‘O juiz não deve ser uma samambaia jurídica durante o processo’, diz Alexandre de Moraes
Ministro rebateu críticas da defesa do general Augusto Heleno: “não cabe a nenhum advogado censurar o magistrado”
247 - O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), reagiu nesta terça-feira (9) às críticas da defesa do general Augusto Heleno, que apontava suposta violação ao sistema acusatório durante a instrução do processo que investiga a tentativa de golpe de 2022. As declarações ocorreram durante a sessão da Primeira Turma, responsável por julgar Jair Bolsonaro (PL) e outros sete aliados acusados de liderar a trama golpista.
Moraes afastou os argumentos apresentados pela defesa de Heleno e disse que não cabe reduzir o papel do magistrado a uma função passiva. “A ideia de que o juiz deve ser uma samambaia jurídica durante o processo não tem nenhuma ligação com o sistema acusatório. Isso é uma alegação esdrúxula”, afirmou. O ministro ainda rebateu diretamente a estratégia dos advogados: “Não cabe a nenhum advogado censurar o magistrado dizendo o número de perguntas que ele deve fazer”.
Participação do juiz no processo penal
Na avaliação do relator, o sistema acusatório tem sido usado como um “guarda-chuva” para embasar diversas teses de nulidade. Ele explicou que o modelo garante a prerrogativa exclusiva do Ministério Público de propor ações penais, mas não exclui a participação ativa do juiz durante a instrução.
“O juiz não só pode como deve fazer perguntas, principalmente nos interrogatórios”, frisou. Moraes argumentou que a atuação do magistrado pode inclusive beneficiar os réus ao esclarecer informações relevantes. Para ele, restringir essa atuação seria esvaziar a função jurisdicional e comprometer a busca pela verdade.
Delação de Mauro Cid também em pauta
Além da discussão sobre o sistema acusatório, Moraes também analisou os questionamentos das defesas quanto à delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens e colaborador do processo. Ele ressaltou que o acordo foi voluntário e que não há indícios de coação.
“Todos os depoimentos, sejam policiais ou judiciais, foram gravados em áudio e vídeo”, destacou, lembrando que a própria defesa de Cid já havia reconhecido a regularidade do acordo. O ministro reafirmou que a colaboração pode ser firmada pela Polícia Federal, com posterior homologação pelo STF, conforme entendimento consolidado pela Corte em 2018.
Moraes também rechaçou a tese de que os depoimentos de Cid seriam contraditórios. “Basta a leitura da colaboração para verificar que, por uma estratégia de investigação, a Polícia Federal resolveu fracionar em oito depoimentos temas diversos — joias, vacinação, tentativa de golpe. Não são contraditórios”, afirmou. Para ele, insistir nesse argumento “beira à litigância de má-fé”.
O julgamento dos acusados de golpe
O STF retomou nesta terça-feira (9) a análise do processo que envolve Jair Bolsonaro, ex-presidente da República, e outros sete aliados. Eles são acusados de arquitetar o plano “Punhal Verde e Amarelo”, que previa ações violentas como sequestros e assassinatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e do próprio Moraes.
A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) também cita a chamada “minuta do golpe”, documento que buscava instaurar estado de defesa e de sítio para impedir a posse de Lula. Os réus ainda respondem por participação nos atos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas em Brasília.
Entre os acusados estão:
- Jair Bolsonaro – ex-presidente da República
- Alexandre Ramagem – ex-diretor da Abin
- Almir Garnier – ex-comandante da Marinha
- Anderson Torres – ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF
- Augusto Heleno – ex-ministro do GSI
- Paulo Sérgio Nogueira – ex-ministro da Defesa
- Walter Braga Netto – ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice em 2022
- Mauro Cid – ex-ajudante de ordens e delator
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu a condenação de todos os réus, com penas que, segundo cálculos do Ministério Público Federal, podem ultrapassar 30 anos de prisão. O julgamento segue na Primeira Turma, composta pelos ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Luiz Fux e Flávio Dino.