O calcanhar de Aquiles do governo Lula
Falta ao governo uma comunicação eficaz
Lula é, sem dúvida, um dos maiores comunicadores populares da história do Brasil. Mas seu governo, paradoxalmente, sofre de um velho problema que se repete: falta de comunicação eficaz. E não é por ausência de realizações. O que falta é transformar ações concretas em narrativas que toquem o povo, mobilizem a base e enfrentem o bombardeio da extrema-direita. Com as eleições de 2026 no horizonte e as redes sociais fervendo, esse é um ponto que precisa de atenção urgente.
Comunicação que não chega aonde precisa
O governo Lula já fez muito. Voltou a investir em programas sociais, retomou obras paradas, subiu o salário-mínimo, valorizou o meio ambiente, resgatou o papel do Brasil no mundo. Mas quem sabe disso fora da bolha? Pouca gente.
O problema está na forma como as conquistas são comunicadas. É tudo muito técnico, institucional, distante da linguagem do povo. O governo até publica nas redes, faz vídeos e discursos, mas falta traduzir isso para o cotidiano das pessoas, para o WhatsApp da manicure, o TikTok do entregador, a live do pastor. A política precisa emocionar. Precisa falar do feijão no prato, da água limpa, do aluguel que voltou a caber no bolso.
Quando o silêncio é fatal
Outro ponto crítico: o governo demora demais para reagir às crises. Enquanto a extrema-direita espalha fake news em tempo real, o governo responde horas depois — às vezes dias — com notas frias, textos longos e linguagem burocrática.
Basta ver o que acontece quando surgem boatos sobre o BNDES financiando ditaduras, a mentira do PIX, a tentativa de culpar o governo pelo escândalo do INSS. Essas mentiras se espalham aos milhões, e quando o governo reage, o estrago já está feito.
Essa lentidão na resposta passa a impressão de que o governo não sabe se defender ou, pior, que é culpado. Em tempos de guerra de narrativas, quem demora perde.
Falta de alinhamento interno
A comunicação do governo também sofre com a falta de unidade. Um ministro diz uma coisa, outro diz o contrário. Um fala de ajuste fiscal, outro fala de gasto social. Um tenta agradar o mercado, outro o movimento social.
Essa confusão dá margem para a imprensa tradicional plantar crises onde não há, e pior: passa a imagem de um governo perdido, desorganizado, sem direção. Comunicação eficiente começa dentro de casa. Se os ministros não falam a mesma língua, como esperar que o povo entenda?
A extrema-direita já está em campanha
A situação fica ainda mais grave quando olhamos para o campo adversário. A extrema-direita não saiu de cena em 2022. Ao contrário: segue organizadíssima. Produz conteúdo diário para TikTok, Instagram, YouTube, WhatsApp. Usa humor, medo, religião, desinformação — tudo junto — para construir um mundo à parte. Um Brasil imaginário onde Lula é uma ameaça e Bolsonaro é um mártir.
Eles sabem usar as redes como ninguém. Não falam em prestação de contas: falam em emoções, fé, família, segurança. Criam identificação com o povo enquanto o governo se limita a relatórios e notas técnicas.
Com Bolsonaro inelegível, outros nomes vão surgir. Mas o bolsonarismo como força política continua vivíssimo — e online.
Redes sociais: campo de batalha central
Não se trata mais de “usar redes sociais”. Trata-se de entender que a disputa política em 2026 será decidida nas redes. Quem dominar o TikTok, o WhatsApp, o YouTube, dominará o voto da juventude, das mulheres trabalhadoras, dos evangélicos e da classe média cansada da política tradicional.
A comunicação digital precisa sair da bolha institucional. É preciso:
- Produzir conteúdos simples, emocionantes e diretos;
- Investir em influenciadores populares e canais alternativos;
- Reagir rápido às fake news;
- Ocupando espaços digitais com linguagem acessível, memes, vídeos curtos, humor e sensibilidade social.
A esquerda tem conteúdo, tem projeto, tem história. Mas precisa falar a língua da rua, sem medo de disputar símbolos e afetos.
Sem comunicação, não há vitória
É simples: não adianta fazer se ninguém fica sabendo. A política hoje se ganha tanto nas urnas quanto nas telas. Se o governo quer vencer em 2026, precisa colocar a comunicação no centro da estratégia — e não como acessório.
A comunicação não é só ferramenta. É trincheira. É nela que se disputa o que é verdade, o que é justo, o que é possível.
Se o campo progressista não acordar para isso, vai continuar perdendo o jogo antes mesmo do apito inicial.
Gustavo Tapioca é jornalista e MBA em Jornalismo pela Universidade de Wisconsin-Madison
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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