Conflito entre facções transforma município paulista em epicentro da violência
Sem domínio definido no tráfico, Rio Claro vive aumento de homicídios e disputa entre PCC e CV
247 - A cidade de Rio Claro, no interior de São Paulo, enfrenta uma onda de violência que preocupa autoridades e moradores. Em 2025, foram 24 homicídios dolosos, oito deles por execução, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. O número representa um aumento de 26,3% em relação ao ano anterior, elevando a taxa de assassinatos por 100 mil habitantes para quase o triplo da média estadual.
De acordo com informações apuradas pelo g1, o crescimento nos crimes violentos está ligado a uma disputa entre facções criminosas. Enquanto o Comando Vermelho (CV) domina o tráfico em boa parte do país, em São Paulo o Primeiro Comando da Capital (PCC) mantém a hegemonia — com exceção de Rio Claro, onde esse domínio se mostra frágil e em disputa.
Cidade estratégica e sem hegemonia no tráfico
Três fatores explicam o cenário de tensão: a localização estratégica do município, cercado por rodovias importantes como Anhanguera, Bandeirantes e Washington Luís; um histórico de ausência de controle único sobre o tráfico; e a fragilidade da presença do PCC, que enfrenta resistência de grupos locais.
Essa instabilidade abriu espaço para o surgimento de novos aliados e rivais, como o “Bonde do Magrelo”, grupo formado por dissidentes do PCC que se uniram ao CV. Um relatório da polícia aponta que, em março, uma base logística do Comando Vermelho foi descoberta em Hortolândia, servindo como ponto de apoio para o avanço da facção na região.
Taxas de homicídios em alta e medo nas ruas
Com 11,92 homicídios por 100 mil habitantes, Rio Claro supera amplamente a média estadual de 4,09. Em 2024, o índice já havia sido alto — 13,85 por 100 mil —, mais que o dobro da média paulista. O delegado seccional Paulo César Junqueira Hadich confirma que parte dos crimes está relacionada à guerra entre facções:
“Nós temos as motivações comuns, mas há também homicídios ligados a disputas de espaço e poder entre grupos criminosos”, afirmou.
Moradores relatam o aumento do medo. Um residente há mais de duas décadas diz que “a violência aumentou consideravelmente” e que é preciso redobrar a atenção ao sair de casa. Outra moradora, Mônica Silveira, de 42 anos, conta que o medo alterou sua rotina:
“Hoje eu fecho o portão logo às 18h, porque a gente tem medo de acontecer alguma coisa. Só se ouve falar de morte e assalto.”
Disputa entre PCC, CV e dissidentes locais
As investigações revelam que o CV tem como líder na região Leonardo Felipe Panono Scupin Calixto, conhecido como “Bode”, e como braço direito Edvaldo Luís Lopes Júnior, o “Grão”. O PCC teria decretado a morte de ambos, levando “Bode” a fugir para o Rio de Janeiro.
Fontes policiais indicam que o PCC tem se concentrado no tráfico internacional e na lavagem de dinheiro, abrindo espaço para grupos menores atuarem no comércio local. “Quem executa muitas vezes não é da região, e testemunhas têm medo de falar. Nosso trabalho é técnico e minucioso”, explicou Hadich, que afirma já ter solucionado cerca de metade dos crimes relacionados às disputas.
Operação desmantela base do Comando Vermelho
O monitoramento de “Grão” levou a polícia até uma chácara em Hortolândia, usada como entreposto entre Rio Claro e o Rio de Janeiro. No local, foram apreendidos 96 quilos de drogas, armas, munições, rádios comunicadores e dinheiro. As embalagens exibiam o símbolo “CV”.
O proprietário, Wilson Balbino da Cruz, conhecido como “Japonês” ou “JJ”, foi preso em flagrante. Segundo a investigação, ele era peça-chave na logística do Comando Vermelho em São Paulo, responsável pelo armazenamento e distribuição de drogas e armas.
Autoridades reforçam operações e apelos à população
O delegado Hadich afirma que as investigações continuam e que o apoio da população é essencial para conter o avanço das facções:
“A polícia é técnica e capacitada, mas precisamos que as pessoas denunciem para chegarmos mais rápido aos autores e evitar novos crimes.”
O diretor do Departamento de Polícia Judiciária do Interior 9 (Deinter 9), Kleber Altale, destacou a atuação conjunta entre forças policiais e o Ministério Público:
“A Polícia Civil tem fortalecido as investigações em Rio Claro, com apoio do Ministério Público e da Polícia Militar. Estamos somando esforços para dar a melhor resposta possível.”
A defesa de Leonardo Calixto afirmou, em nota, que o processo corre em segredo de Justiça e classificou como “absolutamente improcedentes” as acusações. As defesas de Wilson Balbino e Edvaldo Lopes Júnior não se manifestaram até o fechamento da reportagem.


