Monarquias do Golfo se dizem "reféns" após bombardeios dos EUA ao Irã e temem catástrofe regional
Arábia Saudita, Catar, Omã e Emirados criticam ação americana e alertam para consequências devastadoras após ataque ordenado a instalações nucleares
247 - A recente ofensiva militar conduzida pelos Estados Unidos contra instalações nucleares iranianas acendeu o alerta máximo entre os países do Golfo Pérsico. Arábia Saudita, Catar, Omã e Emirados Árabes Unidos, que vinham tentando intermediar negociações entre Washington e Teerã, denunciaram o ataque como uma violação da soberania iraniana e alertaram para os riscos de uma escalada fora de controle no Oriente Médio.
A resposta dos Estados do Golfo foi imediata e contundente. O Ministério das Relações Exteriores da Arábia Saudita repudiou a operação por violar a integridade territorial do Irã. O governo do Catar previu “consequências desastrosas”, enquanto Omã classificou os bombardeios como “ilegais”. Todas essas nações têm se empenhado, há meses, em usar seu peso geopolítico e econômico para sustentar o diálogo nuclear e conter tensões.
No entanto, os esforços diplomáticos não foram suficientes para evitar que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em seu segundo mandato, ordenasse ataques a três locais ligados ao programa nuclear iraniano. Em declaração posterior nas redes sociais, Trump justificou a decisão dizendo que o objetivo era “destruir a capacidade de enriquecimento nuclear do Irã e interromper a ameaça representada pelo principal patrocinador estatal do terrorismo no mundo”. Ele completou: “Se não fizerem a paz, os próximos ataques serão muito maiores — e muito mais fáceis”.
População apreensiva e voos cancelados
Em diversos países do Golfo, a tensão se materializou em cenas de pânico. No Kuwait e nos Emirados Árabes Unidos, moradores correram para estocar alimentos e suprimentos. Companhias aéreas como a British Airways suspenderam temporariamente os voos para centros econômicos da região, como Dubai e Doha.
Essa situação contrasta com o tom otimista de pouco mais de um mês atrás, quando Trump realizou sua primeira viagem internacional após reassumir a presidência, visitando Arábia Saudita, Catar e Emirados. Na ocasião, o presidente exaltava a perspectiva de trilhões em investimentos e negócios com os países do Golfo e declarou: “Estamos forjando um futuro onde o Oriente Médio será definido pelo comércio, não pelo caos”.
Diplomacia marginalizada
Apesar dos repetidos apelos à moderação, os países do Golfo vêm sendo ignorados pelas três potências diretamente envolvidas: Estados Unidos, Israel e Irã. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e o líder supremo iraniano, aiatolá Ali Khamenei, também têm demonstrado desinteresse pelas tentativas de mediação.
Hasan Alhasan, pesquisador do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos no Bahrein, foi direto: “Não acho que os Estados árabes do Golfo tenham muito controle sobre os rumos dos acontecimentos neste momento. Não há garantia de que qualquer um dos lados — Irã, Israel ou os EUA — leve em consideração os interesses do Golfo”.
Apesar disso, autoridades da região afirmam que não há alternativa a não ser insistir na via diplomática. Com milhares de soldados americanos estacionados em seus territórios e infraestrutura petrolífera vulnerável, esses países temem ser arrastados para o centro do conflito — inclusive por um eventual vazamento nuclear, caso as instalações iranianas tenham sido atingidas de forma crítica.
A Agência Internacional de Energia Atômica já havia alertado no passado que ataques a instalações nucleares no Irã poderiam ter consequências gravíssimas e incontroláveis.
Medo de retaliação e novo colapso regional
A preocupação se intensifica com a possibilidade de retaliação. O ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbas Araghchi, relatou ter conversado com colegas do Oriente Médio que “estão muito preocupados e interessados em desempenhar um papel para acabar com essa agressão de Israel”. Em entrevista coletiva, classificou a ação americana como “ultrajante” e advertiu: “O Irã reserva todas as opções para defender sua soberania, seus interesses e seu povo”.
A ameaça de fechamento do Estreito de Ormuz, responsável por cerca de 25% do comércio global de petróleo, paira como risco concreto. Se isso acontecer, segundo estimativas da Bloomberg Economics, o barril de petróleo pode atingir a marca de US$ 130, pressionando ainda mais a economia mundial.
As milícias houthis do Iêmen, aliadas ao Irã, já declararam que estão prontas para atacar navios e embarcações militares dos Estados Unidos no Mar Vermelho.
Medo de novo vácuo de poder no Irã
Embora muitos governos do Golfo vejam com reserva o avanço do programa nuclear iraniano, há também um temor real sobre o que viria em caso de colapso do regime em Teerã. Segundo fontes da região ouvidas sob anonimato, persiste o trauma das guerras sectárias e do terrorismo que explodiram após a queda de Saddam Hussein no Iraque e os levantes da Primavera Árabe em outros países.
Para Ebtesam Al-Ketbi, presidente do centro Emirates Policy Center, sediado em Abu Dhabi, o grande desafio para os países do Golfo é evitar que a escalada se alastre por seus territórios sem perder os vínculos estratégicos com os Estados Unidos. “Eles provavelmente adotarão uma política de contenção pragmática, com maior prontidão defensiva e equilíbrio diplomático para absorver os impactos”, avaliou.
No momento, o sentimento predominante nas capitais do Golfo é de impotência. Como resumiu o analista Ryan Bohl, da consultoria Rane Network: “Para todos na região, resta agora esperar com o fôlego preso e torcer para que as lideranças em Teerã e Washington adotem posturas mais racionais diante dessa escalada”.
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