EUA 'sentem falta' do café brasileiro, admitiu Trump a Lula
Inflação do café nos EUA chega a maior alta em décadas após tarifa de 50% sobre produto brasileiro
247 - O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, admitiu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) o impacto da ausência do café brasileiro no mercado americano, em meio à disparada dos preços da bebida. A conversa ocorreu na segunda-feira (6) por videoconferência a pedido de Washington e teve como pano de fundo a política tarifária imposta recentemente contra o Brasil.
De acordo com a BBC News Brasil, que obteve detalhes do encontro, a medida do governo americano agravou a inflação no setor. Dados do Escritório de Estatísticas dos EUA indicam que, em agosto, primeiro mês de vigência da tarifa de 50% sobre o café brasileiro, os preços subiram 3,6% — a maior alta mensal em 14 anos e nove vezes superior à inflação geral do período (0,4%). Na comparação anual, a inflação do café chegou a 20,9%, o maior salto desde 1997.
Impacto da tarifa no consumo americano
A situação se torna ainda mais delicada porque os Estados Unidos são o maior consumidor e importador mundial de café, além de serem o principal destino das exportações brasileiras do produto. Estima-se que dois terços da população adulta norte-americana bebam café diariamente, com uma média de três xícaras por pessoa. O consumo da bebida cresceu 7% desde 2020, enquanto a demanda por cafés especiais aumentou 18%.
Por ser uma cultura tropical, o café não é cultivado em escala suficiente em território americano, com exceção de áreas limitadas no Havaí, Porto Rico e sul da Califórnia. Assim, praticamente todo o abastecimento vem de importações — e o Brasil responde por cerca de um terço desse mercado.
Além do Brasil, a Colômbia também foi alvo da política tarifária de Trump, embora em nível menor, com taxa de 10%. Segundo reportagem da CNN americana, a expectativa é de que os preços continuem em alta enquanto durar a sobretaxa.
Exportações brasileiras em queda
O efeito da medida já se reflete na balança comercial. Em setembro, as exportações de café brasileiro para os EUA caíram 47% em volume e 31,5% em valor, chegando a US$ 113,8 milhões. No total, as vendas brasileiras ao mercado americano recuaram 20,3% em relação ao mesmo mês de 2024, somando US$ 2,58 bilhões, conforme dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC).
Em contrapartida, as importações vindas dos EUA aumentaram 14,3%, alcançando US$ 4,35 bilhões, o que resultou em déficit de US$ 1,77 bilhão para o Brasil. O impacto foi tão significativo que o superávit brasileiro com o mundo caiu 41% em setembro, recuando para US$ 3 bilhões.
Conversa diplomática entre Lula e Trump
Durante a videoconferência, Lula pediu a Trump a retirada da tarifa sobre o café e outras barreiras comerciais. O presidente brasileiro também solicitou o fim das restrições impostas a autoridades do país, como a cassação de vistos e sanções financeiras ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
Segundo o Palácio do Planalto, o diálogo, que durou cerca de 30 minutos, ocorreu em “tom amistoso”. Trump, em tom descontraído, comentou sobre os problemas que enfrentou durante a Assembleia da ONU, afirmando que a interação com Lula foi o ponto positivo: “Pelo menos a ONU serviu para alguma coisa”, disse, segundo relato de fonte presente.
Na rede Truth Social, Trump declarou: “Tive uma ótima conversa telefônica com Lula. Discutimos muitos assuntos, mas o foco principal foi a economia e o comércio entre nossos dois países. Teremos novas discussões e nos encontraremos em um futuro não muito distante, tanto no Brasil quanto nos EUA”.
Perspectivas para os próximos encontros
O Palácio do Planalto destacou que Lula reiterou convite a Trump para participar da COP30, em Belém (PA), e aventou a possibilidade de um encontro bilateral durante a Cúpula da ASEAN, na Malásia. O presidente brasileiro também se disse disposto a viajar a Washington.
Trump não confirmou uma data, mas determinou que as negociações prossigam com seus assessores. Ele designou o secretário de Estado, Marco Rubio, para conduzir as tratativas com o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), o ministro das Relações Exteriores Mauro Vieira e o ministro da Fazenda Fernando Haddad (PT).
Para o governo brasileiro, a reaproximação sinaliza uma tentativa de restaurar os laços históricos de mais de dois séculos entre as duas maiores democracias do Ocidente, ainda que o comércio de café, uma das commodities mais emblemáticas da relação bilateral, continue a ser o epicentro das tensões.