“O poder não pode ser exercido sem limite”, diz o psicanalista Luciano Elia
No Papo Curvo, Luciano Elia analisa o julgamento de Bolsonaro e militares à luz da psicanálise e da lei da castração
247 - No programa Papo Curvo, da TV 247, o psicanalista Luciano Elia analisou os efeitos políticos e simbólicos do julgamento de Jair Bolsonaro e de militares ligados à tentativa golpista de 8 de janeiro.
Para Elia, o julgamento representa um marco inédito na história brasileira: “É um julgamento histórico, sem dúvida nenhuma”. A novidade, segundo ele, não está apenas no fato de um ex-presidente da República ser processado por crimes contra a democracia, mas também na presença de militares no banco dos réus, algo inédito desde a anistia de 1979. Ao romper esse silêncio histórico, a Justiça lança luz sobre práticas que, por décadas, foram blindadas de qualquer responsabilização.
O psicanalista recorreu a um conceito fundamental da teoria freudiana e lacaniana para refletir sobre a conjuntura: a lei da castração. “Não é possível gozar plenamente do poder”, afirmou, explicando que a castração, no plano simbólico, estabelece os limites da vida em sociedade. Quando líderes políticos ou grupos tentam governar sem reconhecer restrições, o resultado é o autoritarismo. Nesse sentido, o julgamento assume papel crucial por reafirmar que até os mais altos cargos e corporações do Estado estão submetidos à lei.
Elia apontou que a sustentação do processo pelo Supremo Tribunal Federal, com o apoio do governo federal, reforça a legitimidade da democracia diante de um Congresso marcado por pressões da extrema direita. Para ele, trata-se de um raro momento em que as instituições cumprem sua função de impor barreiras a quem tentou dissolver as regras democráticas. Ao citar ministros como Alexandre de Moraes e Flávio Dino, destacou que, independentemente da trajetória individual de cada autoridade, é o lugar institucional que importa: a defesa da lei como limite ao poder.
Sobre as articulações no Parlamento para conceder anistia aos acusados, Elia foi taxativo: trata-se de uma tentativa de burlar a castração. “É a reação perversa de quem não aceita limites”, disse, avaliando que os esforços não devem prosperar diante da conjuntura atual.
Na leitura de Elia, o Brasil vive uma “pequena grande mudança”: ainda insuficiente para transformar por completo as estruturas políticas, mas significativa por instaurar um precedente. Ao incluir Bolsonaro e militares no banco dos réus, a Justiça abre caminho para que o país finalmente elabore capítulos de sua história antes silenciados. E, ao fazê-lo, reafirma um princípio central tanto para a psicanálise quanto para a democracia: todo poder tem limites. Assista: