Europa precisa escolher entre sinceridade e cálculo nas relações com a China, diz Global Times em editorial
Jornal chinês critica postura ambígua da União Europeia e alerta para os riscos de seguir os EUA em práticas protecionistas
247 - Em editorial publicado na última sexta-feira (20), o jornal chinês Global Times advertiu que a União Europeia (UE) precisa demonstrar mais sinceridade e menos cálculo estratégico nas suas relações com a China. A crítica surge em meio a uma sequência de sinais contraditórios vindos de Bruxelas, que alterna gestos diplomáticos com ações consideradas hostis por Pequim, como novas restrições comerciais e declarações agressivas em fóruns internacionais.
A matéria destaca que, um dia antes do editorial, o ministro do Comércio da China, Wang Wentao, havia realizado uma reunião virtual com o comissário europeu para Comércio e Segurança Econômica, Maros Sefcovic. O encontro foi descrito como positivo, com ambas as partes manifestando o desejo de intensificar os esforços para avançar na agenda econômica e comercial bilateral ao longo do ano.
Contudo, a expectativa por um desdobramento construtivo foi frustrada rapidamente. A Comissão Europeia anunciou que passará a restringir a participação de empresas chinesas de dispositivos médicos em licitações públicas cujo valor ultrapasse 5 milhões de euros. A medida, interpretada por analistas como uma retaliação velada, reavivou tensões comerciais do bloco europeu com a China.
O Ministério das Relações Exteriores da China reagiu prontamente: “A UE afirma ser um dos mercados mais abertos do mundo, mas, na realidade, tem caminhado lentamente para o protecionismo. A China salvaguardará firmemente os direitos e interesses legítimos e legais das empresas chinesas”, declarou um porta-voz do governo chinês, segundo repercutido pelo Global Times.
Neste ano, que marca o 50º aniversário do estabelecimento de relações diplomáticas entre China com o bloco europeu, o jornal chinês considera a ocasião uma oportunidade histórica para renovar os laços bilaterais. Mas observa que, apesar de gestos diplomáticos, a UE segue emitindo “sinais negativos”, como restrições comerciais reincidentes e declarações hostis de suas autoridades em encontros como o Diálogo de Shangri-La e a Cúpula do G7.
Uma das declarações criticadas foi a da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que durante a Cúpula do G7 afirmou que o mundo enfrenta um novo “choque chinês”. Ela acusou a China de usar seu domínio sobre os ímãs permanentes de terras raras como arma geopolítica. Segundo o Global Times, von der Leyen, ao fazer tal afirmação enquanto segurava um ímã nas mãos, deu “um show que ninguém assistiu”, sendo solenemente ignorada pelos Estados Unidos no mesmo encontro.
O editorial critica ainda o que considera um erro estratégico da Europa ao seguir a retórica e práticas protecionistas do presidente dos EUA, Donald Trump, no campo comercial. “É particularmente alarmante que, no contexto das ameaças do governo Trump de impor altas tarifas contra a Europa, alguns na UE estejam agora seguindo o exemplo de Washington”, alerta o texto. Nesse cenário, destaca-se a postura mais equilibrada do chanceler alemão Friedrich Merz, que conclamou a Europa a manter sua autonomia: “Não somos suplicantes... não devemos nos tornar menores do que somos”.
O texto acusa certos setores da União Europeia de acreditar, equivocadamente, que podem arrancar concessões unilaterais da China por meio de pressão econômica e diplomática. Para o jornal chinês, essa tática seria tanto “irrealista” quanto “indigna” de um parceiro estratégico como a UE.
A publicação reforça que a China sempre procurou manter uma abordagem sincera com os europeus, mesmo diante das tensões internacionais, como a guerra na Ucrânia, os conflitos no Oriente Médio e a pressão tarifária dos Estados Unidos. “Compreendemos que a Europa deseja proteger seus interesses, mas isso não deve significar recorrer a medidas protecionistas e jogos políticos”, diz o texto.
O Global Times também recorda os números expressivos do intercâmbio econômico entre China e UE: mais de um terço do PIB global, mais de um quarto do comércio internacional e um volume médio diário de trocas superior a 2 bilhões de euros. Tais cifras são apresentadas como base sólida para enfrentar juntos o avanço do protecionismo global.
“O desenvolvimento saudável e estável das relações China-UE atende aos interesses de ambas as partes – e também é uma responsabilidade compartilhada”, pontua o editorial, que conclama a Europa a adotar uma postura de “autonomia estratégica real” e abandonar visões de curto prazo.
No mês passado, o presidente chinês Xi Jinping trocou mensagens de felicitação com o presidente do Conselho Europeu, António Costa, e com a própria Ursula von der Leyen. Xi destacou que as relações entre China e UE devem continuar baseadas na parceria, respeito mútuo aos sistemas sociais e ao modelo de desenvolvimento escolhido por seus povos.
“Olhando para trás, para os 50 anos de relações China-UE, a lição mais importante é que ambas as partes devem respeitar os interesses essenciais e as principais preocupações de cada uma”, afirma o editorial, em seu parágrafo final. O jornal conclui que a Europa precisa “alinhar palavras e ações” e retomar o espírito original que guiou o estabelecimento das relações diplomáticas com a China, sob pena de desperdiçar uma oportunidade estratégica para ambas as potências.
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