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Após jovem ser decapitado no Paraná, ameaças fazem crianças indígenas deixarem escolas

Ministério Público recomenda reforço de segurança após assassinato e cartas que prometem ataques contra estudantes Avá-Guarani

Crianças Avá Guarani observam não indígenas em frente a TI Guasu Guavirá (PR) (Foto: Povo Avá Guarani)

247 - Crianças indígenas da etnia Avá-Guarani, que vivem no oeste do Paraná, deixaram de frequentar a escola por medo de novos ataques. A decisão das famílias veio após o assassinato brutal de um jovem indígena em julho, quando seu corpo foi encontrado decapitado junto a uma carta que trazia ameaças contra comunidades e, principalmente, contra os alunos que utilizam o transporte escolar. As informações são do g1 e da RPC.

O documento, segundo o Ministério Público do Paraná (MP-PR), dizia: "[...] nós vamos matar mais de vocês, iremos invadir as aldeias já existentes, atacaremos os ônibus com as vossas crianças dentro, queimaremos vivos. Não é uma ameaça vazia, mas, sim, recheada com ódio."

A carta também exigia que as comunidades interrompessem processos de retomada de terras garantidos por um acordo homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e conduzido pela Itaipu Binacional, que prevê a compra de áreas para os povos indígenas da região.

Segundo o MP, mais de 500 crianças, com idades entre 2 e 12 anos, vivem nas aldeias de Guaíra e outras localidades que compõem os territórios Tekoha Guasu Guavirá e Tekoha Guasu Okoy Jakutinga. Parte delas já deixou de comparecer às escolas.

A liderança indígena Vilma Rios relatou a gravidade da situação: "No último assassinato foi deixado um bilhete onde o alvo são as crianças que estudam nas escolas públicas das cidades. Na carta, eles disseram para nós recuarmos, se isso não acontecesse iriam queimar ônibus escolar com nossas crianças dentro. Sabemos que eles realmente podem fazer isso, porque existem dois ônibus escolares apenas com estudantes indígenas."

Além do medo do transporte, os estudantes enfrentam outro problema: o preconceito. A advogada Ana Caroline Silva Magnoni, da Comissão Guarani Yvyrupa, afirmou que "recebemos relatos de crianças que não conseguem dormir e têm medo de ir à escola. Além das ameaças no transporte, muitas também enfrentam racismo e hostilidade dentro das próprias instituições de ensino. Isso causa evasão escolar, afeta a saúde mental e pode até gerar cortes no Bolsa Família, já que a frequência é exigida."

Medidas de segurança e evasão escolar

O MP-PR e o Ministério Público Federal (MPF) recomendaram, na última sexta-feira (15), que as forças de segurança adotem medidas emergenciais, como o aumento do policiamento nos trajetos escolares, vigilância nos pontos de embarque e desembarque, além do monitoramento de crimes de racismo e ameaças. As instituições têm 20 dias para apresentar providências.

Prefeituras da região confirmam a evasão. Em Terra Roxa, 48 crianças indígenas estão matriculadas em duas escolas municipais, mas muitas deixaram de embarcar nos ônibus. Já em Guaíra, 260 estudantes indígenas frequentam 25 instituições de ensino. A maior parte, no entanto, precisa estudar em escolas não indígenas, o que eleva o risco de deslocamentos.

A principal reivindicação das comunidades é a construção de escolas dentro das aldeias. Para Vilma Rios, apenas medidas emergenciais não resolvem: “A única forma de garantir a proteção das nossas crianças é a demarcação do território e a construção de escolas dentro da aldeia.”

Conflito histórico por terras

A região oeste do Paraná enfrenta disputas fundiárias há décadas. A Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, por exemplo, se sobrepõe a mais de 370 propriedades rurais, segundo levantamento da Comissão Guarani Yvyrupa, e é alvo constante de pressão do agronegócio.

Os conflitos se intensificaram desde a construção da Usina de Itaipu, que alagou áreas tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas. Hoje, muitas aldeias estão em territórios sem demarcação oficial. Para tentar avançar na regularização, o Incra iniciou, em junho, a avaliação de áreas a serem adquiridas. As primeiras famílias foram assentadas em julho, mas o processo completo não tem prazo para ser finalizado.

A Itaipu Binacional afirma que já construiu escolas indígenas em municípios vizinhos e que pretende ampliar o apoio educacional em parceria com governos locais e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

Enquanto isso, o medo segue sendo rotina para centenas de crianças que deveriam estar apenas aprendendo, mas agora vivem sob ameaça de violência.

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