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Carol Proner

Doutora em Direito, professora da UFRJ, diretora do Instituo Joaquín Herrera Flores – IJHF

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Sobre o que está acontecendo no Irã - 8 pontos de análise

A história se repete como tragédia mais uma vez

Pessoas observam de uma ponte as chamas de um ataque israelense subindo do depósito de petróleo de Sharan, após os ataques israelenses ao Irã, em Teerã, Irã, em 15 de junho de 2025 (Foto: Majid Asgaripour/WANA (West Asia News Agency) via REUTERS)

Por Carol Proner e Larissa Ramina*

1. O Brasil condenou o ataque dos Estados Unidos ao Irã como sendo uma violação à soberania e ao direito internacional. Praticamente todos os países árabes vão no mesmo sentido, manifestando grave preocupação com a escalada da guerra iniciada por Israel. António Guterres, secretário-geral da ONU, afirmou que a entrada dos Estados Unidos no conflito constitui uma ameaça direta à paz e à segurança internacional.  No momento em que escrevemos este artigo, Rússia, China e Paquistão fazem circular junto ao Conselho de Segurança da ONU uma proposta de Resolução convocando o imediato e incondicional cessar-fogo em respeito ao direito internacional, à proteção de civis, e ao compromisso com o diálogo e a negociação.

2. De fato e de direito, os ataques bélicos unilaterais a instalações nucleares são, em si, uma violação aos propósitos da paz e da segurança internacional e ao conjunto de princípios existenciais presentes na Carta das Nações Unidas. São, especificamente, violações às regras previstas no Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP).

3. A decisão de Israel, copiada pelos Estados Unidos, de atacar unilateralmente o Irã não tem fundamento em qualquer dispositivo internacional. O direito de legítima defesa previsto na Carta da ONU não pode ser deturpado para justificar ações militares unilaterais que desprezam os mecanismos multilaterais de contenção de conflitos e o multilateralismo. Como sabemos, o Irã vinha negociando junto à Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) o conhecido Plano de Ação Integral Conjunto (JCPOA), que visava limitar drasticamente o programa nuclear em troca de alívio nas sanções internacionais.

4. Para o direito internacional, é especialmente grave que o chamado “mundo baseado em regras”, ceda lugar a um mundo baseado na força e na capacidade bélica. Isso vai muito além do Irã, podendo alastrar-se a disputas menos visíveis em diferentes lugares e contextos.

5. Os limites ultrapassados neste conflito são especialmente graves porque exorbitam o discurso de legitimação da barbárie e o desejo de destruição generalizada (morte, eliminação, liquidação de autoridades, partidários e governantes), ao tempo em que surgem objetivos que normalmente são disfarçados, como a mudança coercitiva de governo (“regime change”). É bom lembrar que o abandono da diplomacia e o desgarramento da legalidade internacional humanitária ocorrem ao mesmo tempo em que prevalece sobre Gaza um genocídio promovido por ações deliberadas do governo de Israel, com o apoio dos Estados Unidos e de seus aliados.

6. Evidentemente, a principal expectativa hoje para a comunidade internacional é a resposta iraniana. Ato seguido aos ataques dos Estados Unidos, o governo do Irã comunicou que o tempo da diplomacia acabou e que atuará de acordo com o legítimo direito de defender sua soberania e os interesses de seu povo. O artigo 51 da Carta da ONU estabelece a legítima defesa como um direito inerente de um Estado agredido, embora em condições normativas específicas e jamais flexibilizando normas imperativas de proteção de civis e outras.

7. A guerra de narrativas pelo lado ocidental lembra muito o que ocorreu no Iraque em 2003. Passados anos de destruição e devastação econômica e institucional do Iraque, o mundo finalmente sabe que as razões da Guerra ao Terror passaram longe das motivações alegadas pelo então governo “Bush pai”. Os Estados Unidos fundamentaram o ataque preventivo contra o Estado considerado vilão, que seria produtor de “armas de destruição em massa” e cujo líder Saddam Hussein teria laços com a al-Qaeda. Ambas as razões se provaram falsas e a decisão de invadir o Iraque foi, com o tempo, duramente criticada tanto pela população estadunidense como mundo afora.

8. Uma das consequências da Guerra do Golfo foi o considerável declínio de popularidade de George Bush pai, que se tornaria um dos Presidentes mais impopulares da história dos Estados Unidos. A história se repete como tragédia mais uma vez.

*Larissa Ramina é professora de Direito Internacional (UFRJ/UFPR), advogada e integrante da ABJD.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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