Entre desaceleração e inflação, EUA enfrentam impasse sobre juros
Autoridade monetária dos EUA avalia sinais de fraqueza no mercado de trabalho enquanto inflação segue acima da meta
247 - A agência Bloomberg informou neste domingo (14) que o Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos, deve anunciar nesta semana o primeiro corte de juros do ano, mas sem consenso sobre o ritmo da flexibilização monetária. A decisão ocorre em meio à pressão crescente do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que busca maior influência sobre a política monetária.
A medida prevista para quarta-feira (17) não garante uma trajetória contínua de cortes. O cenário é marcado por dados fracos do mercado de trabalho, aumento nos pedidos de seguro-desemprego e revisões que indicam crescimento bem menos robusto do emprego em 2024 e 2025. Ao mesmo tempo, a inflação permanece acima da meta de 2% do Fed, pressionada pelas tarifas impostas pelo governo Trump sobre parceiros comerciais.
Divergências entre dirigentes do Fed
A expectativa de uma redução de 0,25 ponto percentual nos juros dividiu autoridades da instituição. Alguns defendem uma postura mais agressiva para estimular a economia, enquanto outros avaliam que a inflação ainda é um risco significativo. Caso se confirmem três ou quatro dissidências na reunião, seria a primeira vez desde 2019 — ou até 1990 — que um encontro do Fed registraria tamanho nível de discordância.
Pat Harker, ex-presidente do Federal Reserve da Filadélfia, destacou que não está claro se este corte marcará o início de um ciclo robusto de flexibilização. “Não é óbvio que isso vá acontecer aqui de forma consistente”, disse.
Emprego, imigração e tarifas
O presidente do Fed, Jerome Powell, reconheceu o que chamou de “um curioso tipo de equilíbrio” no mercado de trabalho: enquanto a demanda por mão de obra desacelera, a oferta também encolhe em razão da política de restrição migratória adotada por Trump. Essa combinação torna mais difícil avaliar a real fragilidade do emprego.
Vincent Reinhart, economista-chefe da BNY Investments, afirmou: “Vejo fraqueza nos dados de emprego que eles precisam responder”, embora avalie que não há necessidade de uma sequência rápida de cortes.
Já Marc Giannoni, economista-chefe do Barclays Capital, ressaltou a dificuldade da instituição em lidar simultaneamente com os impactos da guerra comercial e da política migratória. “O choque comercial e o choque da imigração são dois fatores que tornam muito difícil administrar os objetivos duplos do Fed”, observou.
Pressão política e composição do conselho
Donald Trump aumentou sua ofensiva contra o banco central. No mês passado, tentou destituir a diretora Lisa Cook, em ação barrada temporariamente na Justiça, e indicou Stephen Miran, aliado próximo, para o Conselho de Governadores. Caso seja aprovado pelo Senado, Miran poderá votar já na reunião desta semana.
A ofensiva presidencial inclui ainda a possibilidade de indicar um novo presidente do Fed em maio, quando expira o mandato de Jerome Powell. Entre os nomes cotados está Christopher Waller, atual governador e um dos preferidos de Trump para assumir o comando da instituição.
Projeções e perspectivas
Analistas do Barclays projetam que o Fed cortará juros nas três reuniões restantes de 2025, além de duas reduções previstas para 2026. O Wells Fargo, por sua vez, aposta em melhora gradual do cenário, caso as tarifas sejam estabilizadas e os efeitos dos cortes de impostos do governo comecem a impulsionar famílias e empresas.
Entre os dirigentes regionais do Fed, o tom ainda é divergente. Enquanto Raphael Bostic (Atlanta) considera adequado apenas um corte em 2025, Jeff Schmid (Kansas City) manifestou-se contra qualquer redução neste momento. Alberto Musalem (St. Louis) defendeu “uma abordagem equilibrada”, sem pender exclusivamente para o combate à inflação ou para o estímulo ao emprego.
Esther George, ex-presidente do Fed de Kansas City, resumiu o desafio: “A questão é se eles realmente querem estimular a demanda ou se acreditam que a política está excessivamente apertada e precisa apenas ser calibrada para algo mais normal”.