Crise cambial se agrava e Argentina tem apenas US$ 700 milhões no Tesouro, dizem operadores
Governo de Javier Milei acelera a venda de dólares para segurar o peso e busca socorro financeiro dos Estados Unidos
247 - A crise cambial na Argentina voltou a se intensificar. Segundo reportagem do Valor Econômico publicada nesta terça-feira (7), o Tesouro argentino estaria praticamente sem dólares, restando apenas cerca de US$ 700 milhões em suas contas, conforme estimativas de operadores de mercado. Para tentar conter a desvalorização do peso, o governo do presidente Javier Milei vem promovendo uma série de intervenções no câmbio, que já consumiram mais de US$ 1,5 bilhão em apenas seis dias de operações.
Na terça-feira, o Tesouro vendeu dólares pela sexta sessão consecutiva, com gasto estimado entre US$ 250 milhões e US$ 330 milhões. A ação teve efeito limitado, mantendo o peso praticamente estável, mas à custa de um grande desgaste das já escassas reservas em moeda norte-americana.
Banco Central limitado e pressão do FMI
O Banco Central da Argentina ainda detém cerca de US$ 10 bilhões em reservas internacionais, de acordo com cálculos privados. No entanto, o acordo firmado com o Fundo Monetário Internacional (FMI) impede o uso dessas reservas para intervenções diretas, exceto quando a cotação do peso ultrapassa a banda de flutuação autorizada — que, na terça-feira, variou entre 943 e 1.484 pesos por dólar.
No mês passado, o Banco Central já havia vendido US$ 1,1 bilhão para tentar conter a volatilidade. Agora, a estratégia passou a ser centralizada no Tesouro, que realiza as operações sem divulgar oficialmente os valores diários. Essa falta de transparência amplia o clima de incerteza e alimenta a especulação no mercado financeiro.
Governo busca apoio dos Estados Unidos
Com o caixa em colapso e os prazos de pagamento da dívida se aproximando, Milei tenta garantir um pacote de ajuda financeira de Washington. O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, afirmou que está em contato com o ministro da Economia, Luis Caputo, que viajou a Washington junto com o presidente do Banco Central, Santiago Bausili, para negociar um possível apoio emergencial.
Até o momento, o tamanho e o cronograma desse pacote seguem indefinidos. O governo argentino espera que uma sinalização positiva dos Estados Unidos — sob a liderança do presidente Donald Trump — possa aliviar as pressões sobre o câmbio e acalmar os investidores.
Peso derrete no mercado paralelo
Apesar das medidas restritivas adotadas nas últimas semanas, como a proibição de revenda de dólares por 90 dias e o aumento das vendas de contratos futuros de câmbio, a procura pela moeda norte-americana não diminuiu. A cotação no mercado paralelo já supera 1.500 pesos por dólar, enquanto o câmbio oficial está em 1.429,5 pesos.
A precificação dos contratos futuros indica que o mercado espera uma desvalorização de até 60% nos próximos 12 meses — um sinal de descrença nas políticas econômicas do governo Milei. Além disso, o país precisa pagar US$ 500 milhões em dívidas que vencem em novembro, o que agrava o quadro fiscal.
Eleições e tensão política
A crise ocorre em meio à campanha para as eleições legislativas de meio de mandato, marcadas para 26 de outubro. Milei tenta recuperar terreno político após a derrota contundente em uma votação provincial no mês passado. Enquanto isso, os títulos públicos argentinos continuam em queda: os papéis em dólar com vencimento em 2035 recuaram quase um centavo, sendo negociados a cerca de 56 centavos por dólar, segundo dados da Bloomberg.
O esgotamento das reservas, a instabilidade do peso e a incerteza política criam um cenário de alta vulnerabilidade para o governo argentino. A busca desesperada por apoio internacional expõe o fracasso das políticas de dolarização e ajuste fiscal radical, pilares do programa econômico de Javier Milei.