11 de setembro: um marco na história do Brasil
A data marca a vitória histórica da democracia sobre o golpismo e pode se tornar feriado nacional de memória e resistência
Onze de setembro, uma data que deverá ser feriado nacional para rememorar e enaltecer a justiça de transição reversa, uma vitória da democracia sobre o golpismo.
Duas efemérides internacionais marcam negativamente esse dia: o golpe no Chile e os atentados às torres gêmeas nos EUA.
O ocorrido no Chile em 1973 foi um golpe militar que derrubou o regime democrático constitucional do país e de seu corajoso presidente, o médico socialista Salvador Allende, com apoio militar e financeiro do governo estadunidense. Quanto às explosões das torres, ainda há muitas e controversas versões.
Onze de setembro deveria passar a ser feriado nacional, como o dia em que o Estado de direito venceu, dentro do devido processo legal, e reafirmou a democracia, que foi duramente conquistada e continua resistindo aos sabotadores de fora e de dentro do Brasil.
É um dia histórico para uma nação que vivenciou, entre tentativas e golpes concretizados, doze movimentos excepcionais à legalidade democrática.
Quantos companheiros de guerrilha, após uma vida inteira de luta pelo país e perseguição militar, foram vítimas do coronavírus, por plano inspirado no malthusianismo e darwinismo social do governo de 2018-2022? Quantos avôs e avós partiram antes; quantos pais e mães trabalhadores foram ceifados da vida de seus filhos; quantos jovens com sede de saber e conquistar seus espaços no mundo foram sugados do direito primígeno da experiência humana, que é o de viver?
Hoje, ainda estamos aqui. Militantes históricos de 64 e, por mais que pese a idade, seguimos com a mesma pulsão, o mesmo desejo de viver e construir uma muralha estável para a consolidação de uma democracia popular. Seguimos lutando e inspirando as novas gerações na defesa da democracia!
Esse julgamento histórico pode ser o início da redenção do passado inglório dos golpes e da ditadura militar de 21 anos, que assassinou mais de vinte mil brasileiros, e das mais de 700 mil vidas ceifadas pela negligência dolosa do governo Bolsonaro durante a pandemia da covid-19.
Não é um dia triste para o Brasil. Dia triste foi o da intentona, um horror violento e grotesco televisionado, enquanto passávamos as 24 horas do dia 8 de janeiro com o temor de um novo golpe de Estado e outro regime de exceção.
O dia 11 de setembro tem todo o potencial para se tornar um dia de júbilo para o Estado democrático de direito. A alegria da vitória da democracia. Um dia para, a partir de agora, nos reunirmos com exultação no coração e a certeza na razão por termos vencido a besta-fera das trevas fascistas.
Foi mais do que um passo na consolidação da democracia, foi um marco histórico!
Pela primeira vez militares de alta patente foram julgados e condenados, dentro de um amplo processo legal, pelos crimes de terrorismo e atentados à legalidade democrática.
Rompeu-se com a histórica impunidade de golpistas e de militares.
Eventuais recursos que venham a ser interpostos no STF, nenhum deles terá força para reverter as condenações. Por isso, já se especula onde a besta-fera irá cumprir a sentença.
Bolsonaro não deveria ficar em nenhuma prisão do Exército, nem mesmo da Polícia Federal, porque ele desqualificou essas duas instituições com a interferência que fazia e delas se valeu, cooptando, inclusive, maus militares para fazer parte de seu fracassado governo e do plano de golpe.
Bolsonaro tem mais de 70 anos e alega ter várias comorbidades. Estou aqui lembrando o tempo em que fiquei prisioneiro político da ditadura e fui levado em condições precárias para o Hospital Central do Exército (HCE), no Rio de Janeiro.
E por lá fiquei aproximadamente três meses.
Na época, havia dois xadrezes coletivos grandes: em um ficavam os presos militares ou parentes de militares com enfermidades, inclusive psíquicas.
No outro, em frente, ficavam os combatentes da ditadura. E lá convivi com vários companheiros que, inclusive, foram ganhando a liberdade ou sendo transferidos para outros presídios, enquanto eu fui ficando. Cheguei até a armar um pequeno plano de fuga, como fazia sempre em qualquer lugar em que estivesse preso, porque considero, não só direito, mas dever do prisioneiro revolucionário tentar a fuga.
Seria até um tanto quanto irônico que Bolsonaro fosse para o Hospital Central do Exército, o qual, durante a ditadura, virou um centro de cumplicidade à tortura.
Nesse xadrez havia algumas caminhas de ferro, um colchão muito ralo, e não havia vaso sanitário. Você se agachava e fazia as necessidades em um buraco, o “boi” — um buraco no chão usado em prisões para satisfazer as necessidades fisiológicas.
O cárcere deve ser exemplar pelo simbolismo que irá, oxalá, fechar o ciclo de golpismo no Brasil, com o dito: Golpe nunca mais, democracia sempre mais!
Quanto ao delírio do bolsonarismo pela anistia, não há agasalho constitucional nem respaldo popular. A maioria da população, 54%, já se manifestou contrária.
O Estado democrático de direito não pode anistiar os que atentaram contra a sua continuidade. Seria como cometer suicídio institucional, passando por cima das cláusulas pétreas.
A vigilância da sociedade pela democracia não pode afrouxar. Pelo contrário: é a quadra ideal para conscientizar incautos sobre os valores e o modo de ser de uma democracia. É, ainda, momento para as Comissões de Anistia e a Comissão sobre os Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), durante a ditadura, acelerarem, com qualidade, os seus trabalhos.
11 de setembro: um feriado nacional de memória e afirmação da democracia
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.