Homens criam comunidade exclusiva para brancos heterossexuais nos EUA
A Return to the Land conta com cerca de 40 moradores e centenas de apoiadores virtuais
247 - Nas montanhas Ozark, no Arkansas, um pequeno grupo de agricultores está tentando construir uma comunidade exclusivamente para brancos heterossexuais, em um projeto que reacendeu debates sobre racismo, segregação e legalidade nos Estados Unidos. A reportagem foi publicada pela Folha de S.Paulo, com base em informações de veículos internacionais como The Forward, Sky News e The New York Times.
Batizado de Return to the Land (“Retorno à Terra”), o empreendimento foi idealizado por Eric Orwoll, ex-músico de formação clássica que ganhou notoriedade ao divulgar vídeos sobre filosofia no YouTube, e Peter Csere, um pianista de jazz que já cumpriu prisão no Equador após ser acusado de tentativa de homicídio. O grupo comprou 64 hectares na pequena cidade de Ravenden, de apenas 400 habitantes, e pretende atrair novos moradores mediante rígida triagem: entrevistas presenciais, checagem de antecedentes criminais, questionário sobre ascendência e até fotos de familiares para comprovar a “brancura”.
“Ver alguém que não se apresenta como branco pode nos levar, entre outras coisas, a não admitir essa pessoa”, declarou Orwoll. Para ele, a iniciativa é uma forma de reagir às transformações demográficas e ao que chama de “perseguição contra brancos” nos EUA.
Desafio às leis antidiscriminação
A comunidade se coloca como uma associação privada com regras próprias, o que, segundo seus fundadores, permitiria escapar das normas federais de habitação que proíbem discriminação racial. No entanto, especialistas em direitos civis contestam a tese.
“As leis federais e estaduais, incluindo a Lei de Moradia Justa, proíbem a discriminação habitacional com base na raça, ponto final”, afirmou ReNika Moore, diretora do programa de justiça racial da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU). Já o advogado John Relman, especialista em casos do tipo, diz que “há um caso concreto de discriminação intencional”, e que os fundadores podem ser processados com base não apenas na lei de 1968, mas também em dispositivos mais antigos da Lei de Direitos Civis de 1866.
O procurador-geral do Arkansas, Tim Griffin, abriu investigação preliminar sobre possíveis violações. Até o momento, porém, não houve contestação formal na Justiça.
Histórico polêmico dos fundadores
O passado dos idealizadores também desperta atenção. Orwoll, que estudou trompa na prestigiada Eastman School of Music, foi integrante da orquestra do grupo Shen Yun, mas acabou se voltando à militância de extrema direita em canais online. Antes disso, chegou a produzir vídeos de sexo ao vivo com sua então esposa em um site adulto.
Csere, por sua vez, viveu no Equador, onde fundou uma ecovila vegana chamada Fruit Haven. Moradores o acusam de fraude e de roubar dezenas de milhares de dólares da comunidade. Ele também foi preso após esfaquear um trabalhador de mina, episódio que afirma ter sido legítima defesa.
Apoio e críticas
A Return to the Land conta com cerca de 40 moradores e centenas de apoiadores virtuais, que pagaram uma taxa de adesão de US$ 25 e compartilharam dados de ancestralidade. O grupo já arrecadou quase US$ 90 mil em doações.
Em Ravenden, vizinhos observam com desconfiança o projeto, que contrasta com a tranquilidade da cidadezinha. Para Orwoll, entretanto, o momento político seria ideal para investir na iniciativa: “Prefiro que o precedente seja estabelecido e a discussão seja travada enquanto houver um clima cultural e jurídico relativamente favorável para isso”, afirmou.
Apesar do discurso, especialistas acreditam que a comunidade dificilmente resistirá a ações judiciais. Como resume Relman: “Eles estão equivocados quando dizem que estão livres de problemas”.