Depois do “match” Lula-Trump
Quanto às relações de Lula com Trump, por ora há mais incerteza e desconfiança do que otimismo
Deu “match” mesmo ou Donald Trump está armando uma trampa para Lula? É muito cedo para falar das consequências, para as relações bilaterais, do esbarrão que tiveram nos bastidores da ONU e da conversa marcada para a semana que vem. É mais cedo ainda para falar em vitória brasileira. Embora o Brasil não tenha cedido às pressões ilegais e injustas, Trump continua sendo Trump, Lula continua sendo Lula, e entre eles corre um oceano.
Um efeito, entretanto, já pode ser sentido, e é na nossa política doméstica: Quando afaga Lula e aceita conversar e negociar com ele, que foi quem propôs a conversa, Trump dá sinal de que está revendo seu jogo. Pode ter avaliado que já fez o que podia por Bolsonaro e nada ganhará esticando a briga em favor dele, gerando inflação para seu povo, encarecendo o café e a carne, principalmente.
Uma inflexão de Trump será desesperadora para Bolsonaro e os seus, que terão perdido a última arma. De domingo para cá eles vêm colecionando derrotas. As manifestações do campo progressista, contra a anistia e a PEC da impunidade, foram grandes, eloquentes e nacionais, tendo ocorrido em todas nas capitais e estados.
Ontem as derrotas foram sobretudo de Eduardo Bolsonaro. Primeiro, ele viu Trump dizer que gostou de Lula e que rolou uma boa química entre eles. Depois o presidente da Câmara, Hugo Motta, rejeitou sua pretensão de tornar-se líder da minoria, pelo PL, para evitar a cassação por excesso de faltas. O Conselho de Ética saiu da letargia e abriu o processo de sua cassação, pedido pelo líder do PT, Lindbergh Farias. No STF, o ministro Alexandre de Morais enviou para Hugo Motta o aviso de que a PGR apresentou denúncia contra Eduardo por sua atuação antinacional nos EUA. Tudo isso sugere que o Centrão, assim como Trump, pode estar começando a se afastar do bolsonarismo, jogando as cargas mais pesadas ao mar.
Hoje pela manhã começou o enterro da PEC da bandidagem pelo Senado, com a rejeição, por unanimidade, do parecer do senador Alessandro Vieira na CCJ. O plenário fará o mesmo. Esta não é uma pauta só do bolsonarismo, mas o enterro dela também mostra uma inflexão no Centrão, pelo menos no Senado.
Falta ver o que a Câmara fará com o projeto de anistia, que teve a urgência aprovada, mas enfrenta agora a falta de consenso sobre seu conteúdo. Por tudo que tem dito o relator, Paulinho da Força, o mais provável é a aprovação de uma redução das penas para os crimes impostos aos golpistas, o que pode atenuar as condenações, mas sem produzir a impunidade buscada para Bolsonaro e os demais.
Se depois das condenações vier agora o isolamento político dos bolsonaristas, a disputa eleitoral do ano que vem também mudará de fisionomia. Mas isso veremos se for confirmada a premissa sobre o rumo do Centrão.
Quanto às relações de Lula com Trump, por ora há mais incerteza e desconfiança do que otimismo. A diplomacia receia ainda uma desfeita, como as que foram feitas com Zelenski e Ramaphosa.
“Ele gosta de mim e eu gosto dele”, ousou Trump dizer sobre Lula, que até agora não lhe fez coro nas redes sociais. Sendo Trump, ele falou da boa química surgida entre eles mas não deixou de fustigar o Brasil, na sequencia de seu discurso, afirmando que o país vai mal e não ficará bem enquanto não estiver trabalhando com os EUA, o que deve significar uma concordância ampla em muitos assuntos.
E isso, não se pode esperar do Brasil sob Lula.
Se a disposição para negociar for para valer, veremos sobre a mesa as taxações (embora sejam ilegais, como ressalva o ministro Mauro Vieira), e também as terras raras e minerais estratégicos, a regulação das big techs e condições favoráveis para a instalação de data centers de empresas norte-americanas nestes país farto em energia que é o Brasil.
Não nos iludamos. O império nunca perde.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.