Compromisso incondicional coloca em risco a autonomia estratégica da União Europeia, diz Global Times em editorial

247 - O acordo comercial anunciado em 7 de agosto entre a União Europeia e os Estados Unidos está longe de ser um consenso sólido. Segundo análise publicada pelo jornal chinês Global Times, o acerto, que entrou em vigor no mesmo dia, impõe tarifas de 15% à UE e mantém taxas de 50% sobre setores como aço, alumínio e cobre. Em contrapartida, Bruxelas se comprometeu a eliminar tarifas sobre inúmeros produtos norte-americanos, inclusive todos os itens industriais, além de adquirir US$ 750 bilhões em produtos energéticos dos EUA nos próximos três anos, investir mais US$ 600 bilhões na economia norte-americana e comprar grandes quantidades de armamento produzido por empresas dos EUA.

O editorial observa que as concessões vão além: a UE ainda se comprometeu a reduzir barreiras não tarifárias que afetam as exportações industriais e agrícolas norte-americanas. A avaliação é que o acordo foi fechado às pressas, sem detalhes claros sobre prazos, fontes de financiamento e execução de investimentos, e com lacunas importantes sobre a lista de produtos isentos de tarifas.

Projeções do banco Goldman Sachs indicam que o impacto econômico do acordo para a zona do euro deve ser de cerca de 0,4 ponto percentual no PIB até o fim de 2026. Já a Associação Alemã da Indústria Automotiva calcula que a tarifa de 15% custará bilhões de euros anuais à indústria do setor. Agricultores do sul e do leste europeu também devem sofrer prejuízos significativos com a abertura do mercado e a redução de padrões exigidos para produtos norte-americanos.

Segundo o Global Times, a Comissão Europeia admitiu, apenas três dias após o anúncio, que o acordo é “um compromisso político, não juridicamente vinculativo”. A resposta norte-americana, contudo, foi imediata: se houver recuo europeu, Washington aplicará tarifas de 35%. O jornal observa que a “pressão máxima” dos EUA parece estar vencendo, especialmente porque a UE suspendeu, no dia 4 de agosto, duas medidas tarifárias retaliatórias contra os EUA por seis meses — gesto interpretado como mais uma concessão.

O editorial critica a postura de Bruxelas, que considera tímida e hesitante: “levantar a arma, mas não atirar” e “falar sem agir”. Essa atitude, afirma, reforça a percepção de que a UE não tem meios ou vontade de reagir, resultando em um ciclo vicioso de ameaças e concessões cada vez maiores.

Para o Global Times, o custo político e econômico do acordo mina o projeto de “autonomia estratégica” que a União Europeia diz perseguir. “O cerne da autonomia estratégica reside na capacidade de moldar o próprio destino, não na evitação incondicional de conflitos”, alerta. O texto acusa Washington de já ter usado a guerra na Ucrânia como moeda de troca contra a OTAN e agora tentar explorar a UE novamente no campo comercial, o que, segundo o jornal, fere os objetivos geopolíticos europeus.

O editorial conclui que Bruxelas precisa agir com coragem política e aceitar riscos de curto prazo para proteger seus interesses essenciais: “Compromissos míopes, o sacrifício de interesses de alguns para proteger outros e a busca por piedade não trarão respeito internacional. Apenas isolarão ainda mais a União Europeia.”