Guido Mantega critica política monetária e afirma que Banco Central “erra na taxa de juros”
Ex-ministro da Fazenda diz que a política atual é “ortodoxa e equivocada” e alerta que juros altos travam o investimento e endividam famílias e empresas
247 – Em entrevista à TV 247 (assista aqui), o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega criticou a condução da política monetária brasileira, afirmando que o Banco Central “está errando na taxa de juros”.
Segundo ele, a atual diretoria manteve uma postura “ortodoxa e conservadora”, mesmo com a inflação em queda e o câmbio estável, o que, na sua avaliação, representa um equívoco que pode prejudicar o crescimento econômico.
“O Banco Central se entusiasmou com a ortodoxia”
Mantega afirmou que a nova equipe do Banco Central, comandada por Gabriel Galípolo, iniciou seu trabalho corretamente ao valorizar o real para conter a inflação, mas agora “se entusiasmaram com essa política ortodoxa”.
Ele destacou que, embora o fluxo de capitais para o Brasil esteja positivo, com mais de R$ 25 bilhões entrando na Bolsa, não há justificativa para manter os juros em torno de 15%.
“Agora eles já estão errando. Eu acho que se entusiasmaram com essa política ortodoxa. Não é preciso ter uma taxa de juros de 15% para manter essa equação favorável. Não deveria ter passado de 14,75%”, disse o ex-ministro.
Juros altos e economia travada
Durante a entrevista, Mantega alertou que os juros elevados começam a impactar negativamente o investimento e o endividamento da população.
Segundo ele, o Brasil já registra 8,5 milhões de empresas inadimplentes e cerca de 73 milhões de pessoas com dívidas em atraso, o que compromete quase metade da renda familiar.
“O brasileiro está endividado e, com juros tão altos, você vai arrebentar as pessoas. Daqui a pouco o governo vai ter que fazer um novo ‘Desenrola’ para salvar pequenas e médias empresas”, afirmou.
Ele também explicou que, embora o país ainda cresça devido ao aumento do emprego, da massa salarial e de programas de transferência de renda, o investimento privado já dá sinais de desaceleração. “O crescimento deste ano deve ficar entre 2,2% e 2,4%, abaixo dos 3,4% de 2023”, observou.
“O Banco Central tem um vírus”
De forma crítica, Mantega ironizou a cultura interna da autoridade monetária:
“O Banco Central tem um vírus mais forte que a COVID. Quem trabalha lá quer manter os juros elevados, porque é mais confortável controlar a inflação com taxa alta. Mas isso destrói a economia.”
Ele defendeu que o país poderia operar com uma taxa de equilíbrio entre 8% e 9%, como ocorre em economias latino-americanas. “Quando fui ministro, levamos a Selic a 7,25% com inflação de 6%, e funcionou. O problema é ideológico e político: o setor financeiro domina a formulação da política monetária”, declarou.
Críticas à “porta giratória” e elogios a Tombini
Mantega também mencionou o fenômeno conhecido como “porta giratória” — quando executivos do mercado financeiro assumem cargos públicos e depois retornam ao setor privado. “O compromisso público desaparece, o que vale é a saída para o mercado depois”, disse.
Ele elogiou Alexandre Tombini, presidente do Banco Central entre 2011 e 2015, por ser um servidor de carreira e não ter origem no sistema bancário. “O Tombini foi o melhor presidente do Banco Central dos últimos anos, porque era funcionário da casa, não passou pela porta giratória”, afirmou.
Perspectivas
Para o ex-ministro, o Banco Central “perdeu o timing” de iniciar a redução da Selic ainda em 2024, mas acredita que o movimento deve começar até janeiro. “Eu não acredito que sustentem essa taxa além de janeiro. O presidente Lula não vai concordar com isso”, disse.
Guido Mantega concluiu afirmando que a manutenção prolongada dos juros altos ameaça desmontar o dinamismo econômico conquistado nos últimos anos:
“Estamos entrando na fase em que o prejuízo é maior do que o benefício. O Banco Central está errando, e agora não tem conversa: precisamos mudar essa política.”


