Empresa não pode demitir trabalhador por postagem política, mas há exceções
Demissão por opinião política é considerada discriminatória no Brasil
247 - As empresas brasileiras não podem dispensar um funcionário apenas por causa de opiniões políticas expressas em redes sociais ou em outros ambientes, explica reportagem da Folha de S.Paulo, que destacou que a prática é considerada dispensa discriminatória, vedada pela lei 9.029/1995.
De acordo com a legislação, quem for afastado nessas circunstâncias pode buscar na Justiça do Trabalho medidas como reintegração ao cargo, indenização por danos morais e multa equivalente ao dobro da remuneração do período de afastamento, acrescida de juros e correção. O tema ganhou força nas redes sociais após o assassinato do ativista pró-Donald Trump, Charlie Kirk, em uma universidade dos Estados Unidos, episódio que impulsionou campanhas virtuais pela demissão de supostos extremistas.
O impacto nas empresas e a polarização política
Nos EUA, empresas já afastaram funcionários por postagens consideradas ofensivas sobre o caso. No Brasil, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) incentivou a prática, apoiado por empresários como Tallis Gomes, do grupo G4 Educação. Ele admitiu ter solicitado ao setor de recursos humanos que revisasse o histórico de publicações de 400 colaboradores. “Não quero criminoso trabalhando comigo”, disse.
A reação contrária veio de setores da esquerda, que passaram a divulgar mensagens lembrando que demissões motivadas por opiniões políticas configuram crime trabalhista. Especialistas, no entanto, esclarecem que não se trata de crime, mas de prática discriminatória passível de condenação judicial.
O que dizem os especialistas em direito trabalhista
A advogada Carla Felgueiras, do escritório Montenegro Castelo Advogados Associados, destacou que “o simples fato de um funcionário expressar opinião política de forma razoável e respeitosa não pode ser usado como justificativa para dispensa”. Segundo ela, situações que envolvam dano à imagem da empresa ou associação indevida entre a marca e a posição do trabalhador podem, porém, justificar uma demissão por má conduta.
Já a advogada Vivian De Camilis, do Tilkian Marinelli Marrey Advogados, frisou que a liberdade de expressão deve ser exercida fora do ambiente corporativo. Postagens feitas no horário de trabalho, em canais oficiais ou relacionadas à atividade da empresa podem gerar advertências ou até demissão, especialmente quando há código interno de conduta.
A dificuldade em comprovar a dispensa discriminatória
Para que a Justiça reconheça uma demissão discriminatória, é preciso apresentar provas. Documentos, registros e testemunhas são fundamentais para que o trabalhador consiga reintegração ou indenização. A advogada Érica Coutinho, do Mauro Menezes & Advogados, ressalta que a lei 9.029 “foi pensada para proteger os trabalhadores de intimidação perpetrada por seus empregadores quando há dissonância de posição política”.
Priscila Kirchhoff, sócia do Trench Rossi Watanabe, lembrou que o artigo 5º da Constituição garante a liberdade de expressão, mas estabelece limites. “A liberdade de expressão é um direito fundamental, mas não é absoluto, devendo ser exercido com responsabilidade e sem prejudicar a honra, a privacidade, os direitos alheios ou a atividade empresarial”, disse.
O papel dos sindicatos
Clemente Ganz Lúcio, presidente do Fórum das Centrais Sindicais, afirmou que os sindicatos acompanham a situação e defendem cautela diante de casos isolados. “Nenhum trabalhador pode ser demitido por posicionamento político, seja por apoiar determinado candidato, ser filiado a um partido ou ser membro de sindicato”, afirmou. Ele ressaltou, no entanto, que atos que comprometam a imagem da empresa ou possam ser enquadrados como crime podem justificar a dispensa, inclusive por justa causa.