação, mas ainda funciona com serviços em nuvem. A potência inicial prevista é de 1,5 mil megawatts, equivalente ao consumo de 6 milhões de casas. A capacidade pode dobrar futuramente. O projeto também prevê prédios para pesquisa e startups. O prefeito Eduardo Paes (PSD) já assinou um memorando de intenções com o objetivo de transformar o município na “capital da inteligência artificial brasileira”.

Eldorado do Sul (RS) – A Scala Data Centers anunciou a criação do complexo Scala AI City, que terá potência inicial de 1,8 mil megawatts, podendo chegar a 5 mil megawatts até 2033. Na prática, isso representa um consumo diário de até 7,2 milhões de residências. A refrigeração será feita por um sistema com óleo em circuito fechado, para economizar água. A cidade aprovou leis com incentivos fiscais para instalação de empresas de tecnologia.

Maringá (PR) e Uberlândia (MG) – A RT-One planeja erguer dois centros, um em cada cidade, com potência de 400 megawatts cada. Isso representa até 1,6 milhão de casas por local. Em Maringá, a prefeitura estuda criar uma área de livre comércio para facilitar a importação de equipamentos. A empresa avalia a possibilidade de utilizar o Aquífero Guarani para resfriamento, devolvendo a água ao subsolo por meio de trocadores de calor.

Caucaia (CE) – Embora ainda sem foco confirmado em IA, a Casa dos Ventos vai construir um centro com 300 megawatts na primeira fase, podendo chegar a 576 megawatts. Segundo a Reuters, a unidade poderá atender à demanda da ByteDance. A operação deve começar em 2027 e o investimento estimado supera R$ 50 bilhões.

Especialistas alertam para lacunas de transparência e impactos ambientais - A estimativa de consumo é baseada na potência total anunciada multiplicada pelas 24 horas do dia, e comparada ao consumo médio de residências no Brasil — cerca de 6 kWh/dia, conforme dados de março de 2025 da Empresa de Pesquisa Energética. No entanto, o uso real depende de quais e quantos servidores serão ativados, como explica Eduardo Fagundes, engenheiro e professor especializado em tecnologia e inteligência artificial:

“Não se consome toda essa energia. Cada servidor consome um pouco menos do limite dependendo do que você colocar para rodar”, afirma.

Apesar disso, o impacto ambiental segue sendo motivo de preocupação. A pesquisadora Elaine Santos, do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), em Portugal, destaca a complexidade para medir os reais efeitos desses centros de dados:

“Tem que analisar a região onde o data center está, se há uma escassez hídrica, que tipo de região é, como a energia é usada, se existe pobreza energética. Basicamente, fica impossível para qualquer pesquisador ou interessado no tema".

Além da energia, o uso intensivo de água para resfriamento também desperta alertas. Um estudo da Universidade da Califórnia, em Riverside, revelou que treinar o modelo GPT-3, utilizado pelo ChatGPT, pode evaporar até 700 mil litros de água. No lado do usuário, 50 perguntas ao sistema consomem aproximadamente meio litro.

Shaolei Ren, professor de Engenharia Elétrica e de Computação na mesma universidade e autor do estudo, alerta:

“Precisamos entender o impacto e avaliar: estamos obtendo benefícios suficientes para compensar os impactos negativos do ponto de vista da sociedade? Queremos garantir que o benefício que isso traz supere o lado negativo".