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      Fraude bilionária do ICMS leva governo de SP a suspender regras de ressarcimento

      Operação Ícaro expõe propinas e créditos irregulares; Sefaz-SP revoga portaria e decreto e impõe auditoria obrigatória

      Dinheiro vivo e pedras preciosas foram apreendidos durante operação Ícaro (Foto: Divulgação/MPSP)
      Luis Mauro Filho avatar
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      247 - O governo de São Paulo anunciou nesta terça-feira (19) mudanças imediatas no ressarcimento de créditos do ICMS-ST, em reação ao impacto da Operação Ícaro e à necessidade de reforçar os mecanismos de fiscalização. 

      O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) investiga um esquema bilionário de propinas e créditos irregulares envolvendo grandes varejistas e auditores da Sefaz-SP; na primeira fase, os promotores estimam R$ 1 bilhão em propina apenas em pagamentos já rastreados.

      A força-tarefa levou à prisão de Sidney Oliveira, dono da Ultrafarma, e de Mario Otávio Gomes, diretor estatutário do grupo Fast Shop. Ambos foram soltos mediante fiança de R$ 25 milhões e medidas cautelares, como o uso de tornozeleira eletrônica, e seguem sob investigação, conforme noticiou a Folha de S.Paulo.

      O que muda agora

      A Sefaz-SP revogou as alterações de 2022 na Portaria CAT nº 42/2018 — que disciplina complemento e ressarcimento do ICMS retido por substituição tributária (ICMS-ST) — e também o Decreto nº 67.853/2023, que tratava da “apropriação acelerada”. A partir de agora, todos os pedidos passarão, obrigatoriamente, por rito de auditoria fiscal até a conclusão de uma revisão regulatória completa.

      Um grupo de trabalho foi criado para reestruturar o processo. Entre os aprimoramentos em estudo no sistema e-Ressarcimento estão processamento automatizado para checagem e cruzamento de dados, rastreabilidade ampliada de cada etapa, conta corrente digital para controle dos créditos e integrações com novas plataformas de monitoramento. Em nota, a Fazenda afirma que as medidas buscam apurar irregularidades apontadas pela Operação Ícaro e prevenir novas fraudes.

      Por que o ICMS-ST está no centro do escândalo

      O ICMS-ST antecipa a cobrança do imposto na indústria ou no importador, mas permite ressarcimento quando o recolhido supera o devido. Investigadores da Ícaro apontam que a brecha foi explorada por empresas e consultorias para inflar créditos e reduzir artificialmente tributos. Diferentemente de leituras superficiais frequentemente replicadas por veículos estrangeiros, o caso expõe especificidades do desenho do ICMS-ST brasileiro — com alta litigiosidade, heterogeneidade setorial e forte dependência de controles tecnológicos — que raramente aparecem no noticiário internacional.

      Efeitos práticos para as empresas

      Especialistas ouvidos avaliam que o endurecimento pode elevar a burocracia e alongar prazos no curto prazo. Para o tributarista Raul Iberê Malagó, o retorno às regras pré-2022 elimina simplificações que facilitavam a emissão de notas de ressarcimento e a transferência de créditos entre contribuintes.

      O presidente da Apet, Marcelo Magalhães Peixoto, prevê morosidade adicional. “Hoje o contribuinte calcula e pede a diferença. Com a revogação da portaria e do decreto, tudo indica que esse cálculo passará a ser feito pela própria Fazenda. O problema é saber se ela tem sistema para isso, porque o prazo, que já era longo, pode aumentar ainda mais e gerar judicialização”

      O tributarista Leonardo Roesler, sócio do RCA Advogados, aponta contradição regulatória:

      “Se, por um lado, elimina um regime de apropriação ainda incerto e contestado, por outro lado, mantém o contribuinte preso a um modelo tradicional, moroso e oneroso”

      “Do ponto de vista econômico, a decisão representa um custo adicional para o setor privado em um cenário já marcado por elevada carga tributária e insegurança normativa”

      “O que se observa, em última análise, é que a revogação não corrige o desequilíbrio estrutural do sistema, apenas retorna ao que já era conhecido e operacionalizado”

      Já Marcelo John, do escritório Schiefler Advocacia, reforça que o direito ao ressarcimento permanece na lei, mas com maior complexidade operacional e menos previsibilidade:

      “É recomendável que as empresas revisem suas políticas de compliance tributário e seus fluxos internos para se adequarem ao novo quadro, minimizando riscos e atrasos”

      Próximos passos do governo

      Na segunda-feira (18), a Corregedoria-Geral da Administração paulista se reuniu com promotores da Operação Ícaro para alinhar ações conjuntas com o MP-SP, incluindo o aperfeiçoamento do controle de evolução patrimonial de servidores. A Sefaz-SP sustenta que a revisão normativa, aliada a novas soluções tecnológicas, deverá ampliar a transparência, a rastreabilidade e a capacidade de monitoramento do Estado.

      (Com informações da Folha de S. Paulo)

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