Defender o Congresso, hoje, não é defender a democracia
Hoje, o Congresso está muito longe de encarnar a democracia, papel que na prática vem sendo exercido pelo STF
Deve-se ter cuidado ao criticar o Congresso Nacional, em tese a mais importante instituição representativa da vontade popular. Todavia, os parlamentares da atual legislatura estimulam o bombardeio verbal contra a “casa do povo”, justamente por tramarem à luz do dia e sem sombra de vergonha pela destruição completa de tudo que lembre democracia. O povo não quer livrar criminosos da cadeia, o povo não quer anistiar golpistas, o povo não quer Jair Bolsonaro solto nem quer sustentar Eduardo Bananinha a conspirar contra o Brasil nos Estados Unidos. Quem quer isso são deputados, senadores e governadores em busca de motes eleitorais e impunidade. O povo, em contrapartida, quer que esses políticos se debrucem sobre temas que visem a avanços sociais.
Imprensa e até nomes do governo manifestam-se cheios de dedos e medos sobre a trama golpista parlamentar denominada “anistia” – não se pode atacar o Poder Legislativo, símbolo da democracia. Irritante hipocrisia. Deputados e senadores, direita, extrema-direita e Centrão urdem sem disfarces o maior arranjo golpista de que se tem notícia por estas plagas.
Nas democracias, decisões judiciais podem ser revertidas por meios judiciais e apenas por estes, ou estar-se-á pespegando no país uma traição institucional. Por óbvio, o Supremo Tribunal Federal derrubará a tal “anistia ampla, geral e irrestrita”, caso esta vingue no Parlamento, mas o fato de se dar curso a tamanha aberração é por si só assustador.
Hoje, o Congresso está muito longe de encarnar a democracia, papel que na prática vem sendo exercido pelo STF. O rito judicial que culminará na condenação de Jair Bolsonaro e seus comparsas – todos covardes, cujas defesas tão somente tentam tirar-lhes o corpo fora, nunca negar a conspirata – dá-se rigorosamente conforme o devido processo legal. Claro, com medidas excepcionais necessárias sempre que os Bolsonaros esticam a corda, provocando cautelares para vitimizar papai.
Estapafúrdia é a relação que se cogita entre a pretensa anistia de agora e aquela de 1979, ambas malfadadas, aquela por ter beneficiado tanto perseguidos políticos quanto perseguidores, tanto quem lutou contra o terror de Estado quanto quem o praticou. Foi, de todo modo, um instrumento que tornou possível a transição da ditadura para a democracia. Nada a ver com o que se tenta hoje, quando altas personalidades da República são julgadas conforme a Constituição por atentado contra o Estado Democrático de Direito e parlamentares golpistas distorcem a realidade para salvá-los.
Em tal cenário, destaca-se o canhestro presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, já descrito neste espaço, a partir de bases científicas, como “conciliador cativo”. Os acometidos dessa síndrome são moderados que, para sobreviverem politicamente, se submetem à lógica autoritária de seus aliados. Uma marionete, cujo perfil receberá da História registro implacável.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.