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Lenio Streck: “Castro descumpriu ordem do STF e tem que ser punido”

Jurista critica operação policial que resultou em mais de 100 mortes no Rio e afirma que o governador Cláudio Castro cometeu crime de responsabilidade

Lenio Streck: “Castro descumpriu ordem do STF e tem que ser punido” (Foto: Jacson Miguel Stülp/Câmara de Vereadores de Santa Cruz do Sul e Joédson Alves/Agência Brasil)

247 - O jurista Lenio Streck afirmou que o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), “descumpriu uma ordem do Supremo Tribunal Federal e deve ser punido”. A declaração foi dada durante o programa Boa Noite 247, da TV 247.

Streck se refere à megaoperação policial nos complexos da Penha e do Alemão, que resultou em mais de 100 mortes — um número superior ao total de mandados de prisão emitidos pela Justiça. O jurista classificou a ação como uma “Carandiru 4.0”, em referência ao massacre de 1992, e destacou que o episódio representa “o Estado assumindo o papel de criminoso”.

“É evidente que a decisão do Supremo foi descumprida. O governador, sua polícia e suas autoridades ignoraram a ADPF 635, que impõe limites às operações no Rio de Janeiro. Isso configura abuso de autoridade e crime de responsabilidade”, afirmou Streck.

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, a ADPF 635, proposta pelo PSB e julgada pelo STF durante a pandemia, determina regras rigorosas para operações policiais em comunidades do Rio, como o uso obrigatório de câmeras corporais e a preservação da vida dos moradores. Segundo Streck, “todos os itens foram desrespeitados”.

“O Estado usou meios inadequados, desproporcionais. O Rio de Janeiro é o único estado com uma decisão específica do STF sobre o tema, e mesmo assim o governador a desobedeceu. Isso é gravíssimo”, destacou.

O jurista acrescentou que a gravidade do caso exige investigação federal: “O Ministério Público Federal e a Polícia Federal deveriam federalizar a apuração. Se deixar no Rio, nada vai acontecer. Nenhuma autoridade estadual vai processar o governador.”

Durante o programa, o jornalista Marcelo Auler relatou que testemunhas falaram em execuções e decapitações. Streck respondeu que o episódio “testa a solidez das instituições brasileiras”.

“O Brasil está sendo testado. É preciso ver qual é o grau de 'passapanismo' que as instituições vão demonstrar. Isso transcende a uma execução de pessoas — mostra o Estado agindo como criminoso”, avaliou.

O jurista lembrou ainda que a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, determinou que o governador prestasse esclarecimentos sobre a operação e cobrasse explicações sobre o uso das câmeras corporais e criticou a postura de Cláudio Castro, que, após a operação, chegou a se vangloriar dos resultados.

“O governador expôs os policiais, expôs as comunidades, foi imprudente e negligente. Isso gera crime de responsabilidade. E o mais grave: ele quis faturar politicamente em cima da tragédia”, disse.

Para o jurista, a ação policial foi desastrosa e sem planejamento. “Foi uma operação que errou dezesseis vezes, segundo uma especialista. É óbvio que deu errado. O resultado é uma chacina que envergonha o país".

Lenio Streck foi categórico: “O governador Cláudio Castro descumpriu ordem do Supremo e deve responder por isso. Há elementos objetivos para responsabilizá-lo. Vamos ver se o Brasil terá coragem de fazê-lo ou se mais uma vez vai prevalecer o passapanismo".


Segurança pública e o papel do governo federal

Streck também abordou o desafio da segurança pública e a necessidade de o governo federal retomar o controle estratégico da política no setor, sem abrir espaço para discursos de violência:

“As pessoas têm direito à segurança, mas dentro da legalidade. O que o Cláudio Castro fez foi o contrário. O Estado não pode se transformar em assassino. É civilização ou barbárie”, afirmou.

O jurista elogiou a proposta de criação de um escritório federal no Rio para combater o financiamento do crime organizado — envolvendo a Polícia Federal, o COAF e a PRF —, mas alertou que isso não pode significar passar pano sobre a chacina.

“Uma coisa é agir daqui pra frente, outra é não investigar o massacre. O mundo todo viu o que aconteceu. O governo precisa combater o crime, sim, mas sem legitimar a barbárie.”

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