Ibama libera exploração na Margem Equatorial, às vésperas da COP30
'O Brasil tem argumentos fortes para brigar pela exploração de recursos na região', escreve a colunista Denise Assis
Quando o presidente Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961, com sete meses de governo, apresentou sua carta de renúncia, o popular Repórter Esso em edição extraordinária atribuiu seu ato a “forças ocultas”, frase que Jânio não usou, mas entrou para a história do Brasil.
A não explicação de Jânio, que o perseguiu vida a fora, seria oportuna para ilustrar uma questão que hoje tem peso na vida política, pois estamos a um passo da inauguração da COP30, que reunirá em Belém (PA), chefes de estado de um número considerável de países. Esses países, preocupados com a crise climática e os rumos do planeta, na certa, questionarão o empenho do governo anfitrião, para incrementar a exploração de combustíveis fósseis na Margem Equatorial, bem perto de onde se dará o evento da COP.
E o que tem Jânio a ver com a futura exploração de petróleo? Nada, mas a aprovação, pelo Ibama, da licença ambiental para a perfuração de um poço exploratório na Margem Equatorial para investigar a existência do petróleo, a menos de um mês da abertura da COP30, pode ter tudo a ver com as “forças ocultas” que levaram Jânio à renúncia.
A Petrobras recebeu, finalmente, licença do órgão ambiental federal Ibama para perfurar um poço exploratório, em águas profundas do Amapá, informou a companhia em comunicado ao mercado nesta segunda-feira (20).
A licença era muito ansiada por Lula e a presidente da Petrobras, Magda Chambriard,
A exploração provocou na sociedade científica e de modo geral, entre os interessados pelo tema ambiental, um verdadeiro Fla X Flu, com discussões acaloradas em mesas de debate. Enquanto isso, a ministra Marina Silva fazia cara de paisagem e boca de siri. Para bons entendedores, saltava aos olhos a sua posição contrária à licença, mas como parte integrante do governo, limitou-se apenas a aparecer nas fotos.
Deixe que o Ibama, o Instituto que deveria se pronunciar, está sob o guarda-chuva do Ministério do Meio Ambiente. Esse mesmo, o da Marina Silva, que evitou se meter na discussão. Porém, de silêncio em silêncio, a ministra assistiu, por exemplo, Alexandre Freitas, o ministro de Minas e Energias, levar chá de cadeira do presidente do Ibama, Rodrigo Antonio de Agostinho Mendonça, sem se abalar. Freitas teve dois pedidos de audiência com Agostinho ignorados. Na pauta, a licença da Margem Equatorial.
O prazo-limite do contrato de aluguel da sonda de perfuração da Petrobras que está estacionada a Margem Equatorial vencia nesta terça-feira (21/10). Ou seja, a empresa precisava iniciar a perfuração já para evitar a retirada do equipamento e, consequentemente, não correr o risco de iniciar um novo processo de licenciamento”.
Há poucos dias a presidente da Petrobras lançou um alerta: “essa sonda pode ser retirada da locação. E, se isso ocorrer e for substituída por outra sonda no futuro, o processo de licenciamento começa tudo de novo”.
Não vai precisar. Está claro que as tais “forças ocultas” agiram segurando a liberação da licença exatamente para esse período, em que as atenções dos ambientalistas e autoridades envolvidas no tema da crise climática começam a se voltar para o Brasil. Saindo agora, evidencia o papel “incoerente” do país – segundo a interpretação dos que torcem para o Fla, e não para o Flu. Enquanto sedia o evento com vistas a soluções para o meio ambiente, busca a exploração do combustível condenado à extinção, por ser um dos maiores poluidores do planeta.
A apreensão da Petrobras tinha razões concretas e justificáveis: o custo estimado pela empresa para furar esse primeiro poço é de R$ 842 milhões. Somente com o aluguel da sonda de perfuração foram gastos R$ 543 milhões (R$ 4 milhões por dia).
E o Brasil tinha e tem argumentos fortes para brigar pela exploração: há na região estados com índices de IDH baixíssimos, dependendo dos recursos advindos do petróleo da Margem Equatorial para se desenvolver. Existe um prazo de transição para a substituição dessa fonte de energia, o petróleo, no mundo.
Talvez pelas artimanhas das tais “forças ocultas”, a decisão tenha ficado para o fim do segundo tempo desse jogo de interesses. Licenciar agora, ao mesmo tempo que representa uma vitória para o governo, colocará o presidente Lula no foco dos críticos ambientais, em plena abertura da Cop-30. Será uma vitória de Pirro, imposta pelo Ibama, ao governo. São eficientes essas “forças ocultas”. São ou não são?
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.



