Mães relatam desespero e perda após operação mais letal do Rio
Mães do Alemão e da Penha falam sobre a dor de reconhecer os corpos dos filhos
247 - Em entrevistas ao jornal O Globo, mães falam sobre o drama que vivem para reconhecer os corpos de seus filhos, vítimas da megaoperação policial que deixou 121 mortos, a mais letal da história do estado. O IML do Rio de Janeiro, desde a última quarta-feira (30), se tornou palco de relatos de dor, luto e culpa.
Para muitas dessas mulheres, o sentimento é de impotência diante de um sistema que oferece poucas oportunidades e ainda seduz jovens para o tráfico e a violência. Entre os relatos, a trajetória de meninos e jovens que estudaram, trabalharam e sonharam com um futuro melhor contrasta com a realidade de comunidades marcadas pelo abandono do Estado e pelo poder paralelo do crime.
“Oito anos sem ver meu filho e agora só o reconheço numa foto”, disse a mãe de Thiago Ribeiro Pareto Barbosa, de 28 anos.
“Desde os 20, ele escolheu essa vida. Disse que não queria que ninguém da família soubesse dessa vida no crime, para não respingar na gente”, disse. Thiago havia concluído o ensino médio, feito curso técnico e trabalhado como jovem aprendiz antes de se envolver com o tráfico. “Eu dei educação e uma casa onde nunca faltou nada. Mas ele quis ir por outro rumo. Tenho certeza de que foi influência dos amigos e dessa ilusão de vida fácil, de dinheiro e poder, que no fim não passam de engano”, lamentou.
O reconhecimento da morte veio através de uma foto enviada por um conhecido: “Oito anos sem ver meu filho — e agora só o reconheço numa foto dele morto. Uma mãe nunca deixa de esperar. Mas, mesmo assim, nunca para de ser mãe”, disse.
A mãe de criação de Kauan de Souza, de 18 anos, narrou o desespero de buscar o filho durante a operação na Penha. “Quando liberaram, fui para a mata atrás dele, gritando: ‘Kauan! Pode sair da mata, mamãe tá aqui!’. Toda vez que via um corpo achava que podia ser ele”, relatou.
Criado desde pequeno por ela, Kauan trabalhava com o pai num ferro-velho e sonhava em ser bombeiro. “Ele começou a se afastar de casa quando os meninos da comunidade descobriram que ele sabia dirigir. Chamavam para fazer os ‘corres’. Ele achava bonito estar no meio deles, chegar nos bailes com a roupa mais bonita e a garota mais bonita do lado”, relatou.
A mãe acredita que, se o filho tivesse sido preso, poderia ter uma segunda chance: “Meu filho podia estar pagando pelos erros dele, mas devia estar vivo.”
A microempreendedora Taua Brito, mãe de Wellington Brito, de 20 anos, revive o momento em que tentou impedir a morte do filho na Mata da Vacaria, na Penha. “Ele me mandou mensagem pedindo ajuda: ‘Mãe, vem me buscar’. Saí de casa com os documentos dele e gritei: ‘Eu sou mãe! Estou aqui para pegar meu filho! Se tiver que levar preso, leva, mas não mata!’”, recordou.
Quando conseguiu subir o morro, Wellington já estava morto, com um tiro na cabeça. “Sou uma mãe negra, solteira, que vende bolos e doces para criar meus filhos. Achei que, vendo minha luta, ele não fosse seguir esse caminho. Mas, na favela, não temos muitas oportunidades”, disse.


