Imprensa chinesa reage ao histórico título de Calderano: "perdemos, mas devemos agradecer"
Jornalistas destacam "maior zebra da história" e o potencial que o resultado tem para criar nova geração de competidores brasileiros. Confira repercussões
Por Guilherme Paladino, de Luoyang (China), para o 247 - Assim como Hugo Calderano é craque no tênis de mesa, praticamente todos no Brasil já estão craques em ler notícias relacionadas ao histórico título do carioca na Copa do Mundo da modalidade neste domingo (21). Além disso, também já ganhou suficiente destaque o fato de a conquista ter ocorrido em Macau, na China – justamente o país do ping pong.
No entanto, ainda é pertinente a curiosidade: "como é que os chineses estão repercutindo tal impactante derrota?". Afinal, um dia já se passou e as mídias do gigante asiático certamente falaram sobre o ocorrido, mas a barreira do idioma e a falta de conhecimento sobre portais de notícias chineses impedem que tal fluxo de informações chegue aos leitores brasileiros.
Pensando nisso, o Brasil247, por meio de seu correspondente na China, entrou em contato com uma jornalista local e solicitou recomendações de matérias que tenham sido publicadas "em chinês e para o público chinês", de diferentes veículos, sobre a conquista de Calderano. Confira abaixo o resultado.
"Perdemos, mas devemos agradecer"
Em uma das manchetes mais interessantes sobre a epopeia de domingo, o Jiefang Daily (解放日报), de Xangai, afirma que "Embora o tênis de mesa chinês tenha perdido o título, deve agradecer a Calderano — foi ele quem fez muitas crianças brasileiras pegarem raquetes."
"No Brasil, o país do futebol, o sonho da maioria das crianças é se tornar um astro dos gramados como Pelé ou Ronaldo. No entanto, um menino escolheu um caminho completamente diferente: Hugo Calderano. Ele abriu mão do popular futebol e mergulhou no mundo relativamente de nicho do tênis de mesa no Brasil — e ainda escolheu a categoria de maior concorrência: o individual masculino. Hoje, com esforço e persistência, ele escreveu uma trajetória surpreendente", diz o primeiro parágrafo do texto.
A reportagem traz um resumo da trajetória do agora campeão mundial, destacando os constantes encontros com a China ao longo de sua carreira e também as dificuldades para brasileiros se desenvolverem neste esporte tão nichado nas Américas.
"Hugo Calderano nasceu em uma família comum no Brasil. Aos 8 anos, entrou em contato com o tênis de mesa por acaso e, desde então, se apaixonou profundamente pela modalidade. Naquela época, o tênis de mesa no Brasil estava longe de ter a popularidade do futebol — os recursos de treinamento eram escassos, e bons treinadores, raros —, mas essas dificuldades não abalaram o amor de Hugo pelo esporte. Ele treinava com afinco todos os dias, passando horas seguidas em mesas simples, aprimorando incansavelmente sua técnica", relata outro trecho.

"Fazendo história nas Américas"
A raridade dos bons exemplos da modalidade no continente americano também foi explorada pelo Benliu News (奔流新闻), de Lanzhou, Província de Gansu (Noroeste da China). "O famoso jogador brasileiro Hugo Calderano venceu nas quartas de final, semifinal e final os atuais número 3 do mundo, Tomokazu Harimoto; número 2, Wang Chuqin; e número 1, Lin Shidong, conquistando o primeiro título mundial de sua carreira e fazendo história para o tênis de mesa das Américas", afirmou o portal.
No texto em questão, também foram destacadas as declarações tanto de Calderano como de Shidong antes da final, com ambos demonstrando empolgação pela chance de se enfrentarem.
Um comentário de um internauta chinês na notícia também reconheceu o mérito do brasileiro: "Hugo derrotou três campeões consecutivos para conquistar o título — vitória mais que merecida; uma nova era do tênis de mesa nas Américas se inicia! O jovem Lin Shidong tem um futuro promissor — que venha o próximo grande duelo!"
"Calderano superou o vale da morte"
Saindo dos veículos de notícias gerais, o registro especializado do Yùndòng Bāng (运动帮 - Clube do Esporte, em tradução livre) avaliou que "o sorteio de Hugo Calderano nesta edição foi, sem exagero, uma entrada no vale da morte".
"Para ser campeão, conforme as previsões, ele teria de vencer os três primeiros colocados do ranking mundial — algo quase impossível. Mas ele fez exatamente isso. No caminho, enfrentou os três melhores do mundo e venceu todos! Na fase de grupos e nas oitavas de final, ele eliminou os japoneses Yukiya Uda e Daitō Shinozuka, e nas três partidas seguintes derrotou os três principais do ranking: Tomokazu Harimoto (4 a 1), Wang Chuqin (4 a 3) e Lin Shidong (4 a 1). Um desempenho assim não pode ser atribuído apenas à sorte — especialmente as últimas três partidas, que foram verdadeiros clássicos", diz o portal online.
O texto segue seu relato enfatizando que o brasileiro "escreveu uma página brilhante da história" e "se tornou celebridade no Brasil da noite para o dia."
"Pode parecer mágico ou inacreditável, mas quando Hugo se jogou no chão após vencer Lin Shidong, emocionado, ele mostrou ao povo brasileiro e ao mundo todo: isso realmente aconteceu. Esta vitória é o ponto alto da carreira de Hugo até aqui, e também um enorme estímulo para outros jogadores estrangeiros, encorajando mais atletas da América do Sul, África e Europa a se dedicarem ao tênis de mesa. Isso tem um grande significado para a globalização do esporte. E, claro, serve como alerta importante para o time masculino da China: será que o ouro olímpico masculino em Los Angeles está mesmo garantido? E quem poderá conquistá-lo?"
O 'Clube do Esporte' também ressaltou o fato de que Calderano foi o primeiro não-chinês a vencer a modalidade individual de Tênis de Mesa desde o alemão Dimitrij Ovtcharov, em 2017. "Mas há algo ainda mais significativo: é a primeira vez que um jogador de fora da Ásia e da Europa se consagra campeão da Copa do Mundo de simples masculino. O título de Hugo Calderano dá à América do Sul seu primeiro campeão mundial de tênis de mesa, preenchendo uma lacuna histórica e alterando a configuração intercontinental do esporte. O presidente do Brasil também o parabenizou", acrescenta o texto.
"A maior zebra da Copa do Mundo"
De forma bem-humorada, o Wenhui Daily (文匯), também de Xangai, inicia seu texto dizendo que "um brasileiro conquistou o título da Copa do Mundo, mas não foi no futebol, foi no tênis de mesa". A matéria em questão também destaca que "Hugo foi a maior “zebra” da história da Copa do Mundo" devido ao seu chaveamento, considerado extremamente difícil.
O resultado do torneio acendeu um alerta aos chineses para uma possível quebra de hegemonia, com o veículo alertando que "a derrota da seleção chinesa masculina não pode ser atribuída apenas a fatores mentais ou físicos. É preciso reconhecer que os atletas de ponta de outras federações estão evoluindo rapidamente".

Assim como se vê na mídia brasileira, o Wenhui Daily também 'cornetou' declarações do técnico da seleção nacional, que afirmou que a equipe masculina principal de tênis de mesa da China é muito forte. "Tanto o processo quanto o resultado parecem contrariar essa declaração. Desta vez, a forte equipe masculina claramente não cumpriu sua missão", ironizou o jornal.
"Estilo de jogo desafiador"
Por fim, abrindo uma exceção para uma reportagem em inglês, o Global Times - um dos principais veículos de notícias da China voltados ao público estrangeiro - optou por dar um tom mais sóbrio à cobertura da derrota chinesa.
"Na final do individual masculino, Lin Shidong caiu diante do brasileiro Hugo Calderano por 4 sets a 1, que entregou uma forte performance contra uma das jovens promessas da China", resumiu o portal.
A reportagem do Global Times também entrevistou o comentarista esportivo Wang Dazhao, de Beijing, que analisou que "Hugo é sempre um oponente duro para os jogadores chineses. Seu estilo é não convencional [unorthodox] e difícil de ler".
Apesar da derrota, o orgulho do ping pong chinês ainda segue vivo na análise de Wang, que prefere ver uma oportunidade de amadurecimento - e não de caos - após o revés contra o carioca: "todo país quer aquele momento de superação contra a China, mas mesmo no nosso momento mais fraco, não há ninguém que possa desafiar a China de forma abrangente. Ter competidores que nos pressionem é o que mantém o esporte vivo. Sem essa pressão, não há crescimento."
Todos os textos em chinês foram traduzidos com auxílio do ChatGPT e do DeepSeek, utilizando prompts que pediam "a tradução mais fiel possível", sem adaptações de estilo. Além disso, alguns dos trechos selecionados também foram conferidos com uma jornalista chinesa fluente em português.
❗ Se você tem algum posicionamento a acrescentar nesta matéria ou alguma correção a fazer, entre em contato com [email protected].
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: