Imposto de Renda: rixa entre Renan e Lira acende alerta no Planalto
Disputa entre os dois alagoanos pode ameaçar cronograma da proposta de Lula para ampliar isenção do Imposto de Renda
247 - A decisão do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), de indicar o senador Renan Calheiros (MDB-AL) como relator do projeto que amplia a isenção do Imposto de Renda reacendeu uma das disputas mais antigas da política brasileira. A medida, que envolve uma das principais promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), trouxe de volta o embate entre Renan e o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), dois rivais históricos que agora travam novo capítulo de protagonismo em torno do tema.
Segundo o jornal O Globo, o Planalto acompanha de perto os desdobramentos, preocupado com o impacto político da disputa sobre uma das vitrines eleitorais mais importantes de Lula para 2026. O projeto, aprovado na semana passada pela Câmara sob relatoria de Lira, eleva a faixa de isenção para rendas de até R$ 5 mil mensais, prevê reduções graduais para ganhos de até R$ 7.359 e cria uma alíquota mínima de 10% para contribuintes com rendimento superior a R$ 50 mil mensais. A estimativa é de impacto anual de R$ 30 bilhões, beneficiando cerca de 11 milhões de brasileiros.
Renan assume a relatoria e promete celeridade
Davi Alcolumbre confirmou que a proposta será analisada exclusivamente pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), presidida por Renan Calheiros, antes de seguir ao plenário. O senador já anunciou um cronograma de audiências públicas com a presença do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT); da ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB); do secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas; além de especialistas e representantes de categorias.
Renan prometeu conduzir a tramitação de forma rápida, mas deixou claro que pretende revisar pontos polêmicos. “Faremos um esforço para que o texto não volte à Câmara, mas, se forem necessárias mudanças, faremos, sim. O texto, lamentavelmente, foi deturpado em sua tramitação na Câmara. Não deixaremos que isso aconteça aqui. Queremos uma resolução rápida”, afirmou o senador, ao lado de Alcolumbre e dos líderes do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), e no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).
Disputa política e trocas de acusações
A escolha de Renan irritou Arthur Lira, que divulgou nota pedindo ao Senado que “não transforme o debate em embate político”. Segundo o deputado, “o texto foi construído com muito trabalho e diálogo, inclusive com o governo, e aprovado por unanimidade dentro do prazo. Que não se faça politicagem com um assunto tão relevante”.
Nos bastidores, a reação foi vista como um recado direto ao Planalto e a Renan, que, antes mesmo da votação na Câmara, havia tentado aprovar um projeto paralelo de isenção na CAE — movimento interpretado como tentativa de pressionar Lira a liberar a pauta. Após meses de impasse, o texto relatado por Lira acabou aprovado por 493 votos a zero.
Corrida contra o tempo no Congresso
O governo espera sancionar a medida ainda em 2025, para que as novas faixas de isenção entrem em vigor na declaração de 2026. No entanto, a rivalidade entre Renan e Lira acendeu um sinal de alerta sobre possíveis atrasos. Aliados de Renan afirmam que ele pretende suprimir trechos considerados “estranhos ao mérito”, como o que trata de cartórios, e usar o calendário de audiências para reforçar o papel do Senado como instância revisora.
Rivalidade que vem de longe
A animosidade entre os dois alagoanos é antiga e já se refletiu em diferentes frentes políticas. Em junho, Renan informou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que não tinha interesse em conciliação em processo movido por Lira, que o acusa de calúnia, difamação e injúria. Em documento enviado ao ministro André Mendonça, a defesa de Renan afirmou que ambos são “adversários políticos declarados” e que uma conciliação seria “infrutífera”.
A rivalidade também influencia o cenário eleitoral de Alagoas. Renan e Lira são cotados para disputar as duas vagas ao Senado em 2026. Para evitar que o conflito regional prejudique sua base, o Planalto tenta equilibrar as forças no estado. A nomeação da desembargadora Maria Marluce Caldas, tia do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (JHC), para o Superior Tribunal de Justiça foi interpretada como gesto do governo para amenizar a disputa e impedir que JHC entre na corrida ao Senado, fragmentando as bases políticas de ambos.
O foco do governo Lula
Renan é aliado histórico de Lula e pai do ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), enquanto Arthur Lira mantém forte influência como articulador na Câmara. A disputa entre os dois, que já se manifestou na reforma tributária e em indicações de cargos, agora ganha novo palco com o Imposto de Renda.
Para o Planalto, a prioridade é garantir que o cronograma de tramitação seja mantido. A proposta de ampliar a isenção do IR é vista como peça central do discurso de justiça tributária e distribuição de renda do governo. Mas há o temor de que a disputa pessoal entre os dois líderes alagoanos reproduza no Senado as tensões que já travaram outras pautas econômicas no primeiro semestre.
Renan deve concluir as audiências públicas nas próximas semanas e apresentar seu parecer até o fim de outubro. Depois disso, o projeto segue ao plenário para votação final — etapa decisiva para a promessa de campanha de Lula sair do papel.


