“O discurso do 'roubaram dos velhinhos' funciona", diz Reynaldo Aragon
Escândalo do INSS é transformado em pânico moral para desestabilizar o governo Lula e alimentar a extrema direita
247 - O que têm em comum o escândalo dos Correios em 2005, o mensalão, a Lava Jato e agora a crise do INSS? Para o doutor em comunicação Reynaldo Aragon, convidado do Boa Noite 247, a resposta é clara: tratam-se de capítulos diferentes de uma mesma guerra. Segundo ele, o Brasil vive há 20 anos sob um cerco comunicacional e judicial que busca desestabilizar governos populares, usando como arma principal o pânico moral em torno da corrupção.
“A história se repete. A operação atual em torno do INSS não é um raio em céu azul. Ela segue o roteiro clássico: vazamentos seletivos, escândalo midiático, pressão por CPI e um alvo político muito bem definido”, afirmou Aragon, alertando para a reedição do que classificou como "teatro político de guerra híbrida", agora com novos recursos digitais e algoritmos de desinformação.
A lógica do escândalo como arma política - A atual crise no INSS envolve suspeitas de fraudes bilionárias em benefícios previdenciários e culminou com a demissão do ministro Carlos Lupi. No entanto, como lembrou a audiência do programa, as irregularidades começaram ainda no governo Bolsonaro, período em que milhares de militares foram nomeados para cargos no instituto. “Setenta e nove mil militares receberam auxílio emergencial indevidamente. Isso nunca virou capa de revista”, observou Aragon.
Na avaliação do especialista, a indignação seletiva é peça central da estratégia. “O discurso do 'roubaram dos velhinhos' funciona porque mobiliza moralmente a sociedade. É o mesmo recurso usado em 2005 e depois com a Lava Jato.” Para ele, esse tipo de retórica cria um ambiente de descrença generalizada que pavimenta o caminho para alternativas autoritárias — ainda que travestidas de moralismo.
Ciro Gomes e o fator desestabilizador - Um dos trechos mais contundentes da conversa abordou o papel do ex-ministro e ex-presidenciável Ciro Gomes, que voltou ao noticiário com a queda de Lupi, seu aliado histórico. Aragon vê Ciro como um “agente de perturbação” dentro do campo progressista: “Ele não tem força para vencer Lula ou Tarcísio em 2026, mas pode atrapalhar, dividir e enfraquecer o campo democrático. Isso já vimos em 2022.”
A análise encontra eco no artigo publicado por Aragon na semana passada, onde compara a atual operação midiática em torno do INSS à construção do mensalão e à forma como Ciro atuou como porta-voz informal da oposição no campo progressista, especialmente entre 2018 e 2022.
A urgência da comunicação democrática - Um dos pontos centrais da entrevista foi o diagnóstico de falhas na comunicação do governo. Aragon defendeu que, diante da sofisticação das táticas da extrema direita, o campo progressista não pode depender apenas do Planalto. “É preciso construir um ecossistema próprio, investir em rádios comunitárias, mídias alternativas e campanhas de inoculação informacional.”
O conceito de prebunking — preparar cognitivamente a sociedade contra a desinformação — foi destacado como estratégia essencial. “O governo deveria ter explicado as mudanças no Pix como medida contra o crime organizado, por exemplo. O silêncio custou aprovação popular”, afirmou, em referência à crise recente gerada por uma mudança técnica no sistema de pagamentos.
2026: a eleição mais importante da história - Ao longo da conversa, ficou evidente que a disputa de 2026 ultrapassa a figura de Lula. “Não se trata apenas de reeleger um presidente, mas de impedir que o fascismo se consolide como hegemonia simbólica e institucional”, disse Aragon. Ele aponta que a extrema direita não precisa vencer o Planalto para governar: basta controlar o Congresso e paralisar o Executivo.
A CPI do INSS, já aprovada com celeridade suspeita, é vista por ele como um “ensaio para essa paralisia”. Ainda que as investigações mostrem que os contratos suspeitos remontam à era Bolsonaro, o ecossistema de desinformação está em marcha para criar uma nova narrativa de escândalo petista.
Final aberto: entre vacina e remédio tardio - A metáfora da “vacina comunicacional”, elogiada pela audiência, resume o diagnóstico. “Se a gente prepara a população com informação de qualidade e antecedência, o impacto das crises fabricadas é menor”, afirmou Aragon. Mas, como também alertou, pode ser tarde demais para vacinar. O momento agora exige tratamento intensivo — e mobilização popular.
A crise do INSS, portanto, não é apenas sobre previdência. É sobre memória, narrativa, projeto de país. E sobre a urgência de disputar os significados do que está em jogo.
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