Pejotização "corrói" direitos trabalhistas, diz AGU em audiência no STF
Jorge Messias comparou a pejotização à “cupinização” das garantias sociais e criticou a precarização das relações de trabalho
247 - O advogado-geral da União, Jorge Messias, afirmou nesta segunda-feira (6) que a pejotização das relações de trabalho ameaça o pacto social estabelecido pela Constituição de 1988 e compromete a estrutura dos direitos trabalhistas no país. A declaração foi dada durante audiência pública realizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que analisa a validade jurídica dos contratos em que empresas contratam profissionais como pessoas jurídicas.
De acordo com informações da CNN Brasil, Messias ressaltou que o fenômeno ultrapassa as dimensões técnica e econômica, atingindo diretamente o núcleo de proteção social. “A pejotização é a cupinização dos direitos trabalhistas brasileiros. Corrói por dentro, silenciosamente, as estruturas que sustentam a proteção social”, afirmou o chefe da Advocacia-Geral da União (AGU).
Messias defendeu que o modelo, apesar de parecer oferecer liberdade contratual, acaba isolando e fragilizando o trabalhador. Segundo ele, “sob a aparência de liberdade, o trabalhador fica isolado, desprotegido e sem voz”. O advogado-geral ainda destacou que a prática enfraquece o sistema previdenciário, reduzindo as contribuições de empregados e empregadores e comprometendo o financiamento da Previdência Social.
Em sua exposição, Messias também contestou o argumento de que a pejotização representaria uma modernização das relações trabalhistas. “Não há liberdade real quando a única alternativa é abrir um CNPJ para manter o sustento da família. Não há autonomia quando o mercado impõe a pejotização como condição para o emprego”, declarou. Ele defendeu que o país deve distinguir a verdadeira autonomia profissional das fraudes que mascaram vínculos empregatícios, ampliando a precarização.
A posição do advogado-geral contrastou com a do ministro Gilmar Mendes, relator do processo em análise no STF. Mendes defendeu a necessidade de adaptar a legislação trabalhista às novas dinâmicas do mercado, sem tentar “deter o curso da história”. “A complexidade do tema exige compreender como a inovação pode ser incorporada sem retrocessos, mas também sem a ilusão de que a legislação possa preservar relações que já se reconfiguraram”, afirmou o ministro.
Em agosto, durante um evento empresarial, Gilmar Mendes já havia sinalizado uma posição favorável à pejotização. Na ocasião, ele afirmou ser preciso “encerrar a insistência em modelos ultrapassados de trabalho” e indicou que o tema poderá ser votado ainda neste ano pelo Supremo.
A audiência pública desta segunda-feira reuniu representantes de trabalhadores, empresários e autoridades para debater o tema. O julgamento no STF analisará três pontos centrais:
- A licitude da contratação civil ou comercial de trabalhadores autônomos ou de pessoas jurídicas para prestação de serviços;
- A competência da Justiça do Trabalho para julgar possíveis fraudes nesses contratos;
- A responsabilidade pela apresentação de provas em casos de suspeita de irregularidade — se cabe ao autor da ação ou à empresa contratante.
A decisão do Supremo terá repercussão geral, ou seja, servirá como referência obrigatória para todos os casos semelhantes no país, podendo redefinir os rumos da regulação trabalhista brasileira.