Nathalia Urban por Milenna Saraiva

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China mantém foco na produção e em alta tecnologia em meio à disputa com os Estados Unidos

Reunião do Partido Comunista Chinês definirá diretrizes para o próximo plano quinquenal, com prioridade à indústria e avanços tecnológicos

Xi Jinping (Foto: Reuters)

247 – O Partido Comunista da China se reunirá entre os dias 20 e 23 de outubro para definir as diretrizes econômicas do país para os próximos cinco anos, com ênfase em alta tecnologia, reindustrialização e fortalecimento do setor produtivo, segundo reportagem da agência Reuters. O encontro — conhecido como plenário — ocorre em meio à intensificação da rivalidade com os Estados Unidos, sob a presidência de Donald Trump, que recentemente ameaçou impor tarifas superiores a 100% sobre produtos chineses.

Apesar das expectativas de que Pequim adote medidas para estimular o consumo das famílias e reduzir os desequilíbrios entre oferta e demanda, analistas avaliam que o governo deve manter o foco em um modelo de crescimento baseado na produção e na exportação, considerado essencial para a projeção de poder global e para a segurança estratégica do país.

Política industrial como eixo central

O novo plano quinquenal 2026-2030, que será submetido à aprovação do Parlamento em março, deverá “reforçar o apoio à pesquisa de alta tecnologia e ao desenvolvimento industrial”, afirmou Chen Bo, pesquisador sênior do Instituto de Estudos do Leste Asiático da Universidade Nacional de Singapura. “Em termos de poder nacional, a manufatura continua sendo prioridade. Quando há conflito, o que realmente importa é a capacidade de produção, não o setor de serviços”, destacou.

Em um discurso publicado em julho pela revista Qiushi, o presidente Xi Jinping afirmou que o mundo vive transformações “nunca vistas em um século”, em que a revolução tecnológica e a competição entre grandes potências estão cada vez mais entrelaçadas. Xi defendeu que a China conquiste o “ponto estratégico mais alto” na corrida tecnológica global.

Atualmente, a China lidera setores como veículos elétricos, energia solar e eólica, e controla a produção de terras raras, insumo crucial para a indústria global. O país também prepara-se para eventuais negociações comerciais com Trump, enquanto reforça sua autonomia produtiva — com cadeias de suprimento predominantemente domésticas, exceto em áreas como aviões e semicondutores avançados.

Desafios internos: consumo fraco e endividamento

Apesar do sucesso industrial, o consumo doméstico permanece estagnado. A crise imobiliária, o desemprego entre os jovens e o endividamento dos governos locais limitam a capacidade de estímulo. Para o economista Larry Hu, do Macquarie Group, “se a demanda interna não reagir, o país enfrentará problemas de desemprego e deflação”. Ele acredita que Pequim só adotará medidas mais firmes de estímulo ao consumo quando a demanda externa enfraquecer a ponto de comprometer as metas de crescimento.

A consultoria Morgan Stanley prevê que o resultado do plenário será um marco de política voltado à tecnologia e à oferta, com “atenção incremental ao bem-estar social”, mas sem uma mudança estrutural. O relatório afirma que “uma recuperação decisiva da economia permanece improvável em 2026”, indicando continuidade da cautela fiscal e da prioridade à produção.

“Tudo é sobre produção”

Embora o governo tenha introduzido subsídios ao consumo, benefícios para famílias com crianças e aumentos modestos de aposentadorias, analistas consideram que essas ações ainda são insuficientes para impulsionar o mercado interno. Uma decisão recente da Suprema Corte que obriga empregadores e trabalhadores a contribuir para a previdência social é vista como um passo para fortalecer o sistema de bem-estar, mas as limitações fiscais restringem os avanços.

De acordo com Dan Wang, diretora da Eurasia Group na China, o novo plano deve dar “mais atenção à segurança social, à saúde e à proteção dos grupos de baixa renda”, mas sem alterar o foco central. “Em um país ainda muito marcado pelo marxismo, tudo gira em torno da produção”, afirmou.

Equilíbrio entre poder e prosperidade

Para Guo Tianyong, professor da Universidade Central de Finanças e Economia de Pequim, “a China precisa encontrar um equilíbrio melhor entre desenvolvimento industrial e políticas voltadas ao bem-estar da população”. No entanto, a deterioração do cenário global e a pressão por competitividade tecnológica tornam improvável uma mudança de rumo significativa.

Assim, o plenário de outubro deverá consolidar a visão de que a força industrial e a inovação tecnológica continuam sendo os pilares da estratégia chinesa, mesmo que isso implique adiar a expansão do consumo e a redução das desigualdades.

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