Luciana Gatti :“PL da Devastação é tiro no pé do agro”

247 - A entrevista da cientista Luciana Gatti ao programa Boa Noite 247 foi marcada por um duro alerta sobre os riscos embutidos no chamado “PL da Devastação”, como ficou conhecido o Projeto de Lei 2.159/2021, aprovado na Câmara dos Deputados. A pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) classificou o momento como um “luto pelo povo brasileiro, pela fauna, pela flora e pelo Congresso da morte”, ao se referir à flexibilização das regras de licenciamento ambiental.

Com críticas contundentes à bancada ruralista, Gatti afirmou que a nova legislação pode resultar em graves retrocessos ambientais e comerciais, inclusive com impacto direto nas exportações do agronegócio. Segundo ela, “isso é um tiro no pé do agronegócio terrível […] o agro já enfrenta resistência na Europa por estar produzindo em área desmatada, e isso vai piorar muito mais”.

A cientista denunciou a lógica por trás do PL, que permite que empreendimentos considerados de pequeno ou médio porte sejam executados sem licenciamento ou apenas com autodeclarações. “Nós estamos passando por uma realidade em que, se eu acho que aquilo não vai fazer mal, eu posso fazer. Foi isso que o Congresso acabou de decidir”, afirmou, comparando a medida ao esquema de exportação de madeira ilegal revelado durante o governo Bolsonaro.

Para Gatti, as consequências da destruição ambiental já estão visíveis. “Em 2024, já calculamos as emissões de carbono da Amazônia, e foi o recorde desde 2010. Isso significa mais árvores perdidas, mais calor, mais eventos extremos”, alertou. Ela lembrou que a relação entre desmatamento e aumento de mortes por chuvas extremas e calor já é comprovada pela ciência: “as ondas de calor matam muito mais do que as enchentes”.

A cientista também criticou a visão distorcida de progresso que sustenta esse tipo de legislação. “Certa vez, um produtor de soja me disse: ‘floresta é desperdício de terra’. Isso mostra o nível de ignorância de parte do empresariado e de quem acredita que mineração ou garimpo não fazem mal”, relatou. Para ela, o atual modelo baseado na destruição é insustentável: “estamos vendo a Amazônia perder condição de continuar existindo. Isso é progresso?”

Durante o programa, Gatti defendeu alternativas de desenvolvimento que aliem economia e preservação, como o ecoturismo, que segundo ela, poderia garantir mais renda à população da Amazônia do que o avanço da soja e da pecuária. “Por que não estamos discutindo um modelo que não precisa destruir o ecossistema mais rico e que nos protege das mudanças climáticas?”, questionou.

A pesquisadora também comentou o impacto internacional do projeto em um ano crucial para o clima: “isso desmoraliza todas as ações que o governo tenta fazer para avançar na redução de emissões. E o Congresso vai lá e piora tudo”, lamentou, mencionando a proximidade da COP 30.

Por fim, Gatti manifestou esperança na mobilização da sociedade civil e em ações no Supremo Tribunal Federal. “Isso fere o direito à vida. Se o cara joga mercúrio no rio e alguém bebe essa água, está matando gente. Já temos organismos preparando ações no STF para questionar a constitucionalidade dessa lei”, declarou.

Mesmo diante de um cenário adverso, Luciana Gatti reforçou seu compromisso com a luta ambiental: “meu luto é luta. é a minha manifestação de ira”. Assista: