"Eles vão sair perdendo", afirma Rubens Ricupero sobre tarifaço de Trump contra o Brasil
Ex-embaixador em Washington diz que pressão de empresários dos EUA sobre Trump será mais ‘efetiva’ que negociação diplomática contra o ‘embargo’ tarifário
247 - O diplomata e ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero classificou como “embargo” o tarifaço de 50% anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre produtos industrializados brasileiros. Para ele, trata-se do momento mais grave nas mais de duas centenas de anos de relações comerciais entre os dois países.
“Na maior parte dos casos, vai se tornar inviável a exportação, já que 50% é uma tarifa muito alta”, avaliou Ricupero ao jornal O Globo. Segundo ele, apenas empresas com fábricas fora do Brasil poderiam buscar rotas alternativas, embora isso também esteja sujeito a retaliações adicionais. “Eu não sei se isso levaria a uma outra medida por parte do governo americano”, alertou.
“É um embargo” - Ricupero concordou com a Embraer, que chamou a medida de embargo, e afirmou que a única alternativa viável para conter a ofensiva seria a mobilização de setores empresariais dos Estados Unidos com interesses diretos no Brasil. “Eles vão sair perdendo. [...] A esperança é que esses setores possam ser ouvidos pelo presidente Trump. Será mais efetivo do que os canais diplomáticos”, disse.
Ele citou uma manifestação da American Chamber of Commerce nos EUA, que destacou a existência de mais de 6 mil empresas norte-americanas envolvidas com produtos brasileiros. Ricupero observou que esses setores podem fazer pressão real, inclusive por sofrerem impactos diretos, já que empresas como a Embraer também compram componentes eletrônicos nos Estados Unidos.
Tarifa e retaliação política - Ao comentar o trecho da carta enviada por Donald Trump ao governo brasileiro, em que o presidente norte-americano insinua uma perseguição a Jair Bolsonaro (PL), Ricupero foi taxativo: “isso é o que torna o caso brasileiro único, grave. [...] É uma interferência aberta no Judiciário. Inclusive, a mensagem veio para o destinatário errado. O Lula não tem autoridade nenhuma nessa questão”.
Para ele, o uso da Seção 301 da Lei de Comércio dos EUA é uma tentativa de dar aparência legal a uma decisão já tomada. “O procedimento da seção 301 é um tribunal em que eles são acusadores, juízes e executores. Então a chance de se defender é mínima”, criticou.
“Não é muito verdade que a nossa economia é fechada” - Ricupero também refutou a ideia de que o Brasil adota uma política protecionista. “Todo mundo diz isso, que a nossa economia é fechada, mas não é muito verdade”, afirmou. Ele citou dados da Confederação Nacional da Indústria, segundo os quais a tarifa efetiva praticada pelo Brasil sobre produtos dos Estados Unidos é inferior a 3%.
Ele também revelou tentativas frustradas de negociação por parte do Brasil, que propôs aos EUA a redução da tarifa sobre etanol em troca de melhor acesso ao mercado de suco de laranja e açúcar. “Eles não aceitaram”, lamentou.
Reindustrialização em xeque - Para Ricupero, o tarifaço ocorre em um contexto em que o Brasil já enfrenta sérias dificuldades para reindustrializar sua economia. “Não vejo a mais remota possibilidade de isso acontecer no momento”, disse. Entre os obstáculos, ele apontou o alto custo do capital com a taxa Selic em 15%, a instabilidade cambial e a burocracia.
Mesmo com a instalação de fábricas de montadoras chinesas, ele vê limitações. “É uma decisão de um investidor estrangeiro. [...] As perspectivas de industrialização são limitadas”, afirmou. “Os investidores brasileiros não investem, porque com uma taxa Selic de 15% quem é que vai investir em indústria?”, questionou.
Mesmo tendo perdido participação no PIB, Ricupero ressalta que a indústria brasileira ainda é diversificada, especialmente voltada ao mercado interno. “É isso que tem mantido essa indústria. E há alguns setores que se destacam. Temos empresas como a Weg, a Tupy, a Embraer”, disse. Ele defendeu estímulos do BNDES a esses segmentos com histórico de eficiência e inovação.
Energia limpa e futuro industrial - Apesar das críticas, Ricupero enxerga oportunidades na transição energética. “Pode ser que no futuro exista uma oportunidade na transição da energia, à medida que o problema climático se torne grave”, avaliou. Ele destacou o potencial do Brasil em fontes renováveis, como solar, eólica, biomassa e hidrogênio verde, mas cobrou ação concreta. “Até agora, como você sabe, há muitos anúncios de hidrogênio, mas pouca coisa saiu do papel”.
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