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      Evandro Carvalho: "é hora de a gente falar do socialismo”

      Para professor da UFF e FGV, ascensão da China exige que o Brasil reflita sobre modelos alternativos ao liberalismo

      (Foto: Divulgação)
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      247 - Durante entrevista ao programa Boa Noite 247, o professor Evandro Carvalho, especialista em direito internacional e estudioso da China, defendeu que o Brasil precisa retomar o debate sobre o socialismo diante das transformações na ordem mundial lideradas pela ascensão chinesa. "É hora de a gente falar do socialismo", afirmou o professor, ao discutir as implicações da emergência de um novo modelo de governança global.

      A entrevista abordou temas como o papel geopolítico da China, as disputas com os Estados Unidos e os desafios do Brasil frente a um mundo cada vez mais multipolar. Carvalho — que é professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Fundação Getulio Vargas (FGV), além de ter morado e pesquisado na China por mais de uma década — apontou que o modelo chinês, baseado em um socialismo de características próprias, não pode mais ser ignorado.

      "Essas palavras que foram demonizadas no século XX ali no período da Guerra Fria, talvez elas precisem ser discutidas com tranquilidade", defendeu o professor. "Não se trata de revisitar sentimentos ou reeditar modelos antigos. O mundo é completamente outro. O socialismo da China tem uma outra característica."

      Carvalho ressaltou que a combinação entre planejamento estatal e mercado, levada adiante pela China, subverte os binarismos tradicionais que marcaram o debate político do século passado. "O que a China prova é que o socialismo dela transa bem com o capitalismo", disse. "Como o chinês mesmo diz: 'A gente já fazia comércio antes do capitalismo existir'."

      A disputa EUA-China e a transição global

      Ao analisar o cenário geopolítico, Evandro Carvalho descreveu os Estados Unidos como uma potência em declínio, com dificuldades para lidar com a ascensão chinesa. “Os Estados Unidos não vão ceder o trono pacificamente para a China. Nem ocorreu isso quando o cetro do poder passou da Inglaterra para os EUA”, disse.

      Ele também destacou a emergência de novos códigos diplomáticos promovidos pela China, como o conceito de “comunidade de destino compartilhado” e a proposta de “democracia de processo integral”. Para o professor, “os países como Brasil e China querem maior democratização do sistema internacional, enquanto os países do Ocidente, que se dizem exemplos de democracia, são muito autoritários no plano internacional”.

      Segundo Carvalho, essa mudança estrutural do sistema internacional, com maior protagonismo de países não ocidentais, deve provocar transformações profundas na lógica de poder global. “O BRICS já tem um PIB maior que o G7. Países como China, Índia, Rússia, Indonésia, México e Brasil estão subindo na pirâmide global, enquanto os países ocidentais estão descendo”, analisou.

      Brasil e China: uma parceria estratégica

      Para Evandro Carvalho, o Brasil tem a oportunidade de aproveitar a parceria com a China não apenas em termos comerciais, mas também em ciência, educação e desenvolvimento tecnológico. “O Brasil tinha que abraçar essa proposta de sair do grão para as mentes”, declarou.

      Ele afirmou que a China pode ajudar o Brasil a romper com sua dependência do agronegócio e avançar em áreas estratégicas como a engenharia espacial e o setor de saúde. “A China aposta muito no cérebro. O futuro está aí”, observou.

      Ao refletir sobre o papel do Brasil no novo arranjo global, Carvalho afirmou que o país precisa de um “engajamento maior na defesa da soberania”, e que isso só será possível com o fortalecimento da educação, da solidariedade nacional e da construção de um projeto de país. “A reconstrução de um projeto de nação, tendo como um grande valor a nossa diversidade, casa muito bem com o diálogo com a China”, disse.

      A crítica ao liberalismo e o resgate do projeto coletivo

      Carvalho também criticou o esvaziamento das democracias liberais, que em sua visão foram capturadas por projetos de poder personalistas e interesses privados. Ele citou o ex-presidente dos EUA, Donald Trump, como um exemplo de liderança que “joga contra o próprio país” e atacou a atuação da extrema direita no Brasil, dizendo que ela tenta demonizar a China e o comunismo ao mesmo tempo em que negocia com o país asiático.

      “A extrema direita demoniza o comunismo e implodiu a democracia por dentro, mas fecha negócios com a China pela manhã e a critica à noite”, disse. “Se a China é nosso maior parceiro comercial, por que não conhecer mais sobre ela e entender como funciona seu sistema?”

      Ao final, Carvalho sugeriu que a experiência brasileira poderia enriquecer esse debate, especialmente se o país revisitar o saber ancestral dos povos originários. “Quanto mais eu estudo a filosofia chinesa, mais eu vejo conexões com os nossos povos originários. A relação entre ser humano e natureza, por exemplo, está presente nos dois universos”, afirmou.

      “A gente precisa discutir esses assuntos com abertura e tranquilidade, para pensar este mundo contemporâneo e posicionar o país da melhor forma possível.” Assista: 

       

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