Tarcísio trabalha para o capital, não para o povo
Cada vez mais cresce a convicção de que o Governo Tarcísio está a serviço do mercado, do grande capital, e não da população de São Paulo
O governo Tarcísio de Freitas não para de surpreender, e isso não é um elogio. Sem um rumo claro, move-se ao sabor do vento, ora para agradar a opinião pública, ora pressionado por forças externas. Em sua última cartada, revelou que tornará pública a lista de empresas beneficiadas com incentivos fiscais em São Paulo, uma caixa-preta de R$ 61 bilhões, que supera os orçamentos de Saúde e Educação, somados.
Pode ser um tiro no pé. Eu, como muitos, estou curioso para saber o que vem por aí. Se é que de fato vem alguma coisa. Em sua habilidade para transformar limões em limonadas, o governo Tarcísio disse que divulgará os dados, mas não revelou quando o fará. Pode ser rápido, pode tardar uma eternidade, pode acontecer só no próximo governo. É daqueles exercícios de futurologia difíceis de prever.
Ao divulgar a iniciativa, o governo Tarcísio deu a entender que a ideia de abrir a lista foi uma iniciativa própria, embebida no nobre desejo de dar transparência aos critérios de concessão de isenções fiscais. Balela. Se assim fosse, porque só agora divulgar os nomes das empresas, passados quase três anos do início do seu mandato?
Uma outra narrativa circula na imprensa, mais crível, a de que um acordo para a divulgação da lista foi costurado nos bastidores entre o governo Tarcísio e o TCE (Tribunal de Contas do Estado), que, em 2024, aprovou as contas da gestão com ressalvas em 11 áreas, entre as quais figuram, justamente, as finanças e as renúncias de receitas.
Também tramita no âmbito federal, o Projeto de Lei 4.471/2024, que obriga todos os entes públicos a divulgarem listas de beneficiários de incentivos fiscais, com identificação, valores individuais e totais e leis autorizativas.
A análise das contas 2024 do governo pelo TCE acendeu um sinal de alerta ao não encontrar critérios claros para a concessão dos benefícios. Outro achado tão importante quanto foi o fato de que 31 das 50 maiores empresas agraciadas possuem débitos inscritos na dívida ativa do Estado. Ligou os pontos? Empresas devedoras contumazes de impostos são beneficiárias de renúncia fiscal.
A relação de Tarcísio de Freitas com o empresariado é terreno minado, fértil para escândalos, e que ainda deve “render pano pra manga”, como se diz no ditado popular. Nasceu daí um dos maiores esquemas de corrupção já registrados dentro do Governo de São Paulo, com a liberação de créditos de ICMS mediante o pagamento de propinas, que resultou em um prejuízo estimado em R$ 1 bilhão aos cofres públicos e a prisão de Sidney Oliveira, dono da rede de farmácias Ultrafarma.
Ainda assim, o governador não economiza elogios ao falar da capacidade de gestão da iniciativa privada. São frequentes seus jantares e encontros com empresários. O que se negocia entre taças e tapinhas nas costas, ninguém sabe. O que chega ao público é quase nada.
Desde o primeiro dia de seu governo, Tarcísio de Freitas tem se empenhado para fazer das privatizações uma das principais bandeiras do seu mandato. Se considerarmos o volume de empresas estatais vendidas, devemos reconhecer seu êxito. Em novembro do ano passado, ele aumentou para R$ 500 bilhões a meta de arrecadação com privatizações até o fim do seu mandato em 2026.
O problema é que quantidade não é sinônimo de qualidade. O que vemos na prática é o sucateamento de empresas públicas, antes saudáveis e lucrativas, leiloadas a preço de banana para a iniciativa privada.
O principal exemplo dessa prática é a Sabesp, que teve suas ações vendidas pelo governo a R$ 67 cada e, no mesmo dia, a ação foi revendida no mercado a R$ 87. O descompasso gerou uma perda de pelo menos R$ 4,5 bilhões aos cofres do Estado.
Com a Sabesp privatizada, a qualidade do serviço melhorou? A companhia já foi flagrada despejando esgoto sem tratamento no Rio Tietê, permitiu que bairros inteiros sofressem com o desabastecimento de água por longos períodos e, agora, reduziu a pressão da distribuição durante a noite sob a alegação de escassez hídrica.
Ao invés de aumentar o lucro de empresários, que já estão com os bolsos bastante cheios, os bilhões que Tarcísio deixa de arrecadar com benefícios fiscais poderiam ser mais bem investidos se utilizados em benefício da população, com a construção de escolas ou a modernização de hospitais, por exemplo.
Em uma fiscalização surpresa em 371 escolas públicas de São Paulo (109 delas sob responsabilidade do governo Tarcísio), o TCE flagrou absurdos como alimentos vencidos, falta de higiene no manuseio de alimentos oferecidos na merenda, pombos sobrevoando as áreas de refeição e prédios caindo aos pedaços, com problemas de rachaduras, goteiras e infiltrações.
O dinheiro que o governo deixa de arrecadar com as renúncias fiscais seria suficiente para cobrir com folga os gastos para a correção de cada um desses problemas, mas essa não parece ser a prioridade do governador.
Seguindo a lógica do próprio Tarcísio, que em plena crise das bebidas alcoólicas adulteradas com metanol afirmou que no dia que começarem a falsificar coca-cola, iria se preocupar, talvez ele não se importe com a condição precária das escolas estaduais, uma vez que já não frequenta mais a sala de aula, ou com os hospitais públicos, já que, provavelmente, utiliza a rede privada em seus atendimentos.
Se com a abertura da caixa-preta das isenções fiscais concedidas pelo Governo de São Paulo, a expectativa de Tarcísio de Freitas era receber aplausos, lamento. Transparência é o mínimo que se espera no manejo de uma política que prevê a renúncia de cifras astronômicas aos cofres do Estado, ainda mais quando esse mesmo Estado vem agonizando em áreas fundamentais.
Por atitudes assim, cada vez mais cresce a convicção de que o Governo Tarcísio está a serviço do mercado, do grande capital, e não da população de São Paulo.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.



