Xi Jinping projeta poder em desfile militar com Putin e Kim em Pequim
Evento marcou 80 anos da derrota do Japão na Segunda Guerra e reuniu líderes vistos como desafiadores da ordem ocidental
247 – O presidente da China, Xi Jinping, realizou nesta quarta-feira (3) o maior desfile militar da história do país, em plena Praça da Paz Celestial, em Pequim, ladeado pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin, e pelo líder da Coreia do Norte, Kim Jong Un. A reportagem é da Reuters. O evento, marcado por forte simbolismo, celebrou os 80 anos da derrota do Japão ao fim da Segunda Guerra Mundial, mas foi ignorado por líderes ocidentais.
Em seu discurso de abertura, Xi advertiu que o mundo atravessa um momento decisivo: “Hoje, a humanidade está diante da escolha entre paz ou guerra, diálogo ou confronto, ganhos mútuos ou jogo de soma zero”. O mandatário chinês declarou ainda que o povo da China “permanece firmemente do lado certo da história”.
A grandiosidade do desfile
Xi percorreu a praça em uma limusine conversível e inspecionou tropas e equipamentos de última geração, incluindo mísseis hipersônicos, drones submarinos e um inusitado “lobo robótico” armado. A celebração de 70 minutos contou com helicópteros carregando bandeiras, caças voando em formação e o lançamento de 80 mil pombas da paz.
Vestindo um traje no estilo de Mao Tsé-tung, Xi recebeu cerca de 25 líderes estrangeiros, entre eles o presidente da Indonésia, Prabowo Subianto, que surpreendeu ao comparecer em meio a protestos em seu país. Sua esposa, Peng Liyuan, foi ouvida cumprimentando convidados em inglês com frases como “Nice to meet you” e “Welcome to China”.
Durante a cerimônia, Xi dividiu a tribuna com Putin e Kim, com quem manteve conversas frequentes enquanto milhares de soldados marchavam diante deles. Foi a primeira vez em 66 anos que um líder norte-coreano participou de um desfile militar chinês.
A posição de Trump e as reações regionais
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reagiu ao evento em sua rede Truth Social, escrevendo: “Por favor, transmitam meus mais calorosos cumprimentos a Vladimir Putin e Kim Jong Un, enquanto conspiram contra os Estados Unidos da América”. Trump, no entanto, minimizou o impacto da parada, dizendo a repórteres que não a via como uma provocação direta a Washington.
O governo japonês evitou comentar, enquanto Taiwan — que Pequim considera parte de seu território — orientou sua população a não participar do evento. O presidente taiwanês, Lai Ching-te, criticou duramente o desfile: “Taiwan não comemora a paz pelo cano de uma arma”.
Xi e a visão de uma nova ordem mundial
Nos últimos dias, Xi reforçou sua narrativa de que a Segunda Guerra representou um ponto de virada na “grande revitalização da nação chinesa”, projetando o país como potência global. Em um encontro recente, o líder chinês condenou o “hegemonismo e a política de poder”, em crítica velada aos Estados Unidos.
“Xi sente-se confiante de que a mesa virou. É a China que agora está no banco do motorista”, avaliou Wen-Ti Sung, pesquisador do Atlantic Council. Ele acrescentou que “a principal fonte de incerteza no sistema internacional não tem sido a diplomacia agressiva da China, mas sim o unilateralismo trumpista”.
Em um banquete após o desfile, Xi voltou a enfatizar que a humanidade não deve retornar à “lei da selva”, defendendo uma ordem global baseada no diálogo e na cooperação.
Sinais de novas alianças militares
Analistas observam que a presença de Putin e Kim pode sinalizar aproximação militar mais estreita entre os três países, especialmente após a assinatura de pactos recentes entre Rússia e Coreia do Norte e entre China e Pyongyang. A agência russa TASS informou que preparativos estavam em andamento para uma reunião entre Putin e Kim na Casa de Hóspedes do Estado chinês.
Putin já havia aproveitado a visita para fechar novos acordos energéticos com Pequim, enquanto Kim buscava apoio tácito para seu programa nuclear, ainda banido pela comunidade internacional. Kim viajou acompanhado de sua filha, Ju Ae, considerada pela inteligência sul-coreana como provável sucessora, embora não tenha aparecido ao seu lado no desfile.
Modernização militar e purgas internas
O desfile também serviu para mostrar os avanços tecnológicos do Exército Popular de Libertação, mesmo em meio a uma intensa campanha anticorrupção que afastou mais de uma dúzia de generais próximos a Xi nos últimos dois anos.
“O evento permite que Xi concentre a atenção do mundo nos avanços impressionantes da modernização militar chinesa, ao mesmo tempo em que obscurece os desafios internos persistentes, em especial as purgas entre os oficiais mais graduados”, avaliou Jon Czin, analista do Brookings Institution.
Para além da política externa, a exibição de poder também teve como objetivo alimentar o patriotismo interno. Servidores públicos em todo o país foram instruídos a assistir ao desfile e registrar suas reflexões. Em seu discurso, Xi concluiu afirmando que a “revitalização da nação chinesa é imparável”.