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Projeto que iguala crime organizado a terrorismo pode punir a economia

Especialistas alertam que proposta no Congresso cria risco à presença de multinacionais e fragiliza moradores de áreas dominadas por grupos armados

Facções Primeiro Comando da Capital e Comando Vermelho (Foto: Reprodução / Divulgação)

247 - A proposta em tramitação na Câmara dos Deputados de incluir as facções criminosas na Lei Antiterrorismo gerou forte debate sobre seus impactos econômicos e sociais, conforme relatado pelo jornal O Globo. A análise reúne especialistas que alertam para consequências como a retração de empresas estrangeiras e o aumento da vulnerabilidade de moradores de áreas de dominação territorial.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) analisa um projeto que amplia a definição legal de terrorismo para incluir atos de “domínio ou controle de área territorial”, o que poderia englobar grupos como o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC). Caso aprovado, a nova redação também visa punir a “taxa de proteção” cobrada por essas organizações como financiamento ao terrorismo, com reflexos para pessoas e empresas.

A mudança busca endereçar a expansão dos grupos armados em territórios urbanos. Estudo da Universidade Federal Fluminense (UFF) apontou que no Rio de Janeiro cerca de 18% do território estava sob dominação de grupos armados no ano passado. A justificativa legislativa sustenta que essas facções “dominavam territórios, impedem o acesso da população a serviços públicos básicos, prejudicam infraestruturas críticas e tolhem a liberdade individual e econômica no país”.

Contudo, especialistas chamam atenção para efeitos colaterais: empresas multinacionais e instituições financeiras tendem a adotar critérios mais rigorosos em locais considerados de risco, o que poderia inibir investimentos em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo. O coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec, Renato Galeno, ressalta que “grandes empresas que atuam no mercado de petróleo, por exemplo, tomam o cuidado de destacar um pessoal específico para atuar em áreas conflagradas. Isso poderia ser um problema para esse tipo de investimento em um estado como o Rio”.

Outro risco indicado refere-se à reputação do Brasil como destino de negócios. O professor do programa de Relações Internacionais da PUC Minas, Jorge Lasmar, observa: “No Rio, onde o CV exerce um tipo de governança criminal territorial, que cobra uma taxa de proteção de condomínios, de pequenos negócios, a lei estabelecerá que esses atores vão estar financiando terrorismo? Isso também afetaria a reputação brasileira, passando a imagem de país dominado por grupos terroristas".

Além disso, o projeto já inspira comparações com casos internacionais. A francesa Lafarge — que admitiu ter feito pagamentos a entidades ligadas ao Estado Islâmico e fechou acordo de quase US$800 milhões com o governo dos EUA — é citada como alerta. Outro caso é o da americana Chiquita Brands, multada por pagamentos a grupo paramilitar designado terrorista nos EUA. Esse tipo de precedente mostra como a equiparação pode abrir brechas para sanções estrangeiras.

A própria definição de terrorismo guarda divergências. A Lei Antiterrorismo brasileira já prevê atos praticados “por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito”, com objetivo de “provocar terror social ou generalizado”. O novo projeto pretende incluir na definição ações destinadas a “impor domínio ou controle de área territorial”. Já o Conselho de Segurança da ONU fala em atos com a finalidade de “intimidar a população ou forçar um governo” a agir conforme interesses do grupo.

A proposta encontra resistência do governo Lula (PT), que argumenta que facções como CV e PCC devem ser tratadas como organizações criminosas, não terroristas. 

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