Facção Tren de Aragua se infiltra no Brasil e expande alianças com PCC e Comando Vermelho
Grupo venezuelano já atua em diversos estados, domina áreas do tráfico em Roraima e impõe controle violento sobre migrantes e mulheres
247 - A presença da facção criminosa venezuelana Tren de Aragua em território brasileiro deixou de ser pontual e passou a configurar um fenômeno de expansão silenciosa e brutal. Segundo reportagem da Folha de S. Paulo, os sinais da atuação do grupo vão desde a prisão de um de seus integrantes em Santa Catarina até a descoberta de cemitérios clandestinos em Roraima, revelando o alcance nacional da facção.
Em Chapecó (SC), a prisão de Andrés Marcelo Mendez Perez, de 34 anos, expôs o rastro do Tren de Aragua a mais de 3,4 mil quilômetros de onde ele era procurado. Acusado de envolvimento no assassinato de um adolescente venezuelano em Boa Vista, em 2020, Perez foi detido enquanto trabalhava em um frigorífico. Na abordagem, policiais relataram encontrar drogas com o suspeito, que teria confirmado ter mais entorpecentes em sua casa, onde havia cocaína, maconha e uma balança de precisão.
Apesar de negar envolvimento no homicídio, Perez admitiu ser usuário de drogas, mas afirmou que a balança não era dele. A defesa contesta qualquer relação com o crime. A vítima, de 16 anos, foi encontrada às margens do rio Branco com as mãos amarradas e perfuração no pescoço. O adolescente vivia em um dos acampamentos da Operação Acolhida, programa do Exército brasileiro de interiorização de refugiados venezuelanos.
Expansão favorecida pela ausência de controle - De acordo com o delegado Wesley Costa de Oliveira, da Delegacia de Repressão a Ações Criminosas Organizadas (Draco) de Roraima, a atuação do grupo é favorecida pela falta de checagem dos antecedentes dos refugiados. “É o exemplo de integrante da facção Tren de Aragua que o governo federal investiu recursos públicos para mandar para outro estado sem checagem de antecedentes”, afirmou.
O delegado ainda alerta para a facilidade com que criminosos podem entrar no Brasil. “Eles podem entrar [no Brasil] e ‘nascer’ novamente. Entram no território brasileiro com nomes verdadeiros ou com nomes falsos, e aqui é como se não tivessem absolutamente nenhum registro [criminal] formal”, disse.
A facção Tren de Aragua é hoje considerada a maior organização criminosa da Venezuela. Com registros de atividade também em Colômbia, Bolívia, Equador, Peru e Estados Unidos, o grupo tem origem em um sindicato de trabalhadores ferroviários fundado em 2005, mas se consolidou em 2013 no presídio de Tocorón, próximo à capital Caracas, sob a liderança de Héctor Rustherford Guerrero Flores, conhecido como "Niño guerrero", atualmente foragido.
Domínio territorial e violência extrema - Instalado em Boa Vista, o grupo controla pontos de tráfico de drogas e exploração sexual, segundo investigações. A maioria das vítimas são outros venezuelanos, assassinados por disputas internas ou por não cumprirem regras do grupo. Casos de esquartejamento e ocultação de cadáveres em plásticos ou colchões foram registrados entre março e agosto de 2021.
Em novembro de 2023, um cemitério clandestino foi descoberto em área de mata na capital roraimense. Nove corpos — cinco de mulheres — foram encontrados e todos foram identificados como venezuelanos. Segundo o delegado Oliveira, as mulheres exploradas sexualmente são obrigadas a cumprir metas de pagamento. Aquelas que não alcançavam o pagamento estipulado eram mortas para dar exemplo às demais. O mesmo destino, afirmou, é reservado a quem denuncia a facção às autoridades.
Alianças perigosas com o crime organizado brasileiro - A expansão do Tren de Aragua também envolve uma conexão estratégica com o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV). O controle da fronteira por Pacaraima, em Roraima, é a principal vantagem logística da facção. Em depoimento durante um julgamento, o delegado Leonardo Cruz Barroncas afirmou que drogas e armas são transportadas por “trouxeiros” — homens e mulheres que carregam os materiais ilegais em trilhas pela floresta.
O fluxo inclui fornecimento para Manaus e para o Rio de Janeiro. Parte das armas e drogas também chega aos garimpos ilegais na Amazônia, como aponta a prisão de Antonio José Cabrera, de 40 anos, em Mucajaí (RR). Cabrera e seu irmão, Daniel, ambos presos, são apontados como membros de alto escalão do Tren de Aragua no país. A defesa, no entanto, afirma que Antonio é alvo de perseguição policial desde 2022.
O assassinato de Gregori José del Nazareth Puerta Alvarez, que teria abandonado o Tren para trabalhar para o PCC, é atribuído a Cabrera. A polícia afirma que o homicídio foi encomendado pelo grupo. A defesa nega e contesta as acusações.
Segundo Oliveira, a facção não se prende a alianças exclusivas: “essa facção passou a se ligar ao CV e ao PCC, sem escolher um lado”.
Reconhecimento internacional - Diante da sua periculosidade, o governo dos Estados Unidos classificou o Tren de Aragua como organização terrorista no início de 2025. A medida serviu de base para a deportação de mais de 200 venezuelanos presos em El Salvador, suspeitos de ligação com a facção.
A expansão do grupo para outros estados brasileiros — São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul — é vista com preocupação por autoridades, e a prisão de Perez em Santa Catarina é considerada um novo indício de que a facção já estabeleceu células operacionais fora da região Norte.
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