Reunião global de banqueiros centrais em Tóquio expõe dilemas da política monetária em tempos de inflação persistente
Com presença de autoridades dos EUA, Europa e Ásia, conferência organizada pelo Banco do Japão discute riscos econômicos e efeitos das tarifas de Trump
247 - Tóquio sedia a partir desta terça-feira (28) uma importante conferência internacional organizada pelo Banco do Japão (BOJ), em parceria com seu centro de estudos econômicos, para debater os rumos da política monetária em um cenário de desaceleração econômica global e inflação resistente.
O evento é considerado a versão japonesa do tradicional simpósio de Jackson Hole, realizado anualmente pelo Federal Reserve dos Estados Unidos. As informações são da agência Reuters.
Durante dois dias, acadêmicos e dirigentes de bancos centrais dos Estados Unidos, Europa e Ásia se reúnem na sede do BOJ, no centro da capital japonesa. Embora a maioria das sessões seja fechada à imprensa e com caráter técnico, o tema deste ano — "Novos desafios para a política monetária" — evidencia preocupações centrais dos formuladores de políticas: como lidar com a inflação que se recusa a ceder, os riscos de recessão, a volatilidade dos mercados e o impacto das tarifas comerciais dos Estados Unidos.
Esses fatores, amplamente atribuídos às políticas comerciais do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, vêm impondo obstáculos a bancos centrais em diferentes estágios do ciclo de juros. Enquanto algumas autoridades monetárias ainda cortam taxas para estimular a economia, outras, como o próprio BOJ, sinalizam um caminho de alta gradual, embora sob crescente cautela.
“O Banco do Japão pode até ser forçado a manter os juros como estão por algum tempo, mas isso não significa que precise abandonar o plano de alta”, afirmou o ex-dirigente do BOJ, Nobuyasu Atago. “O importante é deixar claro que, assim que o cenário permitir, os aumentos serão retomados.”
Além de representantes do BOJ, participam da conferência dirigentes do Federal Reserve — incluindo o presidente do Fed de Nova York, John Williams —, do Banco Central Europeu, do Banco do Canadá e do Banco da Reserva da Austrália.
Tarifas de Trump e o risco de erro de política monetária
A edição de 2023 do encontro foi marcada por um balanço das estratégias adotadas pelos bancos centrais no enfrentamento das crises recentes, com foco no uso de instrumentos não convencionais de flexibilização monetária. Já neste ano, os organizadores colocaram no centro do debate os desafios impostos pela política tarifária dos EUA e seus reflexos sobre a inflação e o crescimento global.
Duas sessões merecem destaque na programação. A primeira, sobre “demanda por reservas, controle de juros e aperto quantitativo”; a segunda, dedicada à discussão de um estudo publicado em dezembro pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), intitulado Política Monetária e Medos da Inflação. O artigo aponta como choques de oferta — como os provocados pela pandemia de Covid-19 — podem gerar aumentos de preços persistentes e alerta para o erro que seria subestimar pressões inflacionárias de custo.
Para os bancos centrais das maiores economias, o dilema é evidente. O Federal Reserve, que cogitava novos cortes, agora adota postura de cautela diante da inflação impulsionada pelas tarifas de Trump. Já o Banco Central Europeu se prepara para mais um corte em junho, mas a possibilidade de uma pausa está em discussão, como revelou a agência Reuters após conversas com autoridades monetárias do bloco.
“As tarifas podem ter efeito desinflacionário no curto prazo, mas trazem riscos inflacionários no médio prazo”, alertou Isabel Schnabel, integrante do conselho do BCE, durante conferência na Universidade Stanford em 9 de maio, ao defender abertamente uma pausa nos cortes.
Inflação sobe no Japão e pressiona o BOJ
O próprio BOJ enfrenta um ambiente interno delicado. Pressionado pelo impacto das tarifas norte-americanas, o banco reduziu drasticamente sua previsão de crescimento econômico no início de maio e sinalizou uma pausa no ciclo de alta de juros. Atualmente, a taxa de curto prazo no Japão está em apenas 0,5%.
Ainda assim, o presidente da instituição, Kazuo Ueda, mantém a disposição de elevar novamente os juros, caso a inflação subjacente continue no rumo da meta de 2% ao ano. Em abril, a inflação ao consumidor atingiu 3,5%, o maior índice em mais de dois anos. O aumento nos preços dos alimentos foi ainda mais expressivo, de 7%, refletindo diretamente no orçamento das famílias.
“Está claro que o BOJ não conseguiu cumprir seu mandato de estabilidade de preços”, afirmou Atago, que hoje atua como economista-chefe no Instituto de Pesquisa Econômica da Rakuten Securities. “A inflação seguirá como uma preocupação central, e o banco já parece atrasado diante das pressões domésticas.”
Kazuo Ueda fará o discurso de abertura da conferência nesta terça-feira. Em seguida, será a vez de Agustin Carstens, diretor-geral do Banco de Compensações Internacionais (BIS), apresentar uma palestra especial.
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