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Acordo de Tarcísio com criador do ET Bilu gera polêmica

Parceria do governo de SP com empresa ligada a Urandir e à teoria de Ratanabá foi cancelada após críticas de arqueólogos e especialistas

Urandir Fernandes de Oliveira e Roberto de Lucena (Foto: Divulgação/Governo do Estado de São Paulo)

247 - As famosas palavras “busquem conhecimento”, atribuídas ao enigmático ET Bilu e registradas pela TV Record em 2010, deram origem a um dos maiores memes do imaginário popular brasileiro. O suposto interlocutor do extraterrestre, o empresário Urandir Fernandes de Oliveira, acabou conquistando notoriedade entre adeptos de teorias conspiratórias — notoriedade que o levou, anos depois, a fechar um acordo oficial com o governo de São Paulo.

De acordo com a Folha de S.Paulo, Urandir, por meio de sua empresa Dakila Pesquisas, firmou em junho de 2024 um protocolo de intenções com a Secretaria de Turismo do estado para explorar o chamado Caminho de Peabiru. Trata-se de uma rede de trilhas indígenas pré-colombianas que, historicamente, ligava o litoral paulista à região andina no Peru.

Teorias controversas e o vínculo com Ratanabá

Embora reconhecido como rota ancestral de povos indígenas para comércio, trocas culturais e peregrinação, o Caminho de Peabiru ganhou nova interpretação com a Dakila. A empresa afirma que o trajeto se conecta a Ratanabá, uma suposta cidade construída por extraterrestres há cerca de 450 milhões de anos no coração da Amazônia — hipótese rejeitada por arqueólogos e historiadores.

No material oficial divulgado pelo governo paulista no momento da assinatura, não há menção direta à teoria de Ratanabá. Porém, documentos da parceria chegaram a sugerir que os caminhos se estenderiam até a Turquia, passando pelo Monte Nemrut.

Cancelamento e críticas da comunidade científica

Seis meses após o anúncio, em dezembro de 2024, o protocolo foi encerrado pela ausência de resultados práticos. Mesmo assim, a Dakila continuou visitando prefeituras paulistas, como em Cananeia e São Vicente, onde se apresentou como parceira do governo estadual — embora a parceria já estivesse oficialmente cancelada.

A gestão de São Vicente afirmou que só tomou conhecimento das controvérsias após a visita. “Foi durante a visita e após a repercussão que tivemos conhecimento aprofundado sobre as críticas e controvérsias envolvendo a Dakila Pesquisas, incluindo o posicionamento da Sociedade de Arqueologia Brasileira”, declarou a secretária municipal de Turismo, Juliana Santana. “Não compactuamos com qualquer forma de pseudociência”, completou.

Já a Prefeitura de Cananeia relatou que recebeu apenas promessas de relatórios técnicos, nunca entregues.

Urandir reage e acusa jornais

Procurado pela Folha, Urandir não concedeu entrevista direta. Por meio de sua assessoria, afirmou que a pesquisa sobre o Caminho de Peabiru segue de forma independente, sem comentar sobre Ratanabá.

Na madrugada de quinta-feira (2), o empresário publicou um vídeo em suas redes sociais acusando a imprensa de perseguição. “Deixem Dakila em paz, quieto, se não nós vamos realmente lançar algumas sujeiradas de vocês aí, tá?”, disse. Ao final, repetiu a célebre frase do ET Bilu: “busquem conhecimento”.

Relações políticas e repercussão

O secretário de Turismo de São Paulo, Roberto Lucena, chegou a chamar Urandir de “irmão e grande amigo” durante a assinatura do protocolo em 2024. Registros da época mostram o secretário elogiando o potencial turístico do Caminho de Peabiru.

Lucena já havia se encontrado com Urandir em ocasiões anteriores, inclusive em 2020, quando ainda era deputado federal e participou de uma reunião com o então secretário de Cultura do governo Jair Bolsonaro (PL), Mario Frias. Na época, Frias chegou a divulgar menções à Ratanabá em suas redes sociais.

Investigação arquivada e posicionamento da arqueologia

O caso foi alvo de apuração da deputada federal Sâmia Bôfim (Psol-SP), que acionou o Ministério Público pedindo esclarecimentos. A Promotoria, no entanto, arquivou a investigação por não identificar irregularidades, já que não houve repasse de recursos públicos à empresa.

A Sociedade de Arqueologia Brasileira reforçou que a teoria de Ratanabá é uma construção sem base científica. O arqueólogo Artur Barcelos, em dossiê publicado pela entidade, classificou as propostas de Urandir como pseudociência. “A ciência arqueológica refuta em absoluto essa tese”, afirmou, explicando que o discurso envolve até a criação de uma suposta civilização extraterrestre chamada Muril, responsável pela construção de Ratanabá e de seus caminhos interligados.

Tentativas em universidades e descrédito acadêmico

Além das iniciativas com prefeituras e governos, a Dakila buscou parcerias acadêmicas. A Universidade Estadual do Amazonas chegou a assinar um termo de cooperação em 2025, mas cancelou o projeto pouco tempo depois, sem detalhar os motivos.

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