República Democrática do Congo pede que o mundo reconheça genocídio, após décadas de guerra por minerais críticos
O presidente Félix Tshisekedi afirmou que as mortes de milhares de civis na região leste do país atendem à definição legal de genocídio
RFI - A República Democrática do Congo celebrou neste fim de semana um dia nacional de lembrança para o que chama de “Genocost” (trad.: geno-custo)--termo usado para descrever mortes em massa associadas à exploração dos recursos naturais do país.
O presidente Félix Tshisekedi aproveitou a ocasião para pedir ao parlamento que aprove uma resolução reconhecendo a violência no leste do Congo como genocídio.
"Apelo solenemente às duas casas do Parlamento que examinem, o mais rápido possível, a adoção de uma resolução oficial proclamando o reconhecimento do genocídio cometido em nosso território", declarou Tshisekedi no sábado.
Ele afirmou que as mortes de milhares de civis na região leste do país atendem à definição legal de genocídio, conforme a Convenção da ONU de 1948. O presidente também prometeu levar a campanha por reconhecimento a fóruns internacionais.
A comemoração anual do Genocost ocorre em todo 2 de agosto. Ela foi realizada pela primeira vez há três anos. Neste ano, um novo memorial foi inaugurado nas proximidades do Museu Nacional em Kinshasa.
Conflito persistente - O leste do Congo, rico em minerais e com fronteiras com Ruanda, enfrenta conflitos recorrentes desde o genocídio ruandês em 1994. A violência voltou a se intensificar desde o início de 2025.
O termo “Genocost” foi usado pela primeira vez em Londres, em 2013, por um membro da Congolese Action Youth Platform (CAYP). Ele surgiu após a publicação do Relatório de Mapeamento da ONU, que documentou crimes em larga escala no leste do Congo desde 1996. O relatório apontou que diversos países vizinhos – incluindo Ruanda, Uganda e Burundi – tinham responsabilidade nos crimes.
Para a CAYP França, a criação de um dia nacional de memória é um avanço importante. Gloria Menayame, jurista da ONG, disse à RFI que é uma “vitória”, mas que ainda há muito a ser feito.
“Mas parece algo inacabado”, afirmou.
“A adoção da campanha do Genocost é algo que acolhemos com satisfação. O que não queríamos era essa apropriação parcial que só utiliza o que convém às autoridades. Fala-se muito em responsabilidade internacional ou na criação de um tribunal internacional. Mas se esquecem de criar mecanismos para julgar os crimes em nível nacional. Acreditamos que nosso governo tem meios, mas falta vontade.”
Um longo caminho até o reconhecimento - A ideia do Genocost ganhou força a partir de 2013, à medida que aumentavam os apelos por reparações. Grupos da sociedade civil apontaram para uma longa história de violência ligada à exploração de recursos, desde os tempos coloniais.
Apoiadores da campanha rebatizaram uma praça em Kinshasa como Praça Genocost e passaram a organizar eventos no local todo 2 de agosto – data que marca o início da Segunda Guerra do Congo, em 1998.
No entanto, o governo só passou a adotar oficialmente o termo no final de 2022, após o retorno do grupo rebelde M23 e o agravamento das tensões com Ruanda.
Um dos principais objetivos da campanha é a criação de um tribunal penal internacional para a RDC.
Tshisekedi também afirmou que levará o tema à Assembleia Geral das Nações Unidas em setembro.
Questões jurídicas e internas - Alguns especialistas jurídicos consideram o conceito de Genocost ainda controverso. Ithiel Batumike, pesquisador do think tank congolês Ebuteli, disse à RFI que o termo se baseia em uma indignação real diante de décadas de violência, mas precisa ser melhor definido do ponto de vista jurídico.
“Todos os congoleses acreditam que é hora de pôr fim a essa espiral de violência”, afirmou.
“As grandes perguntas que todos se fazem são: ‘Até quando?’ e ‘Por que a comunidade internacional age como se não enxergasse tudo o que está acontecendo no Congo, enquanto demonstra atenção contínua a outras crises nas quais, inclusive, interveio para impedir massacres?’”
Outra questão sensível é o papel de líderes e oficiais militares congoleses no próprio conflito.
Gloria Menayame afirmou que alguns membros do governo congolês foram citados em relatórios da ONU como envolvidos em crimes cometidos no país.
Entre eles, estão vários generais atuantes em zonas de conflito. Ela defende que suas ações também precisam ser investigadas e não podem ser ignoradas.
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