"Este não é um governo neoliberal, mas um governo híbrido", diz Breno Altman
Breno Altman aponta contradições na política econômica do governo Lula e destaca a importância de ampliar medidas populares para evitar perda de apoio
247 - Em uma análise detalhada no canal Opera Mundi, o jornalista Breno Altman contestou as críticas de setores da esquerda que classificam o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva como neoliberal. Segundo Altman, essa avaliação ignora a complexidade do governo e as contradições que o atravessam.
"Com sinceridade, é pura e perigosa fantasia acreditar que o conflito crucial no Brasil de hoje seria entre as classes trabalhadoras de um lado e a burguesia de outro, com o governo Lula jogando no campo da burguesia e constituindo um governo neoliberal a serviço dela", afirmou Altman. Ele argumentou que a principal contradição política no país atualmente é entre "as forças democráticas e populares representadas pelo governo Lula" e "a extrema direita vinculada ao agronegócio, ao rentismo e aos interesses imperialistas". Dessa forma, caracterizar o governo como um fator reacionário, segundo ele, seria um erro estratégico.
Política econômica e hibridismo
Altman reconheceu que há elementos na política econômica do governo que podem ser classificados como neoliberais, especialmente o novo arcabouço fiscal e a manutenção de altas taxas de juros. "Não tenho dúvidas em afirmar que a política fiscal e a política monetária do governo Lula podem ser teoricamente classificadas como neoliberais", afirmou. No entanto, ele destacou que a administração federal adota simultaneamente medidas que ampliam investimentos públicos e fortalecem políticas sociais, o que não se encaixaria em uma cartilha estritamente neoliberal.
"O governo alterou políticas dentro desse modelo [neoliberal], mas não rompeu com ele. Mesmo assim, conseguiu utilizar o orçamento para impulsionar a demanda, com o crescimento do salário mínimo, a retomada de políticas sociais e o investimento público", analisou. Como exemplo, Altman citou o aumento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), cujo número de beneficiários subiu de 5,15 milhões para 6,29 milhões entre janeiro de 2023 e dezembro de 2024, além da elevação da renda média dos trabalhadores acima da inflação.
Para ele, esse tipo de contradição revela a natureza híbrida do governo. "Classificar o governo Lula como neoliberal é uma simplificação perigosa", advertiu.
O papel da frente ampla e os desafios políticos
Outro aspecto abordado por Altman foi a composição política do governo. Ele explicou que a gestão Lula não é um governo operário nem de frente popular, mas sim uma coalizão ampla que inclui setores da burguesia contrários à extrema direita. "O governo Lula é híbrido, é uma coalizão entre as forças políticas mais expressivas da classe trabalhadora e frações da burguesia que se opõem à extrema direita, particularmente à tentativa de mudança no regime político sob Bolsonaro", explicou.
A estratégia da frente ampla, segundo Altman, impõe limitações programáticas ao governo e o obriga a fazer concessões ao chamado "centrão". "O governo está há meses dominado pela agenda do ajuste fiscal e não por uma agenda de desenvolvimento e justiça social", apontou, ressaltando que essa escolha pode gerar insatisfação popular e reduzir o apoio ao presidente.
Nesse contexto, Altman vê um dilema político se desenhando para os próximos meses: "Os elementos neoliberais da política econômica predominarão sobre os desenvolvimentistas, ou o contrário? Essa é uma disputa no interior do governo e da frente ampla". Para ele, a resposta a essa questão determinará o futuro político da administração Lula e a capacidade de manter sua base social mobilizada.
O risco de perder apoio popular
Ao analisar a recente queda na popularidade do governo, Altman afirmou que a prioridade dada ao ajuste fiscal em detrimento da ampliação dos investimentos sociais pode estar afastando setores populares. "Se o governo abdicar de um programa mais claramente favorável à classe trabalhadora, perderá popularidade. E, se perder popularidade, a frente ampla entrará em crise", alertou.
Ele destacou que a decisão de impor um limite de 2,5% para o reajuste do salário mínimo e as restrições a benefícios sociais afetaram diretamente a base eleitoral do governo. "O ajuste fiscal penalizou os mais pobres e não os ricos", criticou. Ao mesmo tempo, lembrou que o governo adotou medidas que contrariam o receituário neoliberal, como a taxação dos super-ricos e a ampliação dos investimentos da Petrobras.
Para Altman, a escolha entre aprofundar ajustes fiscais ou ampliar o investimento público será inevitável. "O relógio político e a situação internacional vão deixando essa hibridez cada vez mais insustentável", afirmou, reforçando que essa disputa definirá a trajetória do governo nos próximos anos.
Breno Altman concluiu sua análise rebatendo as acusações de que o governo Lula seria uma continuidade das gestões de Michel Temer e Jair Bolsonaro. "Isso não é verdade. O governo Lula, com todas as suas contradições e dificuldades, promoveu a derrota da extrema direita e paralisou em grande medida a implementação do programa econômico ultraliberal que vinha sendo conduzido", defendeu.
No entanto, ele ressaltou que o governo precisa definir sua orientação política e econômica com mais clareza. "O governo precisa decidir: mais neoliberalismo ou mais desenvolvimentismo? Esse é o grande debate que está em jogo", finalizou. Assista:
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