Crise entre Motta e Alcolumbre ameaça travar votações no Congresso
Divergência entre presidentes da Câmara e do Senado pode comprometer pautas prioritárias do governo Lula
247 - A rejeição da PEC da Blindagem pelo Senado abriu uma crise no Congresso e expôs um afastamento entre os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). O episódio, que revelou a falta de sintonia entre os dois, coloca em risco votações de projetos considerados estratégicos para parlamentares e para o governo Lula (PT).
De acordo com o jornal O Globo, a divergência não apenas enfraqueceu a articulação política, mas também levantou a possibilidade de retaliações mútuas entre as Casas. A tensão cresceu a partir do desgaste sofrido por Motta, que vinha defendendo a proposta e agora enfrenta críticas internas por sua condução.
Prioridades em risco
O atrito já compromete o andamento de projetos prioritários. Entre eles estão a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem recebe até R$ 5 mil. Deputados avaliam que a votação da isenção pode ficar inviabilizada pela “contaminação” da pauta, enquanto senadores avançaram em um projeto alternativo relatado por Renan Calheiros (MDB-AL), aprofundando a disputa com a Câmara.
A falta de coordenação não é recente. Antes mesmo da PEC da Blindagem, Motta e Alcolumbre já acumulavam desentendimentos sobre medidas provisórias, o novo Código Eleitoral e a regulação da inteligência artificial.
Tentativas de apaziguamento
Motta buscou reduzir a temperatura da crise ao afirmar que divergências fazem parte do sistema bicameral: "O Senado se posicionou e bola para frente. Temos um sistema bicameral, cabe aceitar. Não tem sentimento de traição nenhum. Já houve vários episódios em que a Câmara discordou do Senado. Isso é natural da democracia", declarou o presidente da Câmara.
Apesar do discurso conciliador, os sinais de distanciamento ficaram claros. Em jantar promovido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, os dois até compartilharam rodas de conversa, mas quase não interagiram. Motta resumiu: “Eu o vi, mas não tratamos sobre isso (Blindagem)".
Mediação em andamento
Uma reunião para recompor a relação, que envolveria também o relator da proposta de anistia aos golpistas, Paulinho da Força (Solidariedade-SP), foi cancelada. Agora, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) tenta intermediar novo encontro, mas aliados reconhecem que a desconfiança entre os presidentes prevalece.
Na avaliação de deputados próximos a Motta, o desgaste poderia ter sido evitado se a PEC tivesse sido votada simultaneamente nas duas Casas, evitando o que classificam como “fritura política”. Críticas internas também apontam que o presidente da Câmara cedeu demais às pressões do Centrão, abrindo espaço para questionamentos sobre sua liderança.
Reações no Senado e no Planalto
Entre senadores, a versão é diferente: aliados de Alcolumbre argumentam que o texto aprovado na Câmara destoava das negociações, principalmente nos pontos que retomavam o voto secreto em ações criminais contra parlamentares e ampliavam o foro privilegiado para presidentes de partidos.
O Planalto aproveitou a rejeição para se distanciar da proposta. Em viagem a Nova York, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou a PEC como “vergonha nacional” e disse que sua derrubada era “previsível”.
Perspectivas
Com o Centrão irritado, líderes já falam em endurecer a posição, colocando em pauta a PEC da Segurança e o calendário do IR para forçar um realinhamento. Apesar da tensão, há quem defenda que manter o clima de confronto permanente prejudica a todos.
Como gesto de distensão, o Senado pode acelerar a análise da PEC que limita decisões monocráticas do Supremo Tribunal Federal, vista como um possível ponto de convergência para retomar a cooperação mínima necessária entre as duas Casas.