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“A democracia radical vem do feminismo”: Márcia Tiburi analisa ataque a Marina Silva e o papel das mulheres no futuro político

Filósofa diz que misoginia é usada como tecnologia de poder e que apenas a política feminista poderá substituir o autoritarismo

(Foto: ABR | Divulgação )
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247 - Em edição especial do Casa das Manas, transmitido pela TV 247, a filósofa, escritora e artista plástica Márcia Tiburi fez uma dura crítica à misoginia institucional presente na política brasileira, tendo como ponto de partida o ataque do senador Marcos Rogério (PL-RO) à ministra Marina Silva, durante audiência no Senado. Para Tiburi, o episódio é exemplar de uma tática usada sistematicamente: a humilhação de mulheres como instrumento de poder. “Infelizmente aquela cena foi uma apresentação particular de um fator social universal, que é a misoginia”, afirmou Tiburi.

Segundo Tiburi, o que se viu no Senado não foi apenas uma manifestação de machismo, mas uma estratégia deliberada de constrangimento. “Esses homens usam o grotesco como forma de gerar efeito de poder. A humilhação é uma tecnologia política”, afirmou, acrescentando que essa prática “atinge não só mulheres, mas também negros, pessoas trans, pobres e qualquer um que desafie o pacto da masculinidade dominante”.

A filósofa destacou ainda a reação da ministra ao responder que “não é uma mulher submissa”. Para ela, essa resposta marca uma nova etapa da consciência coletiva feminista no Brasil: “Em 2016, Dilma Rousseff foi vítima da mesma estrutura de misoginia, mas ainda não tínhamos o repertório político que temos hoje. Marina pôde responder. E isso é sinal de avanço”.

Autora do livro Complexo de vira-lata, Tiburi observou que o senador tentou anular Marina por meio da desqualificação. “Esse político, que nem nome merece ser citado, é um desqualificado que tentou surfar na produção da desigualdade de gênero que ele precisa para continuar existindo no poder. Um ‘Zé Mané’, um lambe-botas, um borrabotas sustentado pela performance masculina”.

A filósofa também sublinhou que a violência simbólica de não deixar uma mulher falar é, em si, uma forma de brutalidade política: “Nenhum grau de escuta, nenhum grau de democracia. A democracia pressupõe escuta, mas o que vimos foi a negação disso. O estupor provocado intencionalmente para calar uma mulher é parte do jogo da brotheragem, do psicopoder e da construção coletiva do silêncio”.

Ela defende que a luta feminista não deve ser tratada como secundária na política. Para Tiburi, o feminismo não é apenas um conjunto de demandas específicas das mulheres, mas a própria possibilidade de reinvenção da política em termos democráticos e éticos. “O feminismo é o novo universal. Ele é a única força capaz de curar a infantilidade dos esquerdomachos e substituir, com profundidade, o socialismo tradicional. O futuro é feminista ou não será”, declarou.

Ao comentar o papel dos homens nesse novo horizonte político, ela foi direta: “Eles podem nos seguir, nos apoiar. Isso é saudável e necessário. Mas para serem feministas, têm que sair do narcisismo, que é o eixo da política masculina. Política não é ego. Política é cuidado. E cuidado é atributo da política feminista”.

Sobre os desafios no atual governo, Tiburi demonstrou ceticismo em relação às alianças com setores da direita e criticou a aprovação de pautas ambientais regressivas: “É doloroso ver a boiada passando também neste governo. A devastação ambiental, a submissão ao agronegócio e o abandono da pauta ecológica são feridas abertas para qualquer projeto progressista real. Um governo que não rompe com isso ainda está preso ao paradigma do machismo político e do colonialismo”.

Ela também destacou que, mesmo diante da violência institucional e da tentativa de silenciamento, o que se viu com Marina Silva foi um ponto de virada. “O que aqueles homens não esperavam era o levante da própria Marina e da sociedade que a reconhece como figura pública com trajetória e dignidade. Eles não contavam com o afeto político que ela carrega”, avaliou.

Ao final, Tiburi defendeu que a presença das mulheres nos espaços de poder não é mais opcional: “Nós queremos governar. Queremos legislar. Queremos decidir. E não mais aceitaremos que o espaço público continue sob o monopólio da violência masculina. O que chamam de natureza feminina, nós já superamos. O que propomos agora é uma democracia radical, que nasce do feminismo. Isso é o futuro”. Assista: 

 

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