Com investigação, Trump tenta dar 'verniz legal' às tarifas contra o Brasil, afirmam analistas dos EUA
Presidente dos EUA busca base legal para justificar as sobretaxas após sair em defesa de Jair Bolsonaro, mas especialistas veem risco de derrota judicial
247 - A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de abrir uma investigação comercial contra o Brasil é vista por analistas norte-americanos e por membros do governo Lula (PT) como uma estratégia para conferir aparência de legalidade a possíveis tarifas que seu governo pretende impor ao país.
Ao associar publicamente a medida àquilo que considera uma “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro (PL), Trump expôs o caráter político da iniciativa, o que pode comprometer sua sustentação jurídica. O ex-mandatário e réu em uma ação penal no Supremo Tribunal Federal (STF) por supostamente tentar de de golpe de Estado para se manter no poder após a derrota no pleito presidencial de 2022.
Segundo especialistas ouvidos pela Folha de S. Paulo, a legalidade das tarifas impostas pelos EUA pode ser questionada, caso sejam efetivamente aplicadas, especialmente por terem como base um argumento claramente político. A avaliação é de que Trump teria extrapolado os poderes previstos na legislação comercial estadunidense, uma vez que não há qualquer emergência que justifique a aplicação de medidas unilaterais contra o Brasil sem aprovação do Congresso.
Segundo o economista Ryan Cummings, chefe de gabinete do Instituto para Pesquisa de Política Econômica de Stanford, a tentativa de Trump é clara. “Eles estão efetivamente tentando dar cobertura legal. Mas Trump já revelou o jogo em termos de qual é o propósito das tarifas. Agora, pessoas na administração reconhecem: 'é improvável que possamos vencer isso'. E então estão se esforçando para encontrar algo que acreditam poder justificar as tarifas”, disse.
Cummings destaca que, ao vincular as tarifas à defesa de Bolsonaro, Trump elevou as chances de derrota judicial e que ‘ficaria muito surpreso se a Starbucks ou diferentes empresas que usam suco de laranja brasileiro não tentassem processar alegando que o processo estabelecido não foi seguido”. Para o economista, a investigação com base na seção 301 da legislação comercial tem por objetivo “tentar encobrir” a motivação política da medida.
Mesmo assim, ele reconhece que, caso as tarifas de até 50% sejam implementadas e questionadas na Justiça, o governo Trump poderá usar o tempo até a decisão para construir um novo argumento formal que sustente as penalidades ao Brasil.
O diretor de economia do Conselho de Relações Exteriores dos EUA, Benn Steil, também considera ilegais as possíveis tarifas de Trump. Ele destaca duas fragilidades centrais: o fato de Trump ter citado a perseguição a Bolsonaro como justificativa e a alegação incorreta de que os Estados Unidos têm déficit comercial com o Brasil, quando na verdade o país registra superávit.
Steil afirma que, diante desse cenário, Trump pode recorrer a alternativas legais como a seção 301 ou a seção 232 para impor as medidas, embora reconheça que isso funcionaria como um “pretexto” jurídico. “Estas têm muito mais probabilidade de sucesso, mesmo que o raciocínio legal por trás de seu uso seja um pretexto”, afirma.
Dentro do governo brasileiro, a leitura é de que a abertura da investigação pode funcionar como instrumento de pressão política e também de sustentação legal para uma retaliação comercial. Integrantes do Planalto veem com ceticismo a possibilidade de que Trump recue das sobretaxas e concentre seus esforços apenas na investigação, que por si só já prejudica a imagem e os interesses comerciais do Brasil.
Trump tem recorrido à Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (IEEPA), de 1977, para justificar medidas comerciais agressivas. A norma, originalmente pensada para embargos e sanções em contextos de segurança nacional, vem sendo usada por seu governo como alicerce para ampliar sua autoridade sobre a política comercial externa, mesmo sem respaldo do Congresso.
O conselheiro sênior do Liberty Justice Center, Reilly Stephens, que participou de ação vitoriosa contra tarifas de Trump no Tribunal de Comércio Internacional, diz que a aplicação da IEEPA neste caso é infundada. “Eles têm imposto tarifas de uma forma em que basicamente consideram tudo como uma emergência. As drogas são uma emergência, práticas comerciais normais são uma emergência. E que aqui, o julgamento de uma figura política em seu país que tem pouco ou nada a ver com nosso país, é de alguma forma uma emergência no meu país. Ainda não entendi bem por quê”, ironiza.
Ainda conforme a reportagem, Stephens afirma que a abertura da investigação tem o objetivo claro de dar respaldo legal a uma decisão já tomada. “Eles não fizeram isso desde o início porque não queriam ter que justificar. Eles queriam apenas impor quaisquer tarifas que desejassem. Acho que a resposta é que querem impor tarifas e estão procurando uma maneira de fazê-lo”.
Segundo ele, ainda que o Liberty Justice Center não tenha incluído especificamente o caso do Brasil na ação judicial contra as tarifas de Trump, é possível que o tema seja abordado na audiência marcada para 31 de julho no tribunal de apelações, nos EUA — uma instância abaixo da Suprema Corte.
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