TCU questiona conta vinculada em acordo da MRS
Unidade fiscal do tribunal vê risco de violação orçamentária em modelo proposto pelo governo
247 - O julgamento do acordo de repactuação do contrato da MRS Logística no Tribunal de Contas da União (TCU) deve ocorrer já na próxima semana e promete definir os rumos da política de concessões ferroviárias do governo. A reportagem foi publicada pela Agência iNFRA, que destacou a oposição da Unidade de Auditoria Especializada em Orçamento, Tributação e Gestão Fiscal (AudFiscal) ao uso de contas vinculadas como instrumento para financiar obras do setor.
Segundo a Agência iNFRA, a AudFiscal emitiu parecer contrário à proposta, argumentando que os recursos destinados a essas contas têm natureza pública e, portanto, deveriam obrigatoriamente ser recolhidos ao orçamento federal. Para os técnicos, a ideia de repassar valores diretamente a futuros concessionários desvia da regra constitucional de centralização das receitas e cria uma “obrigação de pagar valores à União”, que não poderia ser tratada como gestão de recursos privados.
Divergências no TCU
O debate gira em torno do chamado investimento cruzado, autorizado por lei desde 2017. A norma prevê que concessionárias realizem obras em trechos fora de seus contratos como forma de compensação. Após dificuldades nas renovações iniciadas em 2020, o Ministério dos Transportes propôs substituir a execução direta por depósitos em contas vinculadas. No caso da MRS, o valor estimado chega a R$ 2,8 bilhões, sob supervisão da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
A AudFiscal rejeitou essa modelagem e lembrou que a lei se refere a “obrigações de fazer – execução direta de obras pela concessionária”. O parecer afirmou ainda que “a discricionariedade administrativa na modelagem contratual não pode suplantar normas constitucionais e de finanças públicas de hierarquia superior”.
Embate jurídico e político
O governo, no entanto, sustenta que o modelo é legal e cita precedente de 2020, quando o TCU autorizou a Vale a construir um trecho da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico) sem que os recursos passassem pelo orçamento da União. A Advocacia-Geral da União (AGU) também defendeu a proposta, alegando que as contas vinculadas garantem maior segurança jurídica, previsibilidade contratual e eficiência na aplicação dos recursos.
Em nota, o Ministério dos Transportes informou estar apresentando esclarecimentos adicionais ao TCU, com apoio de pareceres técnicos e jurídicos. Para a pasta, o modelo das contas vinculadas favorece a transparência, uma vez que os projetos contemplados serão incluídos nos futuros editais de concessão, submetidos a leilões públicos.
Críticas de órgãos de controle
O Ministério Público junto ao TCU (MPTCU) já havia classificado a iniciativa como exemplo de “contabilidade e orçamento criativos”. A AudFiscal endossou essa visão, argumentando que a medida se assemelha mais à criação de receitas públicas do que a um mecanismo de gestão contratual. “Não se afigura sequer adequado qualificar a hipótese ora examinada como ‘investimento cruzado’. Em verdade, o que se observa é o desvio da regra constitucional de centralização das receitas”, afirmou a unidade técnica.
Agora, a decisão final cabe ao plenário do TCU, sob relatoria do ministro Jorge Oliveira. A definição terá impacto direto no modelo de concessões ferroviárias e poderá estabelecer um precedente relevante para os próximos contratos do setor.