Putin defende fim do neocolonialismo e nova ordem multipolar no Fórum Econômico de São Petersburgo

247 – Durante o discurso principal da sessão plenária do Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo (SPIEF), nesta sexta-feira (20), o presidente da Rússia, Vladimir Putin, apresentou uma dura crítica ao sistema geopolítico e econômico vigente, denunciando o neocolonialismo e defendendo a construção de uma nova ordem mundial multipolar. As declarações foram repercutidas pela Sputnik International, que transmitiu ao vivo o evento.

“Aquilo que costumam chamar de nova ordem mundial está surgindo naturalmente, como o nascer do sol, e não há como impedi-lo”, afirmou Putin. “Nós não estamos criando essa nova ordem, estamos apenas moldando-a para que ela seja mais equilibrada e reflita os interesses da maioria dos países.”

Críticas ao Ocidente e defesa da multipolaridade

Putin denunciou a atuação das potências ocidentais como fatores desestabilizadores nas relações internacionais. Em referência aos conflitos recentes, disse que os mesmos atores que se opõem aos interesses legítimos da Rússia e do Irã são também os que tentam manter sua hegemonia à custa da soberania de outras nações.

“O potencial de conflito no mundo está crescendo, inclusive nas imediações da Rússia. Estamos lidando com os mesmos que operam contra os princípios que defendemos, seja aqui ou no caso iraniano”, declarou. O presidente russo reafirmou o compromisso de Moscou com a estabilidade e segurança na região do Golfo Pérsico, destacando que a Rússia continua seu trabalho no reator nuclear de Bushehr, no Irã, mesmo sob pressões e ameaças.

Putin também mencionou que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, prometeu apoio à exigência russa de garantir a segurança dos técnicos russos envolvidos no projeto nuclear iraniano. “Estamos agindo de acordo com as normas internacionais e pedimos garantias para a integridade do nosso pessoal em Bushehr”, disse.

Sul Global como força de equilíbrio

Putin fez diversas referências ao papel das nações do Sul Global como mediadoras e protagonistas de uma nova configuração mundial. “Buscamos um desenvolvimento global que beneficie a maioria dos países, e não apenas blocos militares ou econômicos específicos”, afirmou.

Nesse sentido, destacou as relações de confiança entre Moscou e os países árabes e islâmicos, além do fortalecimento da aliança estratégica com a China. “Rússia e China não estão formando uma nova ordem mundial contra ninguém. Estamos apenas colaborando para que esse processo seja equilibrado”, enfatizou.

O presidente da Indonésia, Prabowo Subianto, reforçou esse ponto ao dizer: “Rússia e China nunca tiveram padrões duplos. Sempre defenderam os oprimidos, sempre lutaram pela justiça. Isso precisa ser reconhecido pelo Sul Global”. Prabowo ainda denunciou a reação hostil do Ocidente à proposta indonésia de cessar-fogo imediato na Ucrânia, apresentada dois anos atrás.

Investimentos e abertura ao capital estrangeiro

Putin destacou a importância dos investimentos privados — nacionais e internacionais — para o crescimento da economia russa. “Sem investimentos privados, inclusive os estrangeiros, o desenvolvimento econômico da Rússia será limitado”, afirmou.

Ele acusou as empresas ocidentais que deixaram o país de se renderem a pressões políticas, classificando-as como “parceiros de negócios pouco confiáveis”, e anunciou que a Rússia criará condições para o retorno das que desejarem restabelecer sua presença. “Nunca expulsamos ninguém. Muitos saíram por conta própria e com prejuízos significativos. Agora, cabe a nós decidir se vale a pena reabrir as portas”, disse.

Conflito na Ucrânia e segurança nas fronteiras

Putin voltou a acusar a Ucrânia de agir por motivações políticas ao provocar confrontos nas regiões fronteiriças russas. Segundo ele, o objetivo de Kiev é “obter mais dinheiro dos seus patrocinadores estrangeiros”, destacando que “quase 250 bilhões de dólares já foram recebidos, mas metade disso foi roubada”.

“Estamos sendo forçados a criar zonas de segurança ao longo das nossas fronteiras, o que desvia ainda mais as já escassas forças ucranianas de seus objetivos centrais”, argumentou. Putin afirmou que a ofensiva ucraniana na região de Kursk resultou em pesadas baixas para Kiev, com 76 mil soldados mortos, segundo dados russos.

Irã, Israel e o papel da diplomacia

Putin também abordou o conflito entre Irã e Israel, sinalizando que países do Sul Global podem ser decisivos na mediação. “A segurança de um país não pode ser garantida em detrimento de outro”, defendeu. Reiterou que Moscou tem “contato diário” com o Irã e sugeriu que existem propostas em andamento para diminuir as tensões.

Chamou atenção ainda para o fato de Israel ter hoje quase dois milhões de falantes de russo e ex-cidadãos da União Soviética. “Levamos isso em conta historicamente e mantemos relações amistosas com ambos os lados”, disse, acrescentando que Moscou apoia o uso pacífico da energia nuclear pelo Irã de forma “não apenas com palavras, mas com ações concretas”.

O SPIEF como plataforma global

A sessão plenária contou também com a participação do vice-presidente da África do Sul, Paul Mashatile, que classificou o SPIEF como “uma das mais importantes plataformas para o diálogo global sobre economia, investimentos e crescimento inclusivo”.

O evento, realizado entre os dias 18 e 21 de junho, teve como tema “Valores compartilhados: a base do crescimento em um mundo multipolar”, refletindo o esforço russo de se posicionar como líder de um novo eixo de poder internacional.

A fala de Putin, repleta de críticas à ordem internacional liderada pelo Ocidente e apelos por uma governança global mais equitativa, reforça a narrativa de Moscou de que a multipolaridade já não é uma escolha, mas uma realidade em formação — um processo que, segundo ele, “é inevitável como o nascer do sol”.