Para Gilmar Mendes, bancos veem sanções dos EUA como inaplicáveis ao Brasil
Ministro do STF afirma que entendimento atual protege sistema financeiro brasileiro
247 – O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes afirmou nesta quinta-feira (2) que, até o momento, os bancos brasileiros têm interpretado que as sanções aplicadas pelos Estados Unidos contra autoridades nacionais não são “extensíveis” ao Brasil. A declaração foi feita durante o 2º Fórum Futuro Tributação, em Lisboa, evento organizado pelo Fórum de Integração Brasil Europa (Fibe). A informação foi publicada pelo Valor Econômico.
“Até aqui, os bancos têm interpretado que as sanções não são extensíveis ou aplicáveis. É esse o entendimento”, disse Gilmar Mendes a jornalistas. A fala ocorre em meio a um cenário de tensão diplomática, já que integrantes do STF e autoridades brasileiras tiveram vistos revogados pelo governo norte-americano. Além disso, o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação sobre a trama golpista, foi sancionado com base na Lei Magnitsky, que impede os alvos de manter relações comerciais com empresas americanas do setor financeiro ou que operem com os Estados Unidos.
Blindagem jurídica contra efeitos externos
Gilmar lembrou que a decisão de agosto do ministro Flávio Dino, em outro processo, estabeleceu que leis e ordens judiciais estrangeiras não valem automaticamente no Brasil, nem vinculam empresas brasileiras ou atingem bens situados no país. O caso envolveu ações relativas ao desastre de Mariana (MG) movidas por municípios na Justiça do Reino Unido.
“Nós tivemos também uma manifestação no Supremo da lavra do ministro Flavio Dino naquele caso envolvendo a questão da mineração em Mariana, em que ele balizou que essas decisões tomadas por autoridades estrangeiras precisam ser validadas por autoridade judicial brasileira. Em suma, são questões que certamente podem vir a ser discutidas no futuro”, afirmou Gilmar.
Na Corte, também tramita um processo sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, que vai definir como as empresas do setor financeiro devem proceder diante das sanções externas.
Lei “antiembargos” e negociações diplomáticas
Em outra frente, o ministro revelou que os três Poderes discutem a criação de uma possível “lei antiembargos”, voltada a proteger autoridades e entidades brasileiras de sanções internacionais. Segundo o Valor, a proposta ainda está sob análise da Advocacia-Geral da União (AGU).
Gilmar destacou que o debate é semelhante a propostas em análise na Europa. “São projetos similares ou propostas similares às que já existem em debate ou em implementação na Europa em face das determinações de embargos que têm havido por parte sobretudo dos americanos, vis-à-vis aos russos, ao Irã ou mesmo à Cuba, e são debates que precisam ser refinados”, declarou.
O governo federal, no entanto, aposta prioritariamente na via diplomática e espera retomar as negociações diretas com os Estados Unidos antes de adotar medidas legislativas que possam ser interpretadas como retaliação.
PEC da blindagem, PL da anistia e divisão política
Gilmar também foi questionado sobre a relação entre a derrota da PEC da Blindagem no Senado e o debate sobre o PL da Anistia (rebatizado de PL da Dosimetria), em discussão na Câmara. O decano do STF afastou uma ligação direta entre os dois temas:
“Não sei se tem uma associação imediata entre uma coisa e outra. O debate sobre a anistia se liga aos condenados do 8 de janeiro e agora aos responsabilizados também pelo episódio da tentativa de golpe. Certamente, esse debate pode continuar na medida em que venha a implementação das medidas”, afirmou.
Ele ainda comentou as manifestações de 21 de setembro, contrárias à anistia e à redução de penas. “A mim parece que isso traduz um pouco também da divisão que vocês detectam no país. Pesquisas recentes indicam apoio à decisão do Supremo Tribunal Federal e, ao mesmo tempo, repudiam qualquer alívio ou anistia nesse contexto. É claro que o Judiciário não decidiu com base nisso, decidiu com base na prova dos autos.”
Julgamento da trama golpista e eleições de 2026
Gilmar Mendes avaliou ainda os efeitos políticos da condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos e três meses de prisão pelo envolvimento na trama golpista. Para o ministro, apesar da gravidade, a decisão não gerou grandes manifestações nas ruas, mas antecipou a discussão eleitoral de 2026.
“Quando um candidato que, eventualmente, poderia estar com seu nome nas urnas também é afetado por medidas, seja restritiva, seja de inelegibilidade, também isso provoca discussões. É preciso que a gente olhe nesse contexto, mas não houve repercussão que levasse as pessoas às ruas. Acho que as pessoas entenderam que as decisões tomadas, restritivas, são legítimas”, concluiu.